EDITORIAIS
Equilibrismo com os juros
O Estado de S. Paulo
Maldição para milhões de famílias, a
inflação superou 8% em 12 meses, ameaça romper o teto da meta no fim do ano e
parece ter corroído, finalmente, o otimismo do Banco Central (BC). Ao anunciar a
nova alta dos juros básicos, desta vez para 4,25%, o Comitê de Política
Monetária (Copom) reconheceu: “A persistência da pressão inflacionária
revela-se maior que o esperado”, fato já percebido pelas donas de
casa. Foi o terceiro aumento consecutivo da taxa básica. Nas três ocasiões o
acréscimo foi de 0,75 ponto porcentual. Repetiu-se o degrau, mas a menção a
“choques temporários” sumiu dos parágrafos iniciais da nota emitida depois da
reunião. Também desapareceu a referência a uma normalização “parcial” dos
juros, presente nos dois comunicados.
Mais um ajuste de 0,75 ponto poderá ocorrer na reunião de agosto, segundo o informe. Como sempre, a decisão dependerá, segundo se ressalva, de novas informações. Mas já se aposta, no mercado, numa alta de 1 ponto porcentual. A previsão de 6,25% no fim do ano, indicada pela pesquisa Focus, do BC, pode estar superada. Já se fala em 6,50%.
No cenário do Copom as pressões devem
continuar fortes. A influência das cotações internacionais de produtos básicos
é bem conhecida. Além disso, é lenta a normalização da oferta, a demanda se
mantém e a escassez de chuva favorece a alta das tarifas de eletricidade.
Ainda otimista quanto ao crescimento, o
Copom, formado por diretores do BC, continua apontando uma evolução mais
positiva do que se esperava, “apesar da intensidade da segunda onda da
pandemia”. Mas fatos positivos, até no combate à pandemia, podem resultar em
alta de preços. O texto menciona, entre os fatores de risco, a “resiliência da
demanda”. Se a demanda se mantém, é porque alguma vitalidade permanece na
economia, apesar do enorme desemprego, mas esse detalhe é ignorado.
Além disso, o comitê “segue atento” à
evolução dos preços dos serviços “conforme os efeitos da vacinação sobre a
economia se tornam mais significativos”. Esse é mais um perigo – imunização
seguida de maior demanda de serviços. “Viver é negócio muito perigoso”, diz o
sertanejo logo no começo de Grande Sertão, pronunciando a frase mais
famosa do livro. “Sobreviver é inflacionário”, escreveria Guimarães Rosa se
fosse membro do Copom?
O risco de inflação alta, segundo a nota,
permanece, no curto prazo, “a despeito da recente apreciação do real”. Esse é
um detalhe um tanto curioso. A valorização da moeda nacional é apontada como
fator propício à moderação da alta de preços. Mas o evento oposto, a grande e
persistente alta do dólar, desde o ano passado, nunca foi seriamente explorado,
nos textos do Copom, como fator inflacionário. Muito menos se mencionou a
responsabilidade do governo, especialmente do presidente Jair Bolsonaro, pela
instabilidade cambial no último ano e meio. Essa responsabilidade, no entanto,
sempre foi evidente para quem segue o dia a dia do mercado e o entra e sai dos investimentos
e da moeda americana.
Também as “políticas fiscais de resposta à
pandemia” são mencionadas como possíveis combustíveis da inflação. Essas
políticas foram abandonadas no primeiro trimestre, juntamente com o auxílio
emergencial, e redesenhadas de forma confusa a partir da aprovação do
Orçamento, em abril. No primeiro trimestre a fome se espalhou entre os
brasileiros abandonados e a retomada, embora recebida com festas no mercado
financeiro, foi frágil e acidentada. Em vez de mencionar políticas de resposta
à pandemia, a nota poderia, com maior realismo, apontar o risco, muito mais
tangível, de gastos eleitoreiros para ajudar o candidato Bolsonaro em 2022.
Ressurge no fim da nota a referência a
“choques temporários” sobre os preços. Isso reforça os argumentos a favor da
“normalização” da taxa de juros. Mas a “normalização” continua moderada, porque
o Copom procura manter taxas compatíveis com a retomada econômica. O
equilibrismo continua, enquanto a inflação avança, ameaçando estourar o limite
de tolerância de 5,25%.
