A
marcha da insensatez
Se por “excesso de provas”, o Tribunal Superior Eleitoral deixou de condenar a chapa Dilma-Temer acusada de abuso do poder econômico na eleição de 2014, por que o Supremo Tribunal Federal não pode simplesmente mandar às favas a Constituição, permitindo a reeleição de Rodrigo Maia (DEM-RJ)) e de Davi Alcolumbre (DEM-AP) para o comando da Câmara e do Senado?
Em
maio de 2004, o presidente Lula quis expulsar do país Larry Rohter,
correspondente do New York Times, que dissera em reportagem que ele bebia além
de conta. Durante uma tensa reunião no Palácio do Planalto, um assessor de
Lula, com um exemplar da Constituição aberto na mão, apontou o artigo que
impedia a expulsão do jornalista. Lula respondeu de bate pronto:
–
Foda-se a Constituição.
À
época, este blog foi o único meio de comunicação que publicou a história.
Editores-chefes de vários jornais me telefonaram perguntando se a informação
merecia crédito. Respondi que sim e lhes contei mais detalhes. Ela jamais foi
desmentida. Um amigo de Lula me disse que ele mandara o assessor se foder, não
a Constituição. Como não colou, desculpou-se: “Deixa pra lá”.
O
placar no Supremo estava até ontem à noite em 4 votos a favor da recondução de
Maia e Alcolumbre, um só a favor da recondução de Alcolumbre e dois contra.
Votaram a favor Gilmar Mendes, o relator da ação, Dias Toffoli, Alexandre de
Moraes e Ricardo Levandowisk. Só à favor da recondução de Alcolumbre, Kássio
Nunes. Contra, Marco Aurélio Mello e Cármen Lúcia.
Até o próximo dia 14, deverão votar Edson Fachin, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, o presidente do tribunal. Marco Aurélio, em seu voto, foi curto, grosso e acertou no alvo:
“A tese não é, para certos segmentos,
agradável, mas não ocupo, ou melhor, ninguém ocupa, neste tribunal, cadeira
voltada a relações públicas. A reeleição, em si, está na moda, mas não se pode
colocar em plano secundário o parágrafo 4 do artigo 57 da Constituição”.
O
parágrafo 4 do artigo 57 da Constituição afirma: “Cada uma das Casas
reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro
ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas
Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na
eleição imediatamente subsequente”. Mais claro impossível.
O
Supremo usurpa o papel do legislador quando se mete em fazer política e se
afasta do seu que é o de aplicar as leis com correção. Por mais malabarismos
que façam, argumentos delirantes que apresentem e citações que ilustrem seus
raciocínios, os ministros não vão conseguir disfarçar que nesse caso preferiram
de fato despir a toga para exercer um poder que não lhes compete.
Valem-se
– quem sabe? – do que o tribuno Ruy Barbosa, em sessão do Senado no início do
século passado, disse para o colega Pinheiro Machado que se insurgira contra
uma decisão do Supremo:
“Em
todas as organizações, políticas ou judiciais, há sempre uma autoridade extrema
para errar em último lugar. O Supremo Tribunal Federal, não sendo infalível,
pode errar. Mas a alguém deve ficar o direito de errar por último, a alguém
deve ficar o direito de decidir por último, de dizer alguma coisa que deva ser
considerada como erro ou como verdade.”
Sim, o Supremo tem direito a errar por último. Mas não quando o erro é clamoroso e só não o enxerga quem deliberadamente se finge de cego.
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