Dilma minimiza críticas feitas a ela por Levy
• Presidente diz que fala foi mal interpretada; ministro reclama que fizeram um "banzé" com suas declarações
Luiza Damé – O Globo
CAPANEMA (PA) e SÃO PAULO - A presidente Dilma Rousseff relativizou ontem as declarações do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que, em encontro com ex-alunos da Universidade de Chicago, semana passada, afirmou que "há um desejo genuíno da presidente de acertar as coisas, às vezes, não da maneira mais fácil... Não da maneira mais efetiva, mas há um desejo genuíno". Dilma afirmou que a fala do ministro foi mal interpretada e retirada do contexto. Ontem, durante almoço com empresários em São Paulo, Levy, disse que fizeram "um banzé" com suas declarações e que uma parte irrelevante de sua fala foi pinçada do discurso feito em inglês. Mas, para analistas, o episódio pode dificultar as negociações do ajuste fiscal no Congresso.
Na entrevista, concedida após a inauguração de um conjunto residencial do programa Minha Casa Minha Vida, no Pará, Dilma aproveitou para falar sobre a crise econômica. Segundo ela, nos últimos seis anos, o país enfrentou um "verdadeiro tsunami" com a crise internacional. A mesma crise foi classificada em várias ocasiões como "uma marolinha" pelo seu antecessor, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva :
- O Brasil está enfrentando algumas dificuldades, mas são dificuldades passageiras. Uma coisa é você ter de ajustar um pouco o seu orçamento, outra é você ter de reformar tudo. Nós não vamos reformar tudo, porque o Brasil tem uma base sólida. (...) O Brasil teve, ao longo dos últimos seis anos, de segurar a onda, um verdadeiro tsunami da crise internacional, que desempregou 60 milhões de pessoas na Europa, que tirou direitos e acabou com garantias de emprego. Enfim, produziu uma catástrofe social.
A presidente tentou pôr fim à discussão sobre a fala polêmica de Levy.
- O que o Levy falou está dentro de um contexto. Se você pegar fora do contexto, vai entender distorcido. Ele falou, e agradeço o elogio dele, que nós fazemos um imenso esforço para fazer o ajuste. Às vezes, em política eu não posso seguir o caminho curto, eu tenho que ter o apoio de todos os que me cercam. Então tem uma questão de construir o consenso. Foi nesse sentido que ele falou. Não temos que criar maiores complicações por isso - argumentou a presidente.
Dilma disse que o ministro falou com ela e esclareceu os comentários.
- Ele explicou exaustivamente. Ele ficou bastante triste com isso e me explicou, sim, senhora. Eu li. Eu também tenho discernimento. Eu tenho clareza que ele foi mal interpretado. Tenho clareza disso - afirmou.
No sábado, a presidente Dilma pediu ao ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que ligasse para Levy e ouvisse suas explicações sobre o episódio. O ministro da Fazenda disse, então, a Mercadante que fora mal interpretado. Ontem, ele contou, no encontro com empresários em São Paulo, que já havia conversado com a presidente Dilma sobre o episódio durante o fim de semana.
- A parte relevante do discurso é que a presidente tem genuinamente interesse de endireitar as coisas no Brasil, tem um genuíno interesse em fazer isso. Mas pegaram a segunda parte da minha sentença para fazer um banzé. O que eu quis dizer é que na vida real, na política, nas empresas, muitas vezes, se trabalha sob pressão e nem tudo acontece do jeito que a gente desejaria. As coisas são, portanto, difíceis - explicou o ministro, respondendo a um empresário, que quis saber por que o governo se comunicava tão mal.
Não é difícil ser ministro de Dilma, diz
Levy também aproveitou para rebater uma questão de outro empresário, que quis saber o quão difícil seria ser ministro de Dilma.
- Não é verdade que é difícil ser ministro de Dilma. Eu discordo - afirmou.
Na gravação da palestra, fica evidente que o ministro mencionou a presidente Dilma espontaneamente. Sem citar o nome dela, um participante do encontro pergunta quais mudanças ocorreram na política econômica, qual apoio o ministro tem tido dentro do governo e para onde a nova visão do governo levará o país nos próximos quatro anos.
- Eram tempos mais fáceis. E é por isso que temos falado para as pessoas: "Olhe, você não pode cometer erros agora". Precisamos continuar a trabalhar. E trabalho duro requer paciência - afirmou Levy aos ex-alunos, emendando na frase sobre a presidente.
O ministro não acredita que o episódio possa prejudicar as negociações do ajuste fiscal no Congresso e mostrou disposição ao diálogo. Hoje, ele estará na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado para participar de audiência pública sobre o ajuste fiscal. O ministro deve apresentar uma proposta alternativa para a regulamentação da lei que muda os contratos de dívidas de estados e municípios com a União. A crítica que ele fez à presidente também pode entrar na pauta.
Ontem, em Capanema, a presidente afirmou que o governo federal está trabalhando para que o Brasil volte a crescer.
- Cada dia é um dia, e nós estamos, todos os santos dias, todos os minutos dos santos dias, trabalhando para que o Brasil retome a taxa de crescimento compatível com seu potencial. Sem ajustes, nós fomos até onde pudemos, absorvendo no orçamento fiscal do país todos os efeitos da crise. Estamos agora reajustando o que fizemos. Nesse programa da folha (desoneração da folha de pagamentos), a gente perdeu R$ 25 bilhões. Estou reduzindo para R$ 12 bilhões - afirmou a presidente.
Segundo Dilma, durante a crise, o Brasil não desempregou pessoas, porque o governo federal adotou políticas de desoneração e de subsídio ao crédito. Agora, disse, o governo terá de ajustar essas políticas. O ministro Levy afirmou que tanto o governo quanto o Congresso devem aproveitar o voto de confiança dado pela agência de classificação de risco Standard & Poor"s ao manter o grau de investimento do Brasil. Sem o ajuste fiscal, afirmou o ministro, o país corre o risco de ter o Rating rebaixado. Segundo ele, a perda da nota traria consequências ruins para a economia, com perda de investimento estrangeiro, inclusive de multinacionais.
- É importante aproveitar esse voto de confiança, não no ministro da Fazenda, mas nas nossas instituições, como o Congresso, e fazer os ajustes.
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