Por
meio do voto, o eleitor fortaleceu legendas tradicionais e restabeleceu a
centralidade dos partidos no regime democrático
Ao
contrário do que ocorreu nas eleições de 2018, em que os partidos foram
hostilizados e muitos candidatos – em especial, Jair Bolsonaro – se
beneficiaram do generalizado sentimento antipolítica, o pleito de 2020 trouxe
um cenário bem menos tumultuado. Por meio do voto, o eleitor não apenas
fortaleceu legendas tradicionais – PSDB, MDB, DEM, PSD e Progressistas foram os
grandes campeões das eleições deste ano –, mas, ao rechaçar engodos populistas
à margem da política, restabeleceu a centralidade dos partidos no funcionamento
do regime democrático.
Houve uma nítida mudança do eleitorado entre 2018 e 2020. Nas eleições presidenciais, venceu o discurso antissistema e antipolítica, com marcado desapreço pelos partidos políticos, como se fossem entidades ultrapassadas e disfuncionais, mais aptas a gerar escândalos de corrupção do que a contribuir para as políticas públicas e a qualidade da representação. Não por acaso, o ganhador das eleições presidenciais de 2018 tinha como um de seus slogans a frase “meu partido é o Brasil”.
O
resultado das urnas de 2020 revelou nova postura em relação à política. A
experiência de quase dois anos de governo Bolsonaro e de vários governos
estaduais sob o mesmo discurso demagógico parece ter levado o eleitor a rever
suas escolhas. Neste ano, os derrotados nas urnas não foram os partidos
tradicionais, mas precisamente as forças e grupos políticos que desejam atuar à
margem dos partidos.
O
pleito de 2020 mostrou a importância de partidos bem estruturados, tanto pela
proximidade e comunicação com o maior número possível de eleitores como pela
capacidade de formular propostas minimamente consistentes. Numa democracia
representativa, não se faz política sem as agremiações partidárias – e é isso o
que Jair Bolsonaro e outros populistas têm ignorado.
Esse
quadro é confirmado, por exemplo, pela dificuldade que o presidente da
República vem enfrentando para criar sua legenda. Depois de um ano do seu
lançamento, o Aliança pelo Brasil conseguiu apenas 10% das assinaturas
necessárias para sua homologação. Sem saber se conseguirá criar seu partido,
Jair Bolsonaro já admitiu a possibilidade de se filiar a outra sigla em março
de 2021. Tem-se, assim, mais uma demonstração de sua incompreensão a respeito
do papel dos partidos em um regime democrático. Para Bolsonaro, que já passou
por oito partidos – PDC, PPR, PPB, PTB, PFL, PP, PSC e PSL –, filiação partidária
parece ser mero requisito burocrático na hora de se candidatar.
A
atitude de desleixo em relação aos partidos causa a Jair Bolsonaro não pequenas
consequências políticas. Além de não ter sido capaz de fundar até agora a sua
legenda – a tarefa exige um mínimo de coordenação e articulação, além de
apoiadores reais, e não meros robôs virtuais –, o presidente da República viu o
bolsonarismo, junto com o lulopetismo, ser derrotado por partidos tradicionais
de centro.
É
evidente, portanto, a mudança do eleitorado em relação à política e aos
partidos. Em 2020, a desconfiança recaiu sobre os demagogos, e o voto premiou
quem tinha experiência e apresentou propostas mais ou menos realistas. Mesmo
assim, há quem queira ignorar as evidências e aumentar a aposta na
desinformação e na confusão.
No
próprio dia das eleições e sem nenhuma prova, o presidente Bolsonaro mais uma
vez difundiu dúvidas sobre o sistema eleitoral. “Como presidente da República,
quero voto impresso já. Eu ganhei em 2018 só porque tinha muito mais votos”,
disse. Como a corroborar que seu único partido é o da confusão, Jair Bolsonaro
fez ainda afirmações caluniosas sobre as eleições nos EUA. “Eu tenho minhas
fontes de informações. (...) Realmente teve muita fraude lá, isso ninguém
discute”, afirmou.
