• Manifesto fala de "cerco e aniquilamento" ao partido e em retomar "radicalidade política"
Sérgio Roxo e Julianna Granjeia – O Globo
SÃO PAULO - Em reunião com o ex-presidente Lula, os 27 diretórios estaduais do PT aprovaram ontem um manifesto em que afirmam que o partido sofre uma campanha de "cerco e aniquilamento" por conta de suas "virtudes" e não por seus erros. Os petistas chegam a comparar a crise atual à campanha de Lula à Presidência em 1989, quando foi atribuído a militantes o sequestro do empresário Abílio Diniz.
O encontro contou com a presença da comissão executiva nacional do partido, menos o tesoureiro João Vaccari Neto que, acusado de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha no contexto da Operação Lava-Jato, resiste a se desligar do cargo e tem o apoio do presidente da sigla, Rui Falcão que, ontem, voltou a defendê-lo. A reunião ocorreu em um hotel de São Paulo e os dirigentes não discutiram a eventual saída do tesoureiro. Sem citar o nome de Vaccari, apenas dois diretórios, o do Rio Grande do Sul e o de Santa Catarina, defenderam que sejam afastados os filiados investigados em processos de corrupção. Mas o manifesto aprovado pelo PT defende apenas que sejam excluídos os petistas condenados.
Tarso defende saída do tesoureiro
Para evitar "vazamentos", os celulares de todos os dirigentes foram confiscados até o fim da reunião. De acordo com os participantes, Lula se disse confiante na recuperação da crise e pediu ânimo aos petistas, além de maior engajamento com a militância e os movimentos sociais nos atos que estão sendo organizados para defender o governo da presidente Dilma Rousseff.
O documento lançado pelos petistas cita o caso de corrupção na Petrobras, mas destaca que as investigações sobre as irregularidades ocorreram no "nosso governo, algo que não ocorria em governos anteriores". "Querem fazer do PT bode expiatório da corrupção nacional", afirma o texto. A única citação indireta à situação de Vaccari aparece no trecho: "Caso qualquer filiado do PT seja condenado em virtude de eventuais falcatruas, será excluído de nossas fileiras".
- Ele está sendo investigado há um ano. Já teve sigilos bancário e fiscal quebrados, já depôs na Polícia Federal, não está preso. Ele é acusado. Quem é acusado não necessariamente é culpado - disse Falcão ontem, na saída da reunião dos petistas.
Mais cedo, o ex-governador do Rio Grande do Sul Tarso Genro defendeu publicamente a saída do tesoureiro. Ele é um dos fundadores da corrente partidária "Mensagem ao partido", que se posiciona contra a permanência do tesoureiro. O grupo, no entanto, não fez aparte nas discussões da reunião para tratar do caso.
- Se ele foi denunciado e se a denúncia foi aceita, como é a informação que temos, o partido deve pedir para que ele se afaste. E se ele não se afastar, afastá-lo preventivamente - disse Tarso, à imprensa.
Já Rui Falcão disse que o afastamento de citados em casos de corrupção do comando partidário teria que ser aprovado pelo diretório nacional do partido.
- A reunião do diretório será no dia 17. Se uma proposta de afastamento de citados for apresentada, será apreciada.
"Setores flertam com golpismo"
O manifesto petista também compara o atual momento com o episódio em que a legenda foi responsabilizada pelo sequestro do empresário Abílio Diniz, em 1989. "O fato mais marcante numa longa trajetória de manipulações (sofridas pelo partido) foi imputarem ao PT o sequestro do empresário Abílio Diniz", diz o documento, em seu parágrafo inicial.
"A ofensiva de agora é uma campanha de cerco e aniquilamento, como nunca antes", prossegue o documento, que completa: " Como já propuseram no passado, é preciso acabar com a nossa raça. Para isso, vale tudo. Inclusive criminalizar o PT, quem sabe até toda a esquerda e os movimentos sociais".
Como resposta à crise, o PT propõe o aprofundamento da reforma agrária, o apoio à criação de um imposto sobre grandes fortunas e a aprovação do projeto de lei que estabelece o direito de resposta nos meios de comunicação, além de retomar a "radicalidade política" da época da fundação da legenda.
Para os petistas, erros "certamente ocorrem em organização que reúnem milhares de filiados". "Perseguem-nos pelas nossas virtudes. Não suportam que o PT, em tão pouco tempo, tenha retirado da extrema pobreza 36 milhões de brasileiros. Que nossos governos tenham possibilitado o ingresso de milhares de negros e pobres das universidades", diz o documento.
- É preciso enfrentar os flertes de alguns setores com o golpismo, com aqueles que tentam reverter o resultado eleitoral do ano passado sem que se realizem novas eleições - afirmou Rui Falcão, depois da divulgação do manifesto. - É impensável que a gente possa ser acusado de corrupção. Em toda a nossa história, todos os ataques que se dirigiram contra nós nunca foram para chamar a gente de ladrão - completou.
A principal autocrítica do manifesto se refere à retomada da democracia participava, "interna e externa", segundo Falcão. O presidente do partido reconheceu problemas oriundos da profissionalização da militância e do apego de parlamentares aos cargos para o qual são eleitos, classificado no manifesto de "cretinismo parlamentar".
Outro assunto discutido no encontro dos diretórios foi o fim de doações de empresas ao partido. Segundo petistas que participaram da reunião, há um consenso em todos os diretórios de que o PT não aceite mais esse tipo de contribuição. Falcão disse que é favorável à proposta e que está conversando com os dirigentes sobre o assunto. O assessor especial da Presidência Marco Aurélio Garcia, membro da Executiva, também está articulando o projeto que deve ser oficializado no congresso nacional do partido.
Janine encontra Lula
Antes de mesmo tomar posse como ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro participou de uma reunião com Lula. Segundo Paulo Okamoto, presidente do Instituto Lula, a reunião estava marcada antes da escolha de Janine como ministro, e faz parte de uma série de encontros que estão sendo feitos regularmente com intelectuais para discutir a conjuntura política. Lula citou artigos publicados por Janine na imprensa, mas quem falou mais foi o professor da USP. Ele abordou a qualidade dos serviços públicos, que, na sua visão, seriam a agenda do momento na democracia brasileira.
(Colaborou Stella Borges, estagiária) .
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