Esta foi uma das semanas mais tensas no Reino Unido nos últimos anos. Em curto espaço de tempo, o plano do governo conservador para a saída do país da União Europeia (UE), o Brexit, foi rejeitado por maioria esmagadora, e a primeira-ministra inglesa, Theresa May, sobreviveu a um voto de desconfiança por margem bastante estreita. Os nervos à flor da pele não se distendem aí. Até segunda-feira, May precisa apresentar alguma alternativa, sob intensa pressão dos colegas parlamentares e expectativa da população, não só inglesa, mas global.
A apresentação de um plano de saída que desagradou a praticamente todos foi uma surpresa, considerando que o Brexit foi aprovado em plebiscito, em 2016, por 52% da população, 17,4 milhões de britânicos, em uma das mais visíveis manifestações da onda de conservadorismo antiglobalização e xenófoba. O acordo de saída está sendo negociado há dois anos com a União Europeia. Ainda assim, não atendeu as expectativas e foi rejeitado pelo Parlamento por 432 votos a 202, a maior margem já registrada em tempos modernos. Membros do próprio partido de May e do Partido Unionista Democrático (DUP, na sigla em inglês), da Irlanda do Norte, foram contra. Dessa forma, o suspense continua.
O líder da oposição, Jerome Corbyn, esperava que Theresa May renunciasse depois de tamanha derrota e da falta de apoio inclusive de conservadores e que novas eleições gerais fossem convocadas, abrindo espaço para seu partido, o Trabalhista. Mas isso não aconteceu e, então, ele encaminhou moção de desconfiança contra a primeira-ministra. Surpreendentemente, May sobreviveu, apesar de ter escapado por pouco, com 325 votos contra a moção e 306 a favor. Contribuíram para a exígua diferença de 19 votos o apoio de mais de 100 parlamentares do Partido Conservador e do DUP irlandês, que haviam reprovado o plano para o Brexit, mas não querem novas eleições gerais.
Agora se espera o Plano B da primeira-ministra, enquanto a quinta maior economia do mundo segue no escuro. Há muitos interesses divergentes a conciliar e já se dá como certo um pedido de adiamento do Brexit, marcado para 29 de março. A própria May agora admite que pode negociar uma prorrogação do prazo, o que exigiria a concordância dos demais 27 membros da UE.
A falta de acordo para a saída também realimentou as expectativas de realização de um novo plebiscito, como defende o Partido Trabalhista. Até o Financial Times defendeu em seu editorial (17/1) que, "diante de um impasse duradouro em Westminster, talvez seja melhor se voltar ao povo", argumentando que a ausência de uma proposta pode acabar levando os deputados a sancionar um Brexit "duro e desastroso". Pesquisas indicam que um segundo plebiscito agora aprovaria a permanência do Reino Unido na União Europeia por uma ligeira margem de vantagem, invertendo o resultado anterior.
Há outras posições, que incluem estabelecer apenas uma parceria econômica com a UE, como a que alguns países da Escandinávia firmaram; ou uma mera união aduaneira, sem abrir as fronteiras a trabalhadores de outros países do bloco nem participar de acordos para abrigar imigrantes. De todas as alternativas, a mais arriscada parece ser a dos eurocéticos, que defendem uma ruptura total, que é uma das mais temidas pelo setor econômico.
Estudo divulgado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) no fim do ano passado ressalta que, qualquer que seja o caminho escolhido, o Brexit terá um custo econômico, a começar pelo fato de que a União Europeia é o maior parceiro comercial do Reino Unido, com 47% das transações globais, à frente dos Estados Unidos, com 18%, e da China, com 4%. Todo o resto do mundo tem 34%. Uma ruptura total poderia causar falta de alimentos, medicamentos e até de energia. Esse custo, de acordo com o estudo, é distribuído de modo desigual nos diferentes setores e regiões. Sair da União Europeia significará a volta das barreiras ao comércio e serviços e a queda da mobilidade de trabalhadores. A União Europeia absorve 56% da produção britânica de automóveis e responde por um quarto dos serviços financeiros. Menos visíveis, mas igualmente importantes, são os investimentos estrangeiros feitos no Reino Unido de olho no mercado único e a possibilidade de recrutar talentos de toda a União Europeia.
O FMI estimou que o impacto do Brexit vai reduzir o PIB britânico entre 2,5% até 8% a longo prazo. Para um país conhecido por prezar a pontualidade, pode-se dizer que o Reino Unido corre contra o tempo.
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