Felizmente, o eleitor parece cada vez mais distante desse falatório do absurdo. O discurso antipolítica e antissistema envelheceu rapidamente, e o resultado das urnas mostrou uma renovada confiança nos partidos, o que é extremamente positivo. As legendas são elementos fundamentais de uma democracia representativa. Não há democracia forte sem partidos fortes.
Ciência
e tecnologia asseguradas em SP – Opinião | O Estado de S. Paulo
O
Estado paulista atende às necessidades econômicas e científicas impostas pela
pandemia
O governo de São Paulo decidiu retirar do projeto do Orçamento de 2021 uma proposta de Desvinculação da Receita Orçamentária nos repasses feitos pelo Tesouro à Fundação de Amparo à Pesquisa (Fapesp), que representaria uma redução de cerca de 30% (R$ 454 milhões) nas suas verbas. Ao lado do presidente da Fapesp, Marco Antonio Zago, o governador João Doria anunciou a retirada, declarando ter sido estabelecida uma “produtiva reunião para somar forças em investimentos na pesquisa, na ciência e na tecnologia”. Zago complementou: “É uma decisão sábia direcionar recursos para o desenvolvimento do Estado de São Paulo com base na ciência e na tecnologia”.
O
caso ilustra os dilemas fiscais gerados pela pandemia e a necessidade de
negociações políticas embasadas em análises técnicas para solucioná-los.
A
medida integrava o plano de ajuste fiscal proposto pelo governo estadual em
agosto para enfrentar a queda de arrecadação e aumento de despesas. Em outubro,
o plano foi aprovado pela Assembleia, após o governo negociar com os deputados
alguns destaques. Um deles foi a retirada do repasse do saldo superavitário das
universidades estaduais, que implicaria um corte de R$ 1 bilhão nessas
instituições. Agora, decidiu-se também pela manutenção da integralidade dos
recursos previstos à Fapesp.
Não
se pode dizer que os cortes propostos pela Secretaria da Fazenda carecessem de
motivações razoáveis. Como justificou à época o líder do governo na Assembleia,
Carlos Pignatari (PSDB), “sob os efeitos econômicos, a queda abrupta das
receitas públicas e a perspectiva de um 2021 difícil com arrecadação em lenta
recuperação e despesas crescentes, o governo racionaliza e realoca recursos do
Orçamento para fazer frente ao déficit previsto de R$ 10,4 bilhões”. Em tempos
de crise, esse esforço de racionalização é indispensável para garantir os
salários de professores, policiais, médicos e outros servidores, além de
programas assistenciais aos mais vulneráveis.
Por
outro lado, não se pode menosprezar as apreensões da comunidade científica em
relação aos prejuízos para uma instituição que há 60 anos é um reputado polo de
eficiência e excelência.
Conforme
a Constituição estadual, o Estado tem de destinar pelo menos 1% de sua receita
tributária à Fapesp. Desse total, o órgão só pode gastar até 5% com custeio. Os
restantes 95% devem ser aplicados em bolsas de estudo e projetos científicos.
Foi justamente essa arquitetura orçamentária que transformou o Estado de São
Paulo no principal motor do desenvolvimento científico e tecnológico do País.
O
financiamento da Fapesp é tanto mais importante em face da condução errática,
para dizer o mínimo, do governo federal em relação à pesquisa e
desenvolvimento. Neste ano, por exemplo, o Ministério da Ciência, Tecnologia e
Inovações excluiu, por razões arbitrárias e ideológicas, as ciências humanas da
lista de prioridades do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq).
A
Fapesp, por sua vez, apesar de todas as dificuldades econômicas, conseguiu
ampliar em 2019 o financiamento de programas estratégicos, destinando R$ 594,4
milhões para as ciências da vida; R$ 413,2 milhões para as ciências exatas e
engenharias; R$ 126 milhões para projetos interdisciplinares; e R$ 123,3
milhões para as ciências humanas e sociais. A fundação também fomentou projetos
de duração de 5 a 10 anos desenvolvidos por universidades públicas em parcerias
com empresas de porte mundial, em pesquisas que envolvem gerenciamento de
reservatórios, produção de petróleo e gás, inteligência artificial e controle
biológico de pragas que afetam a produção agrícola.