Bolsonaro, Lira e as reformas
O Estado de S. Paulo
A desídia do Executivo federal na promoção
das reformas administrativa e tributária não é segredo, tampouco novidade. A
cada dia é mais evidente que o presidente Jair Bolsonaro não deseja nenhuma
reforma. Seu objetivo é a reeleição e nada que possa significar alguma
dificuldade eleitoral contará com o seu apoio.
A falta de compromisso com as reformas por
parte do Palácio do Planalto é lamentável – e diz muito sobre as dificuldades
que o País enfrenta. Governos que não deixam o palanque não enfrentam as causas
dos problemas nacionais, antes tentam se aproveitar desses mesmos problemas
para permanecer no poder.
Há, no entanto, uma situação ainda mais
grave. Não é apenas o presidente Jair Bolsonaro que, com seu manifesto
desinteresse pelo tema, dificulta o andamento das reformas. O presidente da
Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), vale-se da falta de coordenação política
do Palácio do Planalto para inviabilizar qualquer possibilidade de melhoria
legislativa e, no que estiver ao seu alcance, promover o que se pode chamar de
verdadeira agenda antirreforma.
Desde 2016, não se via essa convergência de
Executivo e Legislativo na oposição às reformas. Apesar das evidentes
resistências do Congresso, o governo de Michel Temer foi capaz de promover
reformas importantes, como a trabalhista, a do ensino médio e a PEC do Teto de
Gastos.
A partir de 2019, a equação se inverteu.
Apesar das resistências de Jair Bolsonaro, o Congresso, sob a liderança do deputado
Rodrigo Maia, então presidente da Câmara, foi capaz de aprovar, por exemplo, a
reforma da Previdência. Agora, o interesse público está órfão. O presidente da
República não faz o que lhe cabe e o presidente da Câmara faz apenas o que lhe
interessa. Veja o empenho de Arthur Lira na alteração abrupta da Lei de
Improbidade Administrativa.
A situação é constrangedora e, não raro,
contraditória. Em setembro de 2020, o governo federal apresentou ao Congresso
uma proposta de reforma administrativa. Acanhado e falho, o texto do Executivo
deixou de fora pontos importantes, a começar pelo fato de não alterar o regime
dos atuais servidores. Eram apenas mudanças para o futuro – 30 anos, pelo
menos.
Mesmo com esses defeitos, diante da
importância do tema – é urgente e essencial melhorar o funcionamento da máquina
pública –, a proposta do Executivo foi vista como uma oportunidade para o
Congresso enfrentar o assunto e aprovar, dentro do possível, uma redação final
mais condizente com as necessidades do País.
No entanto, desde a apresentação do texto,
o Palácio do Planalto não mostrou mais nenhum interesse em sua aprovação. A
situação é tão contraditória que até o relator da reforma administrativa na
comissão especial, deputado Arthur Maia (DEM-BA), tem pedido que o presidente
da República dê algum sinal de apoio à proposta feita pelo próprio governo.
“Que ele (Jair Bolsonaro) manifeste
claramente para a base dele aqui no Congresso Nacional que é a favor da
reforma. (...) Quando eu fui relator da reforma da Previdência aqui na Câmara,
o presidente Temer se engajou pessoalmente com toda sua força para que nós
pudéssemos aprovar. Isso foi claramente manifestado. Ele cobrava dos líderes o
empenho, procurava os deputados, pedia o voto”, disse Arthur Maia
ao Estado.
No caso da reforma tributária, o Congresso
trabalhou por mais de um ano na fusão das duas propostas em tramitação: a da
Câmara (formulada pelo economista Bernard Appy) e a do Senado (de autoria do
ex-deputado Luiz Carlos Hauly). Era uma oportunidade histórica de realizar uma
mudança estrutural no sistema tributário do País.
O governo Bolsonaro, no entanto, não se
interessou pelo assunto. Propôs tão somente criar um novo imposto a partir da
união do PIS/Cofins e, sempre que pôde, defendeu a volta da CPMF. Nesse cenário,
o presidente da Câmara extinguiu a comissão da reforma tributária, o que, na
prática, extinguiu as possibilidades de uma mudança mais estrutural dos
tributos.
