Valor Econômico
Colapsos de bancos mostram importância do
PLP 281/2019
Nas entrelinhas, veio uma notícia positiva
da participação do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, no evento “E agora,
Brasil?”, painel promovido pelo Valor e
o jornal “O Globo” na segunda-feira (13). De acordo com relato do próprio
ministro, ele e o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto,
passaram o fim de semana em contato direto conversando sobre os efeitos, nos
Estados Unidos, no mundo e, claro, no Brasil, dos colapsos do Silicon Valley
Bank (SVB) e do Signature Bank.
Excelente. Que conversem mais. E que o
diálogo se desdobre em um número crescente de ações conjuntas, inclusive na
adoção de medidas para garantir a estabilidade do sistema financeiro nacional.
Neste caso, inclusive, já existe até uma opção à mesa: o Projeto de Lei
Complementar 281 de 2019, de autoria do Executivo e defendido pela autoridade
monetária desde o governo passado.
Até agora, contudo, a Câmara dos Deputados
não deu a devida atenção à proposta, que recebeu críticas num passado não tão
remoto comparando-a ao Proer.
O Programa de Estímulo a Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional, ou Proer, foi um pacote de socorro a bancos privados em dificuldades implementado no governo FHC. Este, de fato, foi objeto de diversas críticas ao longo do tempo por não conseguir recuperar os recursos públicos desembolsados. Mas isso não deveria interditar o debate, sobretudo diante do que vem sendo discutido nos fóruns internacionais e aplicado por governos estrangeiros.
O envio do PLP 281/2019 ao Congresso
ocorreu em meio a compromissos assumidos pelo Brasil no âmbito do G20, em razão
da crise de 2008, depois que o Comitê de Estabilidade Financeira (Financial
Stability Board, ou FSB, na sigla em inglês) recebeu a missão de propor medidas
para reduzir eventuais riscos sistêmicos associados a instituições financeiras
consideradas “grandes demais para quebrar”.
Como resultado, em 2011 o FSB apresentou a
proposta de um padrão de regimes de resolução, justamente para dotar as
autoridades nacionais de instrumentos para “resolver” instituições financeiras,
sociedades de seguros e de previdência privada em crise. O mesmo vale em
relação a entidades administradoras de bolsas de valores, de mercadorias e de
futuros.
Durante essas discussões, foram
estabelecidos alguns princípios, como a observância dos interesses nacionais de
preservação da estabilidade financeira, a continuidade do fornecimento de
funções críticas para a economia real e o uso de recursos públicos somente após
o esgotamento das fontes privadas disponíveis, além de celeridade na decretação
e na condução dos regimes de resolução. Buscou-se, portanto, reduzir o uso de
recursos dos contribuintes nessas operações de resolução e que este seja,
também, a última opção.
Aliás, quando o projeto foi encaminhado ao
Congresso pelo Palácio do Planalto, em dezembro de 2019, seus defensores
argumentaram que isso estava sendo feito justamente para ampliar a margem de
ação do poder público. A atual legislação brasileira dispõe de uma única opção
de resolução de instituições de importância sistêmica capaz de assegurar a
manutenção de suas funções críticas: a hipótese de a União assumir o seu
controle acionário. Noutra frente, uma lei complementar de 2000 também prevê
que recursos públicos sejam empregados para socorrer instituições financeiras,
mas mediante aprovação de lei específica. Em ambos os casos, não se exige
prévia utilização dos recursos existentes na própria instituição como requisito
para a intervenção estatal, o que o PLP 281/2019 tenta corrigir.
A proposta estabelece dois “regimes de
resolução”, o de estabilização e o de liquidação compulsória. E caberia à
“autoridade de resolução competente” - o BC, a Comissão de Valores Mobiliários
(CVM) ou a Superintendência de Seguros Privados (Susep) - decretar o regime que
considerar mais adequado. A regra geral seria, quando não houver riscos à
estabilidade financeira ou de paralisação de funções críticas, a liquidação
compulsória.
Já o objetivo do regime de estabilização
deve ser assegurar as funções da instituição em crise e buscar uma solução
privada para a retomada dos negócios. Para tanto, o projeto prevê a utilização
de “fundos garantidores de créditos” e “fundos de resolução”, administrados por
pessoas jurídicas de direito privado.
Nos casos em que os recursos privados não
forem suficientes, a União poderia realizar empréstimos aos fundos de
resolução. Isso exigiria o consentimento do Conselho Monetário Nacional (CMN) e
a observância de algumas condições, como o esgotamento desses recursos
privados. Em outras palavras, que os acionistas e os detentores de créditos
subordinados de determinada instituição tenham perdido seu capital, por meio da
absorção de prejuízos, e os recursos do fundo de resolução tenham sido
exauridos.
Na justificativa anexada ao projeto, o
então ministro da Fazenda, Paulo Guedes, destacou: “Importante ressaltar que,
em princípio, os empréstimos previstos na medida legislativa não serão feitos
diretamente à instituição em crise, e sim ao fundo de resolução. Isso é
relevante porque o fundo de resolução possuirá mecanismos para cobrar os
valores de todas as instituições participantes, ou seja, todo o conjunto de
associados fica responsável pelo pagamento do empréstimo à União. Dessa forma,
independentemente de a instituição em crise se recuperar ou não, o Tesouro será
reembolsado pelos valores que eventualmente vier a despender”.
No fim de semana, o governo americano
buscou reagir com rapidez para evitar tanto a quebra das empresas que tinham
recursos no SVB quanto uma crise de confiança. Seu fundo garantidor foi
acionado, e ele anunciou que depósitos superiores ao limite de US$ 250 mil por
cliente também estavam assegurados.
O caso acendeu o alerta geral e a ação do
governo dos EUA foi elogiada, inclusive, por integrantes da nova equipe
econômica. Mas permanece o questionamento se, caso isso tivesse ocorrido no
Brasil, o país teria as ferramentas necessárias para pronto uso.
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