quinta-feira, 28 de junho de 2012

A crise na Rio+20 :: Paulo Paiva

A ausência dos principais líderes do G-7 na Rio+20, exceto do presidente da França, sugere que a crise que afeta os países industrializados impediu a adoção de compromissos com a preservação do planeta, principalmente no que se refere ao financiamento dos custos relacionados às mudanças, conforme registrou este jornal em editorial na edição de domingo.

As questões que constituíram a pauta da Rio+20 ficaram à espera de acordos internacionais que poderiam garantir um desenvolvimento mais sustentável. O consumo da população mundial continua dependendo quase que exclusivamente de energia não renovável, a devastação das florestas avança aproximadamente no mesmo ritmo do passado e a emissão de gases poluentes e o acúmulo de resíduos sólidos colocam o planeta em alerta. Os riscos ambientais são hoje maiores do que há 20 anos. Se atentarmos para as grandes tendências econômicas e demográficas, as perspectivas para o futuro não são muito promissoras. Dos 7 bilhões de habitantes do planeta, cerca de 2 bilhões compõem a classe média, que é responsável pelo consumo global. Estima-se que até 2030 serão adicionados mais de 2 bilhões e meio de novos consumidores. Em 2010, a classe média, que representava 28% da população mundial, tinha apenas 32% de seu contingente na Ásia. Em 2030, ela constituirá mais da metade da população mundial, com 66% de seus membros vivendo na Ásia. A China será a maior economia do mundo já a partir do início da próxima década e, em 2020, os emergentes serão a metade das 10 maiores economias do mundo. As estimativas disponíveis indicam que nas próximas duas décadas as emissões de gases poluentes continuarão crescendo. Ganhos em eficiência energética serão moderados, em função do aumento da participação das economias emergentes na composição do PIB mundial.

Com exceção do Brasil, em cuja matriz energética há uma maior participação de fontes renováveis, todos os países em crescimento fazem uso principalmente de energias não renováveis. Será possível suportar um padrão de crescimento econômico baseado em oferta ilimitada de energia não renovável? Será factível mudar os padrões de consumo para os novos segmentos que terão acesso aos bens materiais? Estariam os países emergentes dispostos a alterar sua matriz energética? O Brasil, por exemplo, aceitaria desacelerar a exploração do pré-sal? Essas questões exigem reflexões e decisões complexas que colocam frente a frente os interesses globais e os interesses nacionais.

É possível que a crise possa ter tido algum efeito, mas o conflito entre os interesses globais e os interesses nacionais parece-me ser a principal causa do fracasso nos resultados da Rio+20. Enfim, os países industrializados tiveram seu período de prosperidade sem considerar suas repercussões globais. Agora, os países emergentes, como o Brasil, priorizam a inclusão econômica e social; vale dizer, querem considerar a redução da pobreza como parte integrante da discussão sobre desenvolvimento sustentável e não tratar o meio ambiente isoladamente. Acordos para compromissos com a agenda verde exigem maior ação coletiva no plano internacional e a participação efetiva tanto dos países industrializados, que foram os principais responsáveis pelo uso irrestrito dos recursos naturais, quanto dos emergentes, cujas populações almejam atingir os níveis de consumo ocidental. No entanto, os objetivos nacionais colidem com os interesses globais. Por isso se viu um fosso entre a posição governamental expressa no documento final da Rio+20 e a opinião da sociedade civil exibida em reuniões e manifestações nas ruas.

A esperança resta na crescente participação da sociedade, da mídia, dos movimentos e redes sociais. A consciência com o equilíbrio entre bem-estar e preservação ambiental dificilmente prosperará no seio da sociedade sem a disseminação da educação ambiental e mobilização popular. Pouco pode se esperar de consensos entre governantes, mesmo após superada a crise econômica.

Paulo Paiva - professor da Fundação Dom Cabral, foi Ministro do Trabalho, do Planejamento, Orçamento no governo FHC.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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