Eis a nefasta parceria de interesses entre
Jair Bolsonaro e Arthur Lira. Sem as reformas de que precisa, o País vê-se
enredado no retrocesso.
O Lula de sempre
O Estado de S. Paulo
Está em curso uma tentativa de construção
de uma nova imagem do sr. Luiz Inácio Lula da Silva, alheia ao passivo de
corrupção, incompetência e negacionismo que marca a trajetória política do
Partido dos Trabalhadores (PT). O líder petista sabe que sua viabilidade
eleitoral depende, entre outras coisas, de que o seu nome não esteja vinculado
ao governo de Dilma Rousseff.
Esta é a tática: apresentar à população um
novo Lula, supostamente moderado e responsável, a fazer contraponto ao
desgoverno de Jair Bolsonaro. Não é tarefa simples realizar tal metamorfose.
Vale lembrar que a carceragem da Polícia Federal em Curitiba nunca promoveu
qualquer espécie de ressocialização política. O Lula continua o mesmo de
sempre, como ele próprio faz questão de ressaltar.
No dia 17 de junho, com a verve populista
de sempre, o sr. Luiz Inácio Lula da Silva prometeu revogar a EC do Teto de
Gastos. “A quem interessa o teto de gastos? Aos banqueiros? Ao sistema
financeiro? Gasto é quando você investe um dinheiro que não tem retorno. Quando
você dá R$ 1 bilhão para o rico é investimento e quando você dá R$ 300 para o
pobre é gasto?! Nós vamos revogar esse teto de gastos”, escreveu em sua conta
no Twitter.
Em 260 caracteres, o líder petista mostrou
que, para fazer demagogia populista, não tem nenhum pudor de abraçar o
negacionismo econômico e defender o retrocesso.
Resultado de um enorme trabalho de
coordenação política do presidente Michel Temer, a EC do Teto de Gastos veio
precisamente reverter a rota de irresponsabilidade fiscal implementada pelas
administrações petistas – e que tantos males causou à população, com inflação,
desemprego e retração da atividade econômica. Agora, ignorando todo esse esforço,
o sr. Luiz Inácio Lula da Silva anuncia que vai revogar a medida.
O tuíte do líder petista sobre o teto de
gastos é revelador. Ele não apenas não reconhece os erros do seu partido – que
gestaram e produziram a crise econômica que assola o País desde 2014 –, como
prega abertamente o retorno à irresponsabilidade fiscal.
Não há moderação em quem nega os fatos e a
ciência econômica e opta por difundir desinformação. A mensagem do sr. Luiz
Inácio Lula da Silva sobre o teto de gastos traz inequívoca manipulação da
realidade, distorcendo fatos para obter proveito político.
Ao contrário do que disse o líder petista,
o teto de gastos não faz discriminação entre ricos e pobres. Além disso, foi a
limitação das despesas públicas que possibilitou a trajetória, desde o final de
2016, da redução das taxas de inflação e de juros.
É muito fácil vir a público criticar
demagogicamente o ajuste fiscal. Difícil é conseguir reduzir de forma
sustentável, sem truques nem pedaladas, a inflação e a taxa de juros. A
depender do sr. Luiz Inácio Lula da Silva e do PT, essa tarefa não será apenas
difícil, mas impossível. Sem nenhum rubor, o líder petista anuncia que sua
proposta política não tem nenhuma novidade e não contém nenhum aprendizado.
Seguirá cometendo os mesmos erros de sempre.
Logo após o tuíte do líder petista, o
deputado Rodrigo Maia lembrou uma triste realidade sobre a responsabilidade
fiscal do atual governo. “O próprio Paulo Guedes fez pior do que revogar o teto
de gastos: ele descumpriu e desmoralizou o teto em troca da reeleição do
Bolsonaro”, escreveu o ex-presidente da Câmara no Twitter.
