domingo, 4 de dezembro de 2022

Bruno Boghossian - Administrando expectativas

Folha de S. Paulo

Petista tenta administrar expectativas e obter tolerância sobre as primeiras decisões do mandato

Antes de receber a primeira pergunta na entrevista coletiva da última sexta-feira (2), Lula tentou preparar o terreno. "Eu estou convencido de que a situação do país não é das melhores", diagnosticou o presidente eleito. "Nós temos informações de que nós não teremos grande crescimento em 2023 se depender da política que está em vigor nesse país."

Lula já ganhou a eleição, mas ainda sustenta um discurso crítico a Jair Bolsonaro para amortecer o início de seu governo. Ao repisar a imagem de que a gestão atual deixa um cenário de terra arrasada, o petista trabalha para administrar as expectativas de seus eleitores e obter uma certa tolerância sobre as primeiras decisões de seu mandato.

Em outros dois momentos da entrevista, Lula adotou esse tom. Criticou buracos no Orçamento ("parece que eles querem deixar o país a zero") e reclamou das incertezas ("eu sei que eu não vou encontrar coisa boa"). "Mas eu sabia que ia acontecer isso, não posso agora dizer que está tudo errado", completou.

O petista fez campanha com uma plataforma de recuperação econômica, distribuição de renda e retomada de programas negligenciados. Na transição, ele dá recados de que há dificuldades no caminho e que esse processo vai exigir escolhas que podem parecer amargas para alguns grupos (como a ampliação de gastos sociais, que contraria investidores).

É uma adaptação da lógica política que costuma ser seguida na aplicação de medidas de austeridade. Quando um governo precisa cortar despesas, ele consegue segurar apoio se a situação do país estiver ruim o bastante e se houver benefícios direcionados para determinados segmentos da população.

O presidente eleito aplica essa vacina para garantir ao menos algum período de lua de mel na estreia de seu governo. O petista sabe que subirá a rampa sob a rejeição firme de metade do eleitorado e a desconfiança daqueles que lhe deram um voto crítico no segundo turno. Tudo indica que os ponteiros da popularidade de Lula estarão sensíveis em 2023.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Escreve como se ele, autor, fosse essa lama ribanceira abaixo, matando, derrubando, obstruindo.
Quer é administrar expectativa própria, de agradar o dono da voz.