Debate lança mais dúvidas do que conclusões reais; maioria dos brasileiros aprova o livre mercado
DAVOS - A quintessência do capitalismo global, o Fórum de Davos, começa a desconfiar de seu ente querido. Tanto que, em debate sobre o tema, o moderador lançou uma pergunta impensável até o ano passado nesta concentração da nata do empresariado: "O capitalismo do século 21 está defraudando a sociedade do século 21?".
A maior parte do público levantou a mão para responder "sim, está defraudando".
Como se fosse pouco, George Soros, o capitalista que mais sabe ganhar dinheiro com as falhas do capitalismo, soou, em outro ambiente, as trombetas do apocalipse: previu que o "derretimento" do euro, ao qual se seguiria uma crise global que levaria à "revoltas nas ruas da América", um cenário mais para Hollywood que para Davos.
Calma, leitor, não corte os pulsos: em 1994, na esteira da crise mexicana, Soros, aqui em Davos, previra a repetição da grande crise dos anos 30, o que só ocorreu 14 anos depois.
Voltemos ao debate: o incômodo com o capitalismo ficou ainda mais claro pelo fato de que quem dominou a discussão foi a única dos cinco debatedores a responder "sim" sobre o fracasso do capitalismo.
Foi a australiana Sharan Burrow, secretária-geral da Confederação Internacional de Sindicatos.
Disparou, sucessivamente: "o capitalismo perdeu o compasso moral"; "parem com a ganância"; "o setor financeiro está matando a economia real".
Coube a Ben Verwaayen, executivo-chefe do grupo Alcantel-Lucent, fazer o papel de defensor do capitalismo. Primeiro, ao lembrar que há muita gente louca para entrar no capitalismo. É verdade, ao menos a julgar por pesquisa projetada no telão antes do debate: o Brasil, por exemplo, é um dos três países, ao lado de China e Alemanha, a dar aprovação majoritária ao livre mercado.
O impiedoso Verwaayen condenou o que considerou "nostalgia". Para ele "não há volta ao mundo que já foi. Não se trata de um incidente, mas de uma transformação".
De todo modo, houve um ponto de encontro entre os extremos: tanto Burrow como Verwaayen dizem que o problema não é do sistema, mas "da maneira de implementá-lo".
A discussão cai em um ponto enfatizado, em outra sala, por Guillermo Ortiz, ex-presidente do banco central mexicano: "A crítica ao capitalismo está centrada no sistema financeiro e seus excessos. Ninguém está questionando o capitalismo".
Aqui também o Brasil fica fora do foco, pelo menos na visão de Ricardo Villela Marinho (Banco Itaú): "A banca brasileira não tem a consciência pesada. Não demos prejuízo aos cofres públicos" (cutucada sutil à Europa e aos Estados Unidos, que, sim, puseram dinheiro público para resgatar a banca).
Depois dessa sessão no divã, algumas (poucas) conclusões básicas, na palavra de outro capitalista convicto, David Rubenstein, diretor-gerente do Grupo Carlyle (EUA):
1- "Ninguém diz que o capitalismo é perfeito. Não resolveu, por exemplo, o problema da desigualdade."
2- "Há dois tipos de capitalismo, o que conhecemos no Ocidente e o que está sendo chamado de "capitalismo de Estado", modelo da China, por exemplo. Não se sabe qual vai prevalecer."
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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