Os fatos são evidentes. Luiz Inácio Lula da
Silva e Jair Bolsonaro não querem ajuste fiscal, não querem reformas, não
querem debate público responsável, sem distorções ou negacionismos. O que lhes
importa é a vitória eleitoral.
Não há moderação onde sobeja
irresponsabilidade – a irresponsabilidade de pôr em risco avanços importantes,
alcançados com o esforço e o sacrifício de toda a população, na tentativa de
obter sucesso eleitoral.
Como hábil comunicador que é, o sr. Luiz Inácio Lula da Silva reitera que não aprendeu nada e não mudou nada. Podia anunciar tanta coisa, pedir desculpas por tantos erros. Mas não. Anunciou que vai acabar com o teto de gastos.
‘Jabutis’ elevam custo da venda da
Eletrobras
O Globo
Em plena crise energética, a importância da
privatização da Eletrobras é indiscutível. A forma como o governo a encaminhou,
contudo, gerou problemas desnecessários e resultou numa solução ruim. O projeto
oriundo da Medida Provisória, aprovado na Câmara e ontem no Senado, se
converteu num “Frankenstein” capaz de dificultar a venda da empresa, além de
criar uma intervenção impensada, indevida e indesejável num setor crítico, que
dá margem a toda sorte de contestação na Justiça.
Em vez de incluir a estatal na lista de
empresas passíveis de privatização ou de aproveitar o projeto discutido desde a
gestão Temer, o governo resolveu editar uma MP, sob o pretexto de conferir
agilidade à tramitação. Abriu, assim, uma brecha para que parlamentares
pendurassem nela uma série de adereços — os proverbiais “jabutis” — para
atender a interesses regionais ou políticos. Para garantir a privatização de
vulto, o governo caiu numa armadilha.
O projeto relatado pelo deputado Elmar
Nascimento (DEM-BA) saiu da Câmara cheio de problemas que cabia ao Senado
consertar. O texto exigia que o governo contratasse 6 GW de geração de usinas
térmicas no interior do país, 2GW de pequenas hidrelétricas, além de renovar
por 20 anos os incentivos à geração de 3GW por meio do programa de fontes
alternativas Proinfa.
Ora, a obrigação de instalar termelétricas
afastadas dos centros de consumo encarece a energia, por elevar o custo de
distribuição — só interessa a operadores de gasodutos. Ainda que a situação dos
reservatórios d’água exija atenção a novas fontes energéticas para garantir o
fornecimento, todo investimento em combustíveis fósseis precisa ser discutido à
luz de compromissos ambientais. Também não faz sentido manter incentivo tão
duradouro à eólica ou solar, tendo em vista o barateamento veloz dessas
tecnologias.
Intervenções dessa natureza deveriam estar
a cargo não do Senado, mas da agência reguladora, a Aneel. E deveriam ser
precedidas dos devidos estudos técnicos. Nada disso foi feito. Em vez de
consertar os defeitos da proposta, o relator no Senado, Marcos Rogério
(DEM-RO), contribuiu para agravá-los, elevando para 8 GW o compromisso com a
construção das termelétricas. Fracassou, na votação de ontem, a emenda do
senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) que tentava resgatar um mínimo de bom senso
no essencial.
O texto aprovado cria, além das distorções
no mercado, uma série de desincentivos ao investidor. Obriga a permanência por
dez anos das sedes de subsidiárias da Eletrobras nas cidades onde estão
instaladas. Dá aos funcionários um ano de estabilidade, para que sejam
transferidos a outras estatais. Contempla todo tipo de interesse paroquial — da
isenção de aval dos órgãos ambientais ao linhão entre Manaus e Boa Vista à
prosaica indenização de R$ 260 milhões ao Piauí. Por fim, submete ao absurdo
aval do Senado a indicação da diretoria do Operador Nacional do Sistema (ONS),
organismo de direito privado e missão técnica.
Tamanho grau de intervenção só contribui
para a insegurança jurídica. A Câmara tem até terça-feira para rever as
inclusões do Senado. Em seguida, o presidente Jair Bolsonaro tem a obrigação,
se quiser uma privatização bem-sucedida, de vetar o que afugenta investidores.
Para o governo, melhor que fazer a privatização por meio de MP, teria sido
simplesmente aproveitar o projeto que já tramitava no Congresso.
