Folha de S. Paulo
Disputa ideológica parece estar afetando
dinâmica dos nomes usados para batizar logradouros públicos
Essa foi no fígado. O Metrô de São
Paulo, que é controlado pelo governo do estado, agora sob gestão do
neobolsonarista Tarcísio de
Freitas, decidiu trocar o nome
de uma futura estação da linha 2-verde de Paulo Freire para Fernão Dias.
Paulo Freire (1921-97), se você chegou há pouco de Marte, é um educador brasileiro, dono de uma obra acadêmica muito prestigiada tanto aqui como no exterior e que foi secretário municipal da Educação de São Paulo na gestão da então petista Luiza Erundina (1989-92). Acabou se convertendo numa espécie de herói da esquerda, o que lhe vale ataques de políticos como Jair Bolsonaro.
Já Fernão Dias (c.
1608-1681) foi um bandeirante
paulista. Ele é anterior à própria distinção entre esquerda e
direita, que é do fim do século 18, mas, nos últimos anos, com o crescimento
dos movimentos identitários, bandeirantes vêm sendo execrados pelo tratamento
que dispensavam a índios. Tornaram-se alvos prioritários da esquerda e, por
isso mesmo, heróis da direita.
Nesse contexto, a troca de nome representa,
para a esquerda, um duplo golpe. Não apenas um de seus representantes teve sua
justa homenagem cassada como também, ainda pior, a honraria foi transferida para
um protofascista. Seria um troco pelo rebatismo do
Minhocão, que deixou de ser elevado Presidente Costa e Silva para
tornar-se elevado Presidente João Goulart?
O Metrô, é claro, oferece uma explicação
mais singela. Diz que o nome Paulo Freire era provisório e que a mudança foi
decidida após consulta a moradores da região.
Como a tendência de travar as guerras
culturais em todos os teatros possíveis parece ter vindo para ficar, minha
sugestão é que deixemos de batizar logradouros com nomes de pessoas. O herói de
um gestor pode ser o vilão de seu sucessor. Para evitar o fenômeno do rebatismo
retaliatório e as confusões referenciais que ele gera, acho que deveríamos
passar a usar só números e nomes comuns.
2 comentários:
Apoiado.
Para a maioria da população o Elevado continua sendo apenas o Elevado ignorando o nome oficial.
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