terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Custo de vida em alta faz brasileiro cortar alimentos

Inflação faz brasileiro cortar até alimentos

Preços em alta não devem dar trégua ao longo do primeiro trimestre deste ano. Consumidores reclamam da calma do governo ante a disparada do custo do vida e já retiram produtos básicos dos carrinhos de supermercados

Vânia Cristino, Priscilla Oliveira

O governo terá que contar com a sorte para que a inflação não fure o teto da meta deste ano, de 6,5%. A maioria dos economistas espera um primeiro trimestre de preços sob pressão, principalmente os dos alimentos. E como ninguém acredita que o Banco Central mexerá na taxa básica de juros (Selic) tão cedo — o indicador deverá permanecer em 7,25% em 2013 — para não prejudicar a retomada do crescimento, qualquer evento extraordinário pode provocar uma disparada no custo de vida.

Na avaliação da economista Tatiana Pinheiro, do Banco Santander, a inflação deste ano ficará em ao menos 6%. Para ela, não haverá alívio no valor dos alimentos a curto prazo, sobretudo porque tudo dependerá de um fator imponderável, o clima, que afetará, além dos produtos agrícolas, o frágil sistema de eletricidade do país. Para piorar, a maior seca dos últimos 50 anos nos Estados Unidos continua a fazer estragos. Ou seja, há a possibilidade de eventos externos e domésticos elevarem os preços dos alimentos para muito além do desejável.

O que Tatiana vê nas projeções dos gráficos do computador, a dona de casa Maria Eunice Oliveira, 32 anos, já está sentido no orçamento doméstico. Com renda familiar mensal de R$ 700 e nove bocas para alimentar, manter o mínimo de bem-estar da família tem sido uma tarefa difícil, tamanha é a carestia nos supermercados. "Tivemos que diminuir a quantidade das compras, porque não temos como pagar tudo. Hoje, com R$ 300, R$ 400, não dá mais para levar nem o necessário. E olha que isso é quase a metade de tudo o que ganhamos", reclamou.

Além do marido, Edilson Santos de Oliveira, 42, que é caseiro, dos três filhos e do irmão, Jail Gonçalves de Brito, 44, que está desempregado, Eunice alimenta cunhadas e sobrinhos, que vêm de longe para trabalhar e estudar. "Está muito difícil dar o que comer para todo mundo. A cada semana que vou ao supermercado, tudo está mais caro", assinalou. Apenas para comprar um pacote de cinco quilos de arroz, um quilo de feijão, um litro de leite, um quilo de tomate, uma lata de óleo e um quilo da carne mais barata, precisa desembolsar mais de R$ 50. O problema é que esses produtos duram, no máximo, quatro dias, assim mesmo, com muito racionamento.

Repasses

Responsável pelo mercado Dona de Casa, no Paranoá, Morais Alves disse que a alta de preços está assustando a todos. "Os alimentos já chegam às distribuidoras com preços bem elevados. Os reajustes vêm desde o meio do ano passado. Está impossível para nós não repassar os aumentos para a clientela", frisou. A faxineira Maria José Rodrigues, 51, notou os reajustes. Ela contou que gasta a maior parte do salário no supermercado, com comida. "Nos últimos meses, só levo para casa o básico", ressaltou.

Além das despesas com alimentação, Maria sente o aumento dos medicamentos. "De uns três meses para cá, deu para ver uma diferença de até R$30 em alguns remédios. Às vezes, abro mão de cuidar da minha saúde para não deixar de comer", afirmou. A situação não é muito diferente na casa da comerciante Irani Oliveira da Silva, 42. "Estou cortando uma série de produtos da minha lista de supermercado. Tomate, por exemplo, não compro mais, pois está custando até R$ 9 o quilo. Iogurte e suco, só das marcas mais baratas. Tudo ficou muito caro de uns três meses para cá: óleo, arroz, carne, feijão. Ela lembrou que, há um ano, gastava cerca de R$ 350 com a compra mensal de alimentos. Hoje, desembolsa, no mínimo, R$ 700.

Diante desse quadro, está difícil para os consumidores entenderem a tranquilidade do governo quando se refere à inflação. Pelos dados oficiais, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 5,84%, com os alimentos subindo quase o dobro. Segundo o Banco Central, apesar de pressionados no primeiro trimestre deste ano, os preços vão ceder ao longo de 2013, fechando em 4,7%. "Sinceramente, não acredito nesses números. Para mim, a inflação real é a que encontro nas gôndolas do supermercado. E ela está muito alta, subindo todos os meses", disse o marceneiro José Antunes, 34.

O economista Eduardo Velho, da Planner Corretora, reconhece o descontentamento dos consumidores. E avisou que, com a carestia dos alimentos e a alta dos preços dos serviços e da educação, a inflação ficará, nos próximos meses, bem acima do centro da meta, de 4,5%, perseguida pelo Banco Central. Nas suas contas, somente na primeira quinzena de janeiro, o reajuste médio dos alimentos foi superior a 2,5%.

Não à toa, Sílvio Campos Neto, economista da Consultoria Tendências, mostra preocupação com os fatores de risco que podem elevar o IPCA nos próximos meses. Além da retomada do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), para 3,2% no ano, haverá reajustes nas tarifas de ônibus urbanos e nos combustíveis, e o retorno do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de carros e eletrodomésticos, que estavam zerados. "O sinal é de alerta", disse.

Fonte: Correio Braziliense

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