Raquel Ulhôa
BRASÍLIA - Diante do fracasso das tentativas de lançar um concorrente politicamente viável ao líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), na eleição para a presidência do Senado, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) está enviando carta aos colegas com duras críticas à "falta de transparência", "desvios éticos", "submissão" ao Poder Executivo e "inoperância" da gestão nos últimos anos. Para ele, o resultado é um Legislativo "incompetente e inconsequente".
Cristovam, que já enviou o documento para mais da metade dos senadores e tem recebido sugestões, busca apoio para a divulgação de um documento cobrando do próximo presidente compromisso com medidas para "recuperar a eficiência e a credibilidade" da Casa. Entre as sugestões - que recebeu de João Capiberibe (PSB-AP) -, está a criação de uma comissão de parlamentares para acompanhar e fiscalizar a administração do biênio 2013-2014.
"Nos últimos anos o Senado tem acumulado posicionamentos que desgastaram sua imagem perante o povo brasileiro, especialmente pela falta de transparência, pela edição de atos secretos, pela não punição exemplar de desvios éticos e pela perda da capacidade de agir com independência", afirma.
Além de "submissão" ao Executivo, aceitando as medidas provisórias os requisitos previstos na Constituição, o senador aponta "inoperância" do Congresso, citando como exemplo a não apreciação de 3.060 vetos presidenciais acumulados por quase 20 anos. Nesse tema, classifica como "ridícula" a tentativa de votar esses atos pendentes em uma tarde - numa estratégia comandada pelo presidente, José Sarney (PMDB-AP), e líderes partidários com o objetivo de apreciar o veto da presidente Dilma Rousseff à nova repartição da receita do petróleo.
Cristovam integra o grupo suprapartidário de senadores que pretendia lançar uma alternativa viável à sucessão de Sarney, mas fracassou. Embora Pedro Taques (PDT-MT) e Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) ainda admitam a colegas que podem se disputar, as chances de vitória são consideradas nulas, por falta de articulação.
O senador do PDT questiona o lançamento de um candidato sem chance, apenas para marcar posição. Prefere coletar apoios para um documento cobrando compromissos do próximo presidente com uma profunda reforma na administração, que dê à Casa um "novo rumo".
Na carta aos colegas, Cristovam compara o processo eleitoral da próxima Mesa Diretora, a ser escolhida em 1º de fevereiro, às eleições do passado, comandadas por "coronéis" da política.
"Voltaremos [do recesso] apenas para ratificar o nome, nomeado sem apresentar qualquer proposta que mude o nosso funcionamento. Votaremos como os eleitores que iam às urnas na Primeira República, levando a cédula sem conhecer o nome do candidato escrito nela pelos antigos coronéis de interior", afirma.
A condição de Renan como o candidato do PMDB - partido que tem o direito ao cargo por ter a maior bancada - é conhecida, mas o líder adia a oficialização de sua candidatura, para reduzir o desgaste com a lembrança de processos por quebra de decoro que sofreu e exposição a novas críticas. É exatamente o que está acontecendo com o líder do PMDB na Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (RN). Candidato a presidente daquela Casa, está sofrendo denúncias na mídia.
No documento que está enviando aos senadores, o representante do DF lembra recentes motivos de desgaste da Casa, como a não votação do Orçamento para 2013 e a não definição de novos critérios de rateio do Fundo de Participação dos Estados até 31 de dezembro de 2012, descumprindo determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). O Legislativo jogou "as finanças dos Estados em um abismo", avalia.
Acrescenta o fim "vergonhoso" da CPI do Cachoeira e o "equívoco" cometido pela administração do Senado por não descontar Imposto de Renda de parte do salário dos senadores. Para o representante do DF, a consultoria jurídica do Senado tem feito "análises frágeis" e precisa de uma reforma.
"Tudo isso exige que a eleição de um novo presidente seja feita com debates entre nós senadores para, antes da eleição, sabermos quais as propostas para recuperar a eficiência e a credibilidade do Senado, ajudando a recuperar a de todo o Parlamento", diz Cristovam na carta. Critica a falta de debate de ideias entre os parlamentares, o plenário vazio e os discursos feitos "para a televisão".
A primeira sugestão apresentada por Cristovam é a realização de reuniões ordinárias de segunda a sexta, para limpar a pauta de assuntos importantes como os vetos presidenciais, a reforma política, o Código Civil, as reformas no regimento e na estrutura do Senado, as relações com os demais poderes (inclusive como tratar as MPs e como evitar a judicialização da política), o novo Plano Nacional de Educação e a revisão dos critérios de distribuição do Fundo de Participação dos Estados.
Também pede um mecanismo que "impeça o rolo compressor nas votações", reforma da consultoria legislativa para impedir os "erros recentes", manifestação explícita dos votos em comissões e plenário, cumprimento dos prazos regimentais, redução do número de comissões, escolha de relatores por "critérios republicanos pré-definidos", com rodízio entre todos os senadores e criação de um comitê de senadores para acompanhar e fiscalizar as decisões tomadas pelos servidores e pela mesa diretora.
"Este comitê asseguraria total transparência aos processos licitatórios, inclusive com divulgação ampla pela internet de todas as receitas e gastos do Senado, mantendo os senadores permanentemente informados sobre a gestão da Casa", propõe.
Cristovam defende que o próximo presidente garanta o "papel fiscalizador" do Senado, instalando automaticamente todo pedido de comissão parlamentar de inquérito feito pelo número mínimo de senadores, exigido pela Constituição. Essa ideia foi apresentada por Randolfe.
O senador do PDT termina a carta, cujo título é "Uma nova presidência e um novo rumo para o Senado", pedindo sugestões aos colegas para "ajudar a reorientar os rumos" do Legislativo.
Fonte: Valor Econômico
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