sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Cristian Klein: Huck, o insider

- Valor Econômico

Apoio de FHC é inusitado, mas não incoerente

Ano eleitoral, chega o Carnaval e, como sempre, a classe política acelera as articulações para pôr a escola na avenida. O som do tamborins é a senha de que não há muito tempo a esperar. As incertezas existem, é mais prudente aguardar uma definição do cenário, mas quem, senão eles mesmos, os responsáveis pelos contornos da disputa? O Judiciário, alguém pode apontar. Mas este já parece ter emoldurado o quadro principal para a Presidência da República. Sem Lula. O que não é pouco. A presença ou não do petista é o elemento fundamental. Mas a gravidade do caso já põe a possibilidade de prisão como fato mais premente que a candidatura cada vez mais improvável.

Política é trabalho em rede. Eleições requerem coordenação. Os grandes atores se movimentam. Na véspera da folia, a semana terminou com Temer conversando com João Doria, FHC com Luciano Huck, PPS pondo água no moinho da candidatura de Rodrigo Maia; e Kassab secando as pretensões de Henrique Meirelles.

De todos os movimentos, o do ex-presidente da República com o apresentador de TV é o que carrega o maior potencial de impactar a eleição. Não só pela capacidade de construir uma novidade, como pela de destruir estruturas pré-estabelecidas.

Com uma articulação ostensiva de FHC, o projeto Huck deixaria de ser o que vem sendo considerado: a candidatura de um outsider. Já não era muito. O apresentador circula e se consulta com dirigentes partidários, esteve com o DEM, garantiu a legenda do PPS. Algo natural devido ao monopólio de representação que as agremiações políticas detêm no Brasil. Mas vinha sendo impulsionado por agentes fora dos partidos, como o economista Arminio Fraga, e movimentos de renovação cujos líderes pretendem entrar no mundo político tradicional (Agora! e RenovaBR).

Com a ajuda de FHC, a candidatura Luciano Huck ganha um ar formal, de solução encontrada pelo sistema, num acordo que, idealmente, inclua o maior número de aliados. Difícil não recorrer a frações do grande bloco de sustentação do governo Temer. Será menos um outsider no sentido de alguém que arranca, a cotoveladas, quase que individualmente, com seu pequeno grupo e amplo apoio popular, para surpresa e em desagrado aos interesses e esquemas políticos estabelecidos.

Se confirmado, Huck será um outsider com as bênçãos da caciquia e parte do governismo. Mas não deixará de ser "disruptivo". Sua candidatura corrói o PSDB por dentro, pelo apoio inusitado do presidente de honra tucano. Inusitado, mas não incoerente ou imprevisível. Quem acompanhou os discursos de FHC em eventos como lançamento de suas memórias em livraria do Leblon ou almoço com empresários na Associação Comercial, nos últimos meses, não pôde deixar de reparar que o ex-presidente abria a porta para uma terceira via, fora do PSDB, enquanto o partido discutia se o candidato seria Geraldo Alckmin ou João Doria. Para FHC, partido não é um dogma.

Para amenizar, não adianta dizer que o estilo de Huck é a cara do PSDB, se o amigo não é o candidato tucano. A movimentação enfraquece demais Alckmin, num momento em que o governador de São Paulo precisa de respaldo para atrair aliados e formar uma coligação competitiva. O DEM, do presidente da Câmara Rodrigo Maia, está mais do que preparado para sair da órbita dos tucanos. Discute candidatura própria para Maia e é cotado para substituir o PPS como legenda mais estruturada para turbinar o projeto Huck.

Há quem sugira que a participação do apresentador na disputa possa contribuir de alguma forma para a vitória de Alckmin, em eventual apoio de Huck ao tucano no segundo turno. Isso na suposição de que teria, então, um capital político a transferir para o governador. Conjecturas e simulações que qualquer cidadão - que dirá político experiente - minimamente informado afastaria de imediato. Basta ver a reação de ontem do sempre ponderado Alckmin ao classificar de "incivilidade" o elogio de FHC que estimula a candidatura do apresentador.

Huck não ajuda; praticamente sepulta as chances do governador de ir ao segundo turno. Como se Alckmin já não tivesse problemas suficientes: a concorrência de Jair Bolsonaro, à direita, e do senador e ex-tucano Alvaro Dias (Podemos-PR). O desempenho de Dias no último Datafolha mostra uma insuspeita força regional do parlamentar. Na região Sul, no cenário mais provável com Lula, o senador fica em terceiro lugar, com 11%, atrás do petista (22%) e de Bolsonaro (19%). Dias tem a preferência de Alckmin (5%) e Huck (6%) somadas, o que mostra como a pulverização mina o potencial do tucano.

No principal cenário sem Lula, na região Sul, Dias, com 16%, está tecnicamente empatado com Bolsonaro, 19% - quatro pontos acima da soma de Huck (7%) e Alckmin (5%). A autofagia das forças de centro-direita aumenta as chances de que um candidato de esquerda vá ao segundo turno. Numa eleição sem Lula, o risco para os competidores será o excesso de autoconfiança. Há tempo para sambar, durante e depois do Carnaval.

Bolsonaro
Em relação a informações sobre os bastidores da pré-campanha do deputado federal Jair Bolsonaro, publicadas na última coluna (1º/2), a partir de relato de fonte próxima ao presidenciável, o advogado Alessandro Carracena entrou em contato para rebater as declarações sobre supostos fatos envolvendo o advogado Rodrigo Amorim e o ex-árbitro de futebol Gutemberg de Paula, seus clientes, e o advogado Bernardo Santoro. Em nota, afirma que as alegações são "mentirosas", desafia que a fonte aponte "qualquer fato concreto que fundamente suas falácias" e diz que "os ofendidos já estão buscando as medidas judiciais cabíveis". "Ambos (Gutemberg e Rodrigo) repudiam os termos de baixo calão e discriminatório com o qual foram identificados (três porquinhos), bem como a criminosa insinuação de que teriam praticado negociações escusas em nome do candidato Jair Bolsonaro".

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