BC acerta ao dar sinais de buscar a meta de
inflação em 2022
O Globo
O Comitê de Política Monetária (Copom) do
Banco Central (BC) tomou uma decisão acertada na quarta-feira ao elevar a taxa
básica de juros da economia, a Selic, de 3,5% para 4,25%. Além do aumento,
houve uma mudança importante de tom. Na ata da reunião, os diretores do BC
apontaram a possibilidade de um novo aumento de 0,75 ponto percentual na
próxima reunião, em agosto. Avisaram ainda que, caso necessário, haverá uma
elevação “mais tempestiva”. Isso provavelmente significa um salto de 1 ponto ou
até antecipação da decisão se a inflação persistir.
Foi uma mudança considerável em relação aos
dois encontros anteriores do Copom, quando foi usada a expressão “normalização
parcial” da política monetária, interpretada no mercado como estratégia para
estimular a economia de modo mais leniente com a alta de preços.
Na ata desta semana, a mensagem foi que o
BC pretende retirar o estímulo até o fim de 2021. Traduzindo todos os números e
declarações, o Copom promete não jogar a toalha na missão de atingir a meta de
inflação em 2022, definida em 3,5%.
Palavras, assim como a alteração da taxa de
juros, são cruciais na manutenção da credibilidade da política monetária.
Talvez o exemplo mais marcante do poder das declarações tenha sido o italiano
Mario Draghi quando comandava o Banco Central Europeu (BCE). Nos dias
frenéticos de julho de 2012, com o euro à beira do abismo, Draghi declarou que
“faria o que fosse necessário” para salvá-lo. Sua frase acalmou os ânimos do
mercado financeiro e reduziu o ataque especulativo que se armava contra a
moeda.
O Copom não usou uma expressão tão forte,
nem a situação brasileira é minimamente comparável à da Europa dez anos atrás,
mas a ideia é a mesma: controlar as expectativas para evitar o pior. Neste ano,
é dado como certo que o IPCA, índice de preços ao consumidor, ficará não só
acima da meta de 3,75%, como ultrapassará o teto da banda, de 5,25%. A inflação
bateu em 8,06% nos últimos 12 meses, e a previsão mais recente dos analistas
das principais instituições financeiras coloca o IPCA em 5,82% ao final de
2021.
Existe uma defasagem entre o aumento dos
juros e os efeitos na economia. Faltando seis meses para o fim do ano, agora
não há muito que se possa fazer. Todos os olhos já estão, portanto, voltados
para 2022.
Chegar aos 3,5% previstos para o ano que
vem é factível, mas a meta demandará mais atenção do BC. Nesta semana, um novo
fator externo apareceu no radar. O Federal Reserve (Fed), o banco central
americano, sugeriu que poderá haver duas altas de juros até o fim de 2023.
Anteriormente, a previsão era não mexer na taxa até 2024. Uma eventual nova
antecipação, desta vez para 2022, possibilidade que não pode ser descartada,
complicaria o cenário externo para as autoridades monetárias brasileiras com
uma provável alta do dólar e nova pressão na inflação e nos juros.
Às pressas
Folha de S. Paulo
Nova Lei de Improbidade gera desconfiança,
mas contém avanço e pode ser ajustada
Promulgada em 1992, na esteira dos
escândalos que levaram o governo Fernando Collor ao fim, a Lei de Improbidade
Administrativa sempre foi uma espécie de atalho no enfrentamento da corrupção.
Ao abrir caminho para ações na área cível
contra autoridades que praticassem desvios, ela permitiu que o Ministério
Público alcançasse em toda parte políticos que se livravam de punição na esfera
penal em instâncias superiores onde tinham direito a foro especial.
A lei ampliou poderes conferidos a
promotores e procuradores após a redemocratização do país e contornou
limitações da área penal, criando novo mecanismo de controle para afastar do
palco mandatários desonestos e fazê-los pagar por danos causados ao erário.
Com o tempo, entretanto, as imperfeições da
lei tornaram-se evidentes. Ao definir de forma muito genérica as condutas que
poderiam ser objeto de ações, ela acabou servindo para justificar medidas
arbitrárias e criou insegurança na administração pública.
