sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Rafael Cortez* - Lula sugere governo a quatro mãos para buscar voto não petista

O Estado de S. Paulo

Ex-presidente reforça a importância da escolha do vice-presidente na chapa em eventual novo mandato

Uma rápida observação das curvas de intenção de voto do ex-presidente Lula já é suficiente para mostrar a resiliência do apoio ao petista na corrida presidencial. A comparação com o tamanho das primeiras forças em anos anteriores sugere que Lula está muito próximo do teto histórico. O presidente Bolsonaro, por exemplo, teve 46% de votos válidos em 2018.

Assim, o desafio da campanha do petista é basicamente trazer algo novo para o eleitorado. Esse senso de urgência foi reforçado diante das incertezas associadas ao calendário eleitoral, a partir das contestações do presidente em relação a urna eletrônica. A leitura é que eventual vitória em primeiro turno suavizaria potencial transição.

Curiosamente, o ex-presidente fundamentalmente recorre ao passado para trazer o novo. Lula usa sua experiência anterior ao governo como fiadora do seu comportamento futuro, a despeito do antipetismo alimentado justamente pelo histórico do partido no governo e, especialmente, diante das novidades dos desafios conjunturais.

sabatina do petista no Jornal Nacional abriu espaço para os três temas que machucam a imagem de Lula para o público fora da bolha petista: corrupção, “legado Dilma” e radicalização à esquerda. Orçamento secreto, críticas diretas a algumas escolhas de Dilma e autodeterminação dos povos foram os principais ingredientes das respostas.

O petista reforçou na sabatina o que parece ser o seu tripé para sua agenda econômica: “credibilidade, previsibilidade e estabilidade”. Se os princípios pouco dizem sobre o conteúdo das propostas à luz dos desafios contemporâneos, apontam a opção por uma agenda de mudanças negociadas.

Uma outra parte da estratégia de contenção de riscos envolveu uma variável política: a escolha do vice. Ao citar Alckmin, Lula fez referências aos “dois eu vão governar o país”, reforçando a importância do ex-tucano na busca desse novo eleitor e, especialmente, na construção da governabilidade em um eventual novo mandato. Se a chave para o entendimento do que seria um novo mandato passa pela capacidade do petista recuperar o protagonismo do governo na definição da agenda, após o protagonismo do Centrão na atual administração.

A sabatina foi relevante para apresentar a reação do candidato aos temas que irão condicionar possível movimento de voto útil. A entrevista deve ajudar na cristalização da intenção de voto no petista e inaugura o processo de busca do voto na oposição não petista.

*Rafael Cortez é sócio da Tendências Consultoria é doutor em ciência política (USP)

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