A
pandemia provocou um choque brutal nas contas públicas, exigindo medidas
severas de contenção orçamentária, mas também despertou as esperanças de toda a
população na ciência. Ao propor um plano rigoroso de ajuste fiscal e, ao mesmo
tempo, preservar os investimentos em pesquisa e desenvolvimento, o Estado de
São Paulo mostra estar atento às duas demandas.
Marcha reduzida na indústria – Opinião | O Estado de S. Paulo
Produção
industrial perdeu impulso e sustentação em 2021 é uma questão aberta
Turbinada por medidas emergenciais, a indústria saiu do buraco e produziu em outubro 1,4% mais que em fevereiro, último mês antes do grande choque. A produção cresceu 39% ao longo de seis meses de avanço contínuo. Essa taxa foi mais que suficiente para compensar a perda de 27,1% acumulada em março e abril, quando o volume produzido chegou ao nível mais baixo da série. Mas o impulso de recuperação diminui, enquanto o desemprego segue muito alto, as famílias perdem renda e o governo continua sem explicar como será o Orçamento de 2021.
O
crescimento mensal da indústria ficou em 1,1% em outubro, com a taxa recuando
pelo quarto mês consecutivo, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). A produção havia aumentado 8,7% em maio, 9,6% em junho,
8,6% em julho, 3,4% em agosto e 2,8% em setembro. Além disso, a expansão foi
bem menos disseminada. Em setembro, 22 dos 26 ramos pesquisados haviam
produzido mais que no mês anterior. Em outubro, só 15 apresentaram crescimento.
A
maior expansão, 4,7%, ocorreu na indústria de autoveículos, carrocerias e
reboques, brutalmente afetada no primeiro impacto da pandemia. Depois de
crescer 1.075,8% em seis meses, a produção do setor ainda ficou 9,1% abaixo do
nível de fevereiro.
Com
o crescimento de outubro, a produção da indústria superou por 0,3% a de um ano
antes, mas o desempenho de janeiro a outubro foi 6,3% inferior ao de igual
período de 2019. Em 12 meses o total produzido foi 5,6% menor que o do período
imediatamente anterior.
Uma
perspectiva mais ampla facilita uma visão mais clara da crise industrial. O
setor entrou mal em 2020 e a pandemia agravou um quadro já muito ruim. Tendo
conseguido sair do buraco de março-abril, a indústria ainda tem de enfrentar
uma longa recuperação.
Com
o último resultado, a produção da indústria geral ainda foi 14,9% inferior à do
pico alcançado em maio de 2011. A partir daí, com algumas oscilações, a
tendência básica foi de queda. A recessão de 2015-2016 foi um capítulo
especialmente dramático e a recuperação a partir de 2017 nunca foi completa. A
melhora acumulada até 2018 já se perdeu em 2019, no primeiro ano de mandato do
presidente Jair Bolsonaro.
De
novembro do ano passado a fevereiro deste ano a indústria acumulou quatro meses
de produção menor que a de um ano antes. Em março a atividade foi afetada pela
pandemia. Isso alongou até agosto a sequência de meses com desempenho inferior
ao do ano anterior – uma série de dez, entre novembro de 2019 e agosto de 2020.
Em setembro a comparação interanual indicou uma melhora de 3,7%, reduzida em
outubro para 0,3%.
A
notícia mais positiva é a confiança exibida, segundo a Confederação Nacional da
Indústria, por dirigentes dos 30 setores industriais analisados. Essa
confiança, de acordo com a pesquisa, cresceu ligeiramente em novembro. Em um
mês o índice geral passou de 61,8 pontos para 62,9. Os indicadores acima de 50
são positivos.
A
confiança empresarial é um insumo importante para a atividade, mas falta saber
de onde virá demanda suficiente para sustentar o consumo e a produção
industrial. Em setembro havia 13,5 milhões de desempregados, segundo o IBGE. As
contratações de fim de ano geram basicamente empregos sazonais. Além disso, nem
um fim de ano muito mais animado poderia reduzir substancialmente a
desocupação.