Na quarta-feira (16), a Câmara dos
Deputados aprovou projeto de lei que introduz modificações
profundas na legislação, redefinindo seu alcance, as punições previstas e
limites para o Ministério Público.
A principal mudança restringe as ações de
improbidade a casos em que for possível demonstrar que havia intenção clara de
lesar os cofres públicos, definindo com maior precisão os atos administrativos
que deveriam ser coibidos.
A ideia é evitar que erros corriqueiros
sejam tratados com o rigor imposto a casos graves de corrupção e enriquecimento
ilícito, mas representantes do Ministério Público viram na mudança uma brecha
que poderá ser explorada por políticos inescrupulosos.
Embora o projeto viesse sendo debatido há
três anos na Câmara, muitas inovações foram incluídas às pressas, sem maiores
discussões, depois que o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), impôs regime
de urgência à votação.
Ele mesmo condenado duas vezes com base na
lei, em processos que se arrastam na Justiça de Alagoas sem desfecho, Lira
conspurcou os esforços feitos para modernizar a lei, criando a impressão de que
agia em causa própria.
Punições previstas para algumas infrações
foram até agravadas, incluindo, para casos de enriquecimento ilícito e atos que
impliquem prejuízo ao erário, a proibição de ocupar cargos por até 14 anos. Mas
o projeto da Câmara deixou de fixar penas mínimas, o que pode levar a punições
muito brandas.
Caberá agora ao Senado examinar o texto e
corrigir equívocos. O essencial é modernizar a lei para que ela ajude a conter
desvios sem estimular voluntarismos nem emperrar a administração pública.
Debelar a inflação
Folha de S. Paulo
BC indica mais juros, medida amarga mas necessária
para evitar dano social maior
Em decisão esperada, o Banco Central elevou mais
uma vez a taxa básica de juros, desta vez de 3,5% para 4,25% ao ano.
A medida decorre de pressões inflacionárias persistentes, iniciadas no atacado,
com o choque cambial do ano passado, e que agora chegam com força aos índices
de preços ao consumidor.
A novidade do comunicado do Comitê de
Política Monetária foi o abandono da premissa que se vinha adotando desde a
primeira elevação dos juros em março —a de que seria necessário apenas um
ajuste parcial, não uma remoção completa dos estímulos.
Na prática, isso significa que o BC espera
subir a Selic até pelo menos o chamado nível neutro, aquele que deixa de
estimular o crescimento do Produto Interno Bruto. Esse patamar não é observável
diretamente, mas as estimativas mais comuns sugerem algo próximo a 6,5% ao ano.
O tom geral do comunicado é de mais confiança
na retomada da economia, de um lado, mas de maior preocupação com a inflação,
de outro. O repasse dos preços de matérias-primas para bens industriais tem se
mostrado forte, e surgem no horizonte novas pressões.
Uma delas é a perspectiva de alta adicional
da tarifa de energia, em razão do agravamento da crise hídrica. No segundo
semestre, além disso, a provável reabertura de atividades com o avanço da
vacinação pode abrir espaço para uma recomposição dos preços dos serviços, hoje
defasados.
Tudo somado, as projeções para o IPCA neste
ano já se situam em torno de 6%, muito acima da meta oficial de 3,75%.
O quadro é delicado também por causa dos
riscos de inflação na economia internacional, embora em escala menor que no
Brasil. Não por acaso, o banco central americano indicou na quarta-feira (16)
que pretende
subir os juros mais cedo do que o esperado até então.
O aperto monetário no Brasil é amargo, mas
necessário no contexto de hoje para evitar danos maiores —que afetam sobretudo
o poder de compra da população mais pobre. Um efeito visível das ações do BC já
se mostra na cotação do real, que tem se recuperado, algo importante hoje para
afastar o risco de novos choques de custos.
Qualquer perspectiva mais positiva, contudo, depende de continuidade da retomada com o avanço da vacinação, que é provável a despeito do negacionismo do Planalto, e de maior confiança na gestão das contas públicas.
BC amplia dose, e talvez ritmo, do aperto
monