Folha de S. Paulo
Emissora foi voz estridente e contínua de
apoio à insurreição
O plano
de golpe executado em 2023 não reuniu só Jair
Bolsonaro e parceiros das Forças Armadas. Condenados
criminalmente os oito operadores da cúpula do golpe e as centenas de
militantes que depredaram a praça dos Três Poderes em 8 de janeiro, resta
voltar os olhos para os agentes de mediação entre o alto e o baixo escalões.
Há quatro núcleos: o político, de lideranças partidárias e parlamentares que usaram do mandato para incentivar a quebra; o jurídico, para bloquear medidas de contenção e responsabilização, sobretudo a Procuradoria Geral da República; o financeiro, para pagar as contas; e o comunicativo, para incendiar a esfera pública e legitimar a insurreição.
O núcleo comunicativo costurou o subterrâneo
do gabinete do ódio e dos algoritmos das redes, cujo negócio privilegia medo e
ódio (motores de engajamento e lucro), a empresas com fachada jornalística.
Entre elas, uma emissora se fez centro nervoso e sonoro: a Jovem Pan.
"Então, esses comandantes do Exército
têm que decidir: eles servem ao povo brasileiro? O criminoso é quem prende, não
é quem vai preso. Esses caras são foras da lei e estão nos impondo coisas na
base da violência. O que o STF decide é
irrelevante. Porque o STF é autor do crime. Um tigre de papel, não tem poder! O
plano do STF vai por água abaixo quando militares decidirem que vão cumprir a
Constituição."
"Se o Presidente der a ordem e alguém
não cumprir, essa pessoa vai sofrer as consequências. O que vai fazer? Vai
colocar força para lutar contra força? O que estou propondo aqui é isso. Um
protesto constitucionalista, sem revolução, sem junta militar, sem golpe."
"Essa história de que ‘ah, vai ter
derramamento de sangue’, não vai ter derramamento nenhum! Eu sei quais são os
comandantes. Eu duvido que os frouxos, que não foram corajosos para fazer, vão
ser corajosos para enfrentar. As minhas fontes militares falam que vão reagir o
PCC, o Movimento dos Sem Terra, as FARC. Eu falo ‘pô, que reajam!’ As Forças
Armadas existem para mandar esses...daqui para um lugar pior. Se vocês vão
defender a pátria, e vai haver reação de vagabundo, ué, passa o cerol!"
Nessa emissora,
em programas ao vivo, essa era a mensagem de apresentadores e debatedores, sem
contraponto fático ou opinativo.
Você, ao modo
Fux, pode ler como crítica exaltada, como destempero. Um exercício da
liberdade de expressão de comentaristas, não posição editorial da empresa.
Ou pode observar que as mesmas frases,
carregadas de mistificações conspiratórias, ameaças, incitações, por semanas,
significam mais. Não só opinião de comentarista, mas estratégia
editorial-empresarial de concessionária de serviço público. Não só ocasional,
mas massiva, estridente e diária. Pode perceber não só o que era comunicado,
mas o como. E sua exata sincronia com Brasília.
Em 2023, o Ministério
Público Federal ajuizou ação e pede três sanções: cancelamento de
outorga de radiodifusão por violação grave da lei de radiodifusão; indenização
por danos morais coletivos; veiculação de direito de resposta da sociedade.
Dias atrás, o MPF apresentou alegações
finais. Resta à 6ª Vara Cível de São Paulo reconhecer que, se houve crime, como
provou o STF, o crime pode ter tido um braço televisivo. Um braço que,
aparentemente, delinquiu, lucrou e não pagou. Não foi só golpismo recreativo.
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