O
auxílio emergencial, diminuído de R$ 600 para R$ 300 por mês a partir de
setembro, deve terminar em dezembro. Pelo menos até agora essa é a perspectiva.
Outro fator de complicação é o maior endividamento das famílias, apontado em
pesquisa recente.
Segundo
o Ministério da Economia, o consumo poderá ser parcialmente sustentado, em
2021, com a poupança acumulada por famílias de renda média e média alta na fase
de distanciamento. Além disso, de acordo com a mesma previsão, mais pessoas
estarão empregadas – embora falte dizer de onde virá emprego suficiente para
estimular o gasto familiar. Talvez o governo tenha uma resposta quando descobrir,
enfim, como será seu próximo Orçamento.
Inquérito no STF chega mais perto de Bolsonaro – Opinião | O Globo
Investigações
identificam elos do presidente com ‘gabinete do ódio’, fonte de lucros a
blogueiros aliados
O
inquérito sigiloso aberto no Supremo em abril deste ano, sob relatoria do
ministro Alexandre de Moraes, para investigar o financiamento e a organização
de manifestações antidemocráticas, prestigiadas pelo próprio presidente Jair
Bolsonaro, torna cada vez mais cristalinas as ligações dele e de seus filhos
com a operação de propaganda para desestabilizar o regime pelas redes digitais.
Parte
do inquérito, a que o jornal “O Estado de S.Paulo” teve acesso, confirma que o
material que abastecia os canais de desinformação e propaganda tinha origem no
próprio Palácio do Planalto, onde foi instalado um grupo que coordenava a rede
de milicianos digitais, alcunhado “gabinete do ódio”. O grupo era chefiado por
Tercio Arnaud Tomaz, assessor especial da Presidência, indicado ao pai pelo
vereador Carlos Bolsonaro, o Zero Dois. Tercio repassava à rede vídeos do
presidente.
Ouvidas
mais de 30 pessoas pela PF, o inquérito fecha o cerco em torno do Planalto.
Entre os depoimentos estão os de Carlos — considerado o comandante do “gabinete
do ódio”, com mais de 40 citações —, do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o
Zero Três, e do coronel Mauro Barbosa Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro. Cid
admitiu ter sido “mensageiro” entre o presidente e o “gabinete”, reforçando o
elo de Bolsonaro com o esquema.
Citados
noutros trechos do inquérito, a que O GLOBO teve acesso em setembro, chamaram a
atenção da Procuradoria-Geral da República para os títulos do material
produzido para a milícia digital na pregação por uma intervenção militar. Quase
sempre citam Bolsonaro. O presidente era o personagem central da trama, e as
investigações o aproximam também da operação do esquema, por meio dos filhos e
até do ajudante de ordens. É para onde o inquérito parece apontar.
Uma
passagem que reforça toda a linha de investigação é o momento em que Bolsonaro,
do alto de uma picape, chega para saudar uma manifestação antidemocrática que
transcorria sugestivamente na entrada do Quartel-General do Exército, o Forte
Apache, em Brasília. Em discurso, num tom de pré-golpe, afirma que seus
seguidores não deveriam “negociar” mais nada.
As
investigações detalham ainda como toda a conspiração tornou-se um grande
negócio para os blogueiros aliados. Num período de dez meses, alguns chegaram a
faturar R$ 100 mil por mês pelo crescimento dos acessos. Um dos donos de canais
bolsonaristas no YouTube, Anderson Azevedo Rossi, mudou de vida. Deixou de ser
um técnico de informática em Canela (RS), com salário de R$ 3,5 mil, para
faturar R$ 1,7 milhão entre março de 2019 e maio deste ano.
O
Supremo e a PF, instituições de Estado, se mantêm trabalhando em defesa das
leis e da Constituição, sem depender das flutuações inerentes à política. O
fato de o presidente da República ter mudado de comportamento em junho, com a
prisão do amigo, parceiro e ex-PM Fabrício Queiroz, não significa que os anos
de 2019 e parte de 2020 tenham sido apagados para a Justiça.
