Folha de S. Paulo
Economia vai sofrer menos do que Brasil da
Grande Recessão, mas tem futuro sombrio
Faz
quase um ano, a Rússia invadiu a Ucrânia. Em abril do ano passado,
bancões, FMI e economistas ouvidos pelo Banco da Rússia (o banco central deles)
estimavam que a economia encolheria uns 9% em 2022 por causa da guerra. Não foi
assim.
O PIB de 2022 deve ter diminuído 2,1%,
estimativa de fevereiro da Economic Expert Group, consultoria que presta
serviços ao Ministério das Finanças. Na previsão compilada pelo banco central
russo, o PIB cairia 1,5% neste 2023. Seria um biênio de tombo feio: 3,6%. Na
Grande Recessão do Brasil (2015-2016), a baixa foi de 6,7%.
Pânico, incerteza, sanções comerciais e o isolamento financeiro imposto pelo "Ocidente" não bastaram para produzir desastre no tamanho previsto. As exportações de petróleo e gás explicam o grosso da resistência econômica russa, mas não tudo.
Da arrecadação total do governo no ano
passado, 44% vieram da receita com petróleo e gás (impostos e outras rendas).
Nos anos de petróleo muito caro de 2012 a 2014, essa contribuição chegou a mais
de 51%. Na baixa de preços da epidemia, a 29%.
Em 2022, a arrecadação total aumentou 16%
(em termos nominais). O aumento todinho veio dos dinheiros de petróleo e gás.
A crise quase mundial de energia que vinha
desde fins de 2021 piorou com a alta de preços causada pela guerra de Putin.
Tal carestia compensou até mesmo o fato de que o petróleo russo tenha passado a
ser vendido com desconto enorme.
O barril do tipo Urais custava uns US$ 2
(R$ 10) menos que o tipo Brent pouco antes da guerra. Neste fevereiro, o
desconto era de US$ 32 (R$ 166) e por aí deve ficar. A vaca leiteira da Rússia
deve render menos daqui em diante.
O risco de negociar o Urais derruba seu
preço, os europeus estão conseguindo largar a dependência de energia russa e vão
acelerar a descarbonização. A infraestrutura para levar petróleo para aliados
asiáticos é cara. Índia, China e
Turquia não devem absorver o possível excesso, dizem entendidos.
Além do mais, o inverno tem sido ameno, e
os europeus conseguiram estocar gás. O mundo rico beira a recessão, o que
derrubou preços de commodities em geral (o petróleo está ora mais barato do que
antes da guerra).
No entanto, mesmo com preço de commodities
em queda e o Urais vendido com desconto, as exportações totais de bens e
serviços da Rússia passaram de US$ 550 bilhões (R$ 2,8 trilhões) em 2021 para
US$ 628 bilhões (R$ 3,2 trilhões) em 2022. As importações caíram, de US$ 379
bilhões (R$ 1,9 trilhão) para US$ 346 bilhões (R$ 1,7 trilhão).
O saldo dessas contas externas aumentou,
claro. Mas, muito importante, as importações caíram pouco. As sanções podem ter
impedido a compra de máquinas, partes e peças de tecnologia mais avançada. Mas
por ora não parecem ter amputado a capacidade russa de abastecer consumidores e
empresas. Mesmo com recessão, a indústria ficou estagnada, caso de copo meio
cheio e vazio: a queda na produção de bens "civis" foi compensada
pela produção de equipamento de guerra.
Vladimir Putin, digamos com ironia, é um
ortodoxo. Seu governo tem superávit (paga despesas correntes e a conta de
juros). O Banco da Rússia é independente, pelo menos na lei. Desde 2013, é
presidido por Elvira Nabiullina, figura meio lendária na finança mundial e tida
como uma das líderes da "ala modernizadora" da elite putinista (do
outro lado, estão os tipos KGB, milicos, rasputins conspiracionistas e
oligarcas).
A inflação de 2022 foi de 11,9%, ante os
8,4% de 2021. A taxa básica de juros deles era de 9,5% no início de 2022, foi a
20% assim que a guerra estourou, a fim de conter o pânico, e está em 7,5%, para
uma projeção de inflação de 6% em 2023 (taxa real menor do que 1,5%, pois). Por
falar nisso, a meta de inflação do banco central russo é de 4%.
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