- O Globo
A História brasileira anda muito repetitiva, o que a transforma em farsa com facilidade. E não apenas pelas semelhanças desta eleição com a de 1989, de que tanto já se falou e que o senador Collor, apresentando-se como candidato, só reforçou.
Em 2005, quando estourou o escândalo do mensalão, todos davam o então presidente Lula morto politicamente, a ponto de o PSDB ter descartado a possibilidade de pedir o impeachment dele. Seria o segundo presidente impedido em pouco tempo, e, além do mais, era preciso evitar “um Getulio vivo”, na definição de Fernando Henrique.
Lula, como anda fazendo agora, chegou a enviar emissários aos tucanos propondo uma negociação: não seria candidato à reeleição, desde que o deixassem terminar o mandato. Deu no que deu, Lula venceu a reeleição.
Naquele ano, seu adversário foi o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que teve mais votos no primeiro que no segundo turno. A votação surpreendente no primeiro turno, em volta de 40%, indicava que poderia vencer a eleição pela fragilidade de Lula diante das acusações de corrupção no mensalão. Mas Alckmin, fundador do PSDB, mas o menos tucano dos tucanos na aparência e no pensamento, cometeu erros crassos, a começar por aceitar fazer uma pausa na campanha entre o primeiro e o segundo turnos. Lula ficou tão abalado com a votação de Alckmin que sumiu de circulação por uns dias.
Na volta, o tucano desfilou com um colete cheio de logotipos de empresas estatais, para desmentir que pretendesse privatizá-las, mesmo depois do sucesso da privatização da telefonia. Hoje, Alckmin apresenta-se novamente como candidato, mas sua candidatura não deslancha, o que faz o PSDB buscar alternativa.
Fernando Henrique diz que o apresentador Luciano Huck “sempre foi muito próximo ao PSDB, o estilo dele é peessedebista. É um bom cara”. Voltamos à coincidência. Ao definir Fernando Haddad — que pode vir a ser seu substituto agora na eleição — como o candidato petista à prefeitura de São Paulo em 2012, Lula disse que ele tinha sido escolhido por ter “cara de tucano” numa cidade tucana. Deu certo na primeira vez, errado na reeleição, quando apareceu João Doria, com mais cara de tucano ainda, e levou no primeiro turno. Nem Doria nem Huck, com estilos tucanos, tem vez na disputa presidencial pelo PSDB hoje — e podem sair pela tangente, em outros partidos. Doria pelo DEM ou mesmo pelo PMDB — ontem ele teve uma reunião com o presidente Temer para debater a campanha presidencial — e Huck, pelo PPS.
De volta ao futuro, o novo advogado de Lula, o ministro aposentado do STF Sepúlveda Pertence, comparou-o a Getulio logo na sua primeira fala na nova função. Disse que perseguição igual, nem mesmo contra Getulio. Temos aí a volta do Getulio vivo que tanto temia Fernando Henrique há 13 anos.
A proposta atual de Lula não tem nem mesmo um começo, pois dizer-se que ele não se candidatará em troca de não ser preso é uma negociação nula. Não há jeito de Lula não ser preso, ou dentro de poucos meses ou no final do processo, mesmo que a nova jurisprudência do Supremo volte à exigência do trânsito em julgado, o que é difícil de acontecer.
Sepúlveda Pertence é velho companheiro de Lula, foi advogado do líder operário durante a ditadura, aventado como vice na primeira vez em que ele se candidatou à Presidência. Não merece a acusação de que entrou na disputa jurídica para constranger seus antigos companheiros de STF. Mas tem uma missão impossível pela frente: anular o julgamento do TRF-4 ou acabar com a Lei da Ficha Limpa, únicas maneiras de evitar a prisão de Lula e conseguir que ele se candidate em outubro. Para retardar a prisão, basta que o plenário do STF mude a jurisprudência sobre o início do cumprimento da pena em segunda instância, o que, se acontecer, não terá sido por influência dele.
O ministro Gilmar Mendes já anunciou que está em transição para mudar o voto, o que inverte o resultado. Mas a ministra Rosa Weber permanece uma incógnita. Ela tem seguido a maioria, a favor da prisão em segunda instância, embora tenha votado contra e continue com o mesmo pensamento. Ela tanto pode manter seu voto, como pode votar a favor da atual jurisprudência apenas para não mudar devido a um caso específico.
No caso de Lula, então, há outra coincidência com o passado. Rosa Weber teve como assessor no julgamento do mensalão ninguém menos que o juiz Sergio Moro. E Lula, no petrolão, foi apanhado numa conversa com Jaques Wagner — que é outro possível substituto de Lula na urna eletrônica — pedindo que ele fizesse pressão sobre Rosa para que tirasse seu caso de Moro. Não deu certo.
Na coluna de ontem, por erro de revisão, o nome do novo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luiz Fux, foi trocado pelo do ministro Ricardo Lewandowski. No blog saiu correto. Peço desculpas aos leitores e aos ministros.
*Essa coluna voltará a ser publicada no dia 27. Bom carnaval a todos.
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