Governo não conterá devastação na Amazônia reduzindo a fiscalização – Opinião | O Globo
Bolsonaro
prometeu acabar com a ‘festa’ das multas. Hoje quem faz a festa são grileiros e
garimpeiros ilegais
Dois
dados díspares se entrelaçam nas clareiras da Amazônia como evidência da
inépcia do governo Jair Bolsonaro em garantir a preservação do bioma. Na última
segunda-feira, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou que
o desmatamento na região, entre agosto de 2019 e julho de 2020, aumentou 9,5%
em relação ao período anterior. Em um ano, foram devastados 11.088 quilômetros
quadrados — nove vezes a área do município do Rio de Janeiro —, um recorde
desde 2008.
Ao
mesmo tempo, o número de multas aplicadas no período despencou. Um levantamento
do site de checagem de notícias ambientais Fakebook.eco.br, em parceria com
Observatório do Clima, Greenpeace, ClimaInfo e Agromitômetro, mostrou que o
Ibama emitiu 1.964 autos de infração na Amazônia Legal entre agosto de 2019 e
julho de 2020, 42% a menos do que os 3.403 expedidos entre agosto de 2018 e
julho de 2019. As autuações minguaram sobretudo a partir de maio, quando o
comando das ações de combate ao desmatamento foi transferido às Forças Armadas.
A
queda nas multas é consequência do desmonte dos órgãos ambientais e de sua
estrutura de fiscalização por Bolsonaro e pelo ministro do Meio Ambiente,
Ricardo Salles. É verdade que Bolsonaro nunca fez segredo de sua política
ambiental nociva. Antes mesmo de assumir o governo, prometeu acabar com a
“festa” de multas do Ibama e do ICMBio. Hoje quem faz a festa são madeireiros e
garimpeiros ilegais. Chegou-se ao cúmulo de exonerar servidores que, cumprindo
seu dever, reprimem ações ilegais e queimam equipamentos clandestinos, como
prevê a lei. Uma inversão de valores. É o afrouxamento da legislação que produz
o terreno fértil ao desmatamento.
Não
se pode esperar outra coisa além de mais devastação. O próprio vice-presidente,
Hamilton Mourão, que preside o Conselho da Amazônia, se mostrou resignado com a
alta de 9,5%. Afirmou com certo alívio que o governo previa 20%: “Foi menos
pior. Essa é a realidade. Podia ser pior ainda”. Para quem já disse que o Inpe
só divulgava dados desfavoráveis ao governo, não negar o óbvio é um avanço.
Enquanto
as motosserras estrilam na Amazônia, no burburinho do Planalto já se discute a
substituição de Ricardo Salles no Meio Ambiente (ainda que ele possa permanecer
no governo). O quadro dificilmente mudará, pois Salles apenas segue o roteiro
que lhe dão. Se o governo Bolsonaro quiser realmente conter o desmatamento,
reduzir o estrago para as exportações e a imagem do país no exterior, precisará
trasformar sua política ambiental desastrosa. Precisa fazer nos próximos dois
anos exatamente o oposto do que fez até agora.
1,5 milhão de mortos – Opinião | Folha de S. Paulo
EUA
de Trump e Brasil de Bolsonaro lideram em vítimas; inépcia pode matar mais
Passados
11 meses desde a primeira morte por Covid-19, que nesse período paralisou
países inteiros e nocauteou a economia mundial, os serviços de saúde registram
a perturbadora marca de 1,5 milhão de
vidas tiradas pela pandemia.
Se
a iminente
chegada das vacinas traz a perspectiva de que a marcha
mortífera vá aos poucos arrefecer, o horror provocado pela escalada atual da
doença, com recordes sendo batidos em diversos países, deixa patente que a
situação ainda deve se agravar antes de começar a melhorar.
País
com o maior número de mortes no mundo (280 mil), os Estados Unidos
contabilizaram nesta semana pela primeira vez mais de 3.000 óbitos num único
dia, ao mesmo tempo em que atingiram a quantidade inédita de 100 mil
internações simultâneas.
Na
Europa, acometida por uma segunda onda, a Itália registrou na quarta-feira (2)
993 mortes em 24 horas, ultrapassando a maior marca até então, anotada em
março, na primeira quadra da pandemia.
