terça-feira, 5 de agosto de 2025

Tensão máxima na semana decisiva - Míriam Leitão

O Globo

Negociação com EUA fica mais travada com prisão de Bolsonaro, e saída europeia fica mais difícil sem veto a PL do licenciamento

A semana já estava bem tensa quando o ministro Alexandre de Moraes decretou a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro. O tarifaço está marcado para começar a valer amanhã e não há sinais de negociação. Se houvesse alguma brecha, ela desapareceria depois da decisão sobre o ex-presidente. Num outro campo, está correndo a contagem regressiva para o veto ou não do PL do licenciamento. Parece tema distante, mas está inserido no mesmo dilema das relações internacionais. Se não for vetado, o Brasil pode ter problemas com outros parceiros, como a Europa.

Como enfrentar o truculento Donald Trump? É preciso tentar negociar, apesar de parecer impossível. Mas também é necessário pensar estrategicamente em outros mercados. O problema é que a caminhada insensata rumo à destruição ambiental pode nos fechar mercados alternativos. A Europa como um bloco é o segundo maior mercado brasileiro. O projeto de aprofundar essa relação através de um acordo comercial Mercosul-União Europeia pressupõe que o Brasil cumpra sua legislação ambiental e não a destrua, como faz esse PL. O caminho do meio que o governo tenta, que é vetar em parte, fará de nossa lei para o licenciamento ambiental um Frankenstein.

A decisão de Alexandre de Moraes de apertar o cerco em torno de Jair Bolsonaro será entendida na Casa Branca como se fosse uma provocação do Executivo. Dado que Trump decidiu fingir que não sabe como funciona o check and balances entre poderes numa democracia. A ação penal à qual responde por tentativa de golpe de Estado está chegando na etapa final, mas o que aconteceu ontem tem a ver com outra investigação pela qual ele ainda nem foi indiciado.

O inquérito por coação da Justiça é respondido por Eduardo Bolsonaro e foi nesse que Bolsonaro teve as medidas cautelares que o levaram a usar tornozeleira e não poder usar redes sociais. No domingo, o senador Flávio Bolsonaro fez uma ligação com o pai no meio da manifestação e transmitiu a voz dele pelo som. Depois fez uma postagem disso. E ontem de manhã apagou. Foi o que fez Alexandre de Moraes agravar as medidas cautelares. “O flagrante desrespeito às medidas cautelares foi tão óbvio que, repita-se, o próprio filho do réu, o senador Flávio Nantes Bolsonaro, decidiu remover a postagem realizada em seu perfil, na rede social Instagram, com a finalidade de omitir a transgressão legal”, diz Alexandre de Moraes em sua decisão.

Enquanto isso, na economia, o impacto dos 50% de tarifas vai se tornando uma realidade. Há reflexos diferentes. Segundo o economista José Roberto Mendonça de Barros, do ponto de vista macro, o recuo no crescimento fica entre 0,2% a 0,3%. Mas alguns setores vão sofrer dolorosamente.

— Os produtores de mel do Piauí fizeram um trabalho tão bonito. É agricultura familiar, totalmente orgânica. Acharam um nicho nos Estados Unidos e exportam US$ 300 milhões. O setor de pedras ornamentais no Espírito Santo também não conseguirá exportar. Café ainda tem chance de ficar de fora da tarifa, principalmente pelos americanos, porque este é um preço bem visível. Outro setor que afetará mais a eles do que a nós é o de carne — diz o economista.

Mendonça de Barros acha que os Estados Unidos sentirão o custo desse tarifaço de Trump contra o mundo inteiro. Se, por um lado, os países aceitaram e não houve guerra tarifária, por outro lado todos os dados do mercado de trabalho estão piorando e a inflação vai ser afetada.

— Não tenho dúvidas de que a inflação deles vai subir.

Quanto ao Brasil, há mais problemas a enfrentar. As medidas de socorro têm que ser bem calibradas para chegar rapidamente a quem precisa de ajuda, porém o programa não deveria premiar quem tem capacidade de aguentar o tranco, e nem pode se eternizar.

A prisão domiciliar de Jair Bolsonaro será usada pelos seus apoiadores nos Estados Unidos para aumentar a pressão contra o Brasil. Como é esse assunto que está na mesa, e não uma negociação de comércio, não há sinais de solução à vista. Na mesma semana que se vê a crise com os Estados Unidos se agravar, o presidente Lula terá que decidir o que fazer com o projeto que desmonta a legislação ambiental no Brasil. O governo está dividido entre o veto total e o parcial. O problema é a confusão que ficará na lei se for vetada em apenas algumas partes. Esse projeto, se sancionado, fechará mais portas ao comércio exterior brasileiro.

 

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