Já
no Brasil de Jair Bolsonaro, segunda nação em vítimas da doença (176 mil
mortos), os casos fatais voltaram a subir após a desaceleração ocorrida no
início de setembro. Nesta semana, o país voltou a registrar patamares
indecentes próximos de 800/dia.
Não
precisava ser assim. Com tempo para se preparar, um robusto e estruturado
sistema de saúde pública e expertise no combate a epidemias, o Brasil possuía
condições de ser bem-sucedido no enfrentamento do coronavírus. A desdita foi o
vácuo no governo.
O
chefe de Estado portou-se desde o início como o líder dos negacionistas, a
propagar falsidades científicas e mensagens contrárias às imprescindíveis
medidas de proteção e isolamento. Foi omisso quando deveria agir; sabotou
aquilo que lhe competia coordenar.
Após
ter desestimulado todas as formas de prevenção da doença, o presidente
voltou-se contra as vacinas. Impossível não recordar sua estultice
irresponsável ao desautorizar o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, que
apalavrara com o governo de São Paulo a compra de 46 milhões de doses da
farmacêutica chinesa Sinovac.
A
aquisição forneceria uma importante opção a mais ao governo federal, que de
forma temerária apostou todas as suas fichas num único imunizante, produzido
pela Universidade de Oxford-AstraZeneca. Falou mais alto, porém, a
mesquinha rixa política
com o governador João Doria (PSDB), um possível concorrente em
2022.
Como
se o tema não exigisse urgência, a administração federal procrastina a
elaboração de um plano detalhado de imunização.
Enquanto
países se preparam para começar a proteger em breve suas populações, o Brasil
derrapa na obtusidade ideológica e nas disputas políticas que ameaçam deixá-lo
mais uma vez para trás.
Flexível e gradual – Opinião | Folha de S. Paulo
Após
recuo do MEC, universidade deve propor alternativas para aulas presenciais
O Ministério da
Educação errou ao tentar impor, por meio de uma canetada, o
retorno presencial às aulas no sistema federal de ensino superior a partir de
janeiro.
A
decisão definida em portaria nesta semana versava sobre instituições privadas,
universidades e institutos. Após uma enxurrada de protestos, o ministro Milton
Ribeiro anunciou que a revogaria.
As
universidades têm autonomia para definir suas atividades acadêmicas e
administrativas, garantida pela Constituição de 1988 e assegurada pelo marco
legal da educação, a Lei de Diretrizes e Bases.
Ademais,
em razão da pandemia que se arrasta, autoridades locais podem impedir o retorno
de atividades escolares presenciais em sua área de competência —como a própria
portaria reconheceu.
Por
opção ou por descuido, a norma ministerial não levou em conta protocolos
internacionais que têm orientado o retorno presencial às aulas no ensino
superior. Universidades globais de excelência conduziram tal processo de modo
flexível, gradual e acompanhado de regras sanitárias rígidas.
Em
instituições como Yale e Universidade de Michigan, ambas nos EUA, parte dos
alunos foi convidada a voltar às residências estudantis, que ficam dentro do
campus. As aulas, no entanto, seguem remotamente. Os que retornaram podem
comprar marmitas nas instituições, mas não se permitem aglomerações nos antigos
refeitórios.
Para
quem estiver circulando pelos corredores acadêmicos, há testes a cada dois ou
três dias.
A
Universidade de Berkeley, também nos EUA, monitora o novo coronavírus na rede
de esgoto, em sistema desenvolvido pelos cientistas da casa. Já a Universidade
da Carolina do Norte voltou às aulas online depois de um expressivo aumento de
casos de Covid-19.
No
Brasil, a decisão governamental não contemplou gradualismo ou alternativas de
adequação às circunstâncias de cada estabelecimento. Em boa hora o MEC deu um
passo para trás e decidiu ouvir
os dirigentes das instituições, que demandaram ensino remoto
até 2021. Espera-se que do diálogo saia uma posição intermediária.
Ainda falta, dos dois lados, uma proposta flexível, que possa combinar as duas modalidades de aulas por algum tempo —ou mesmo depois de superada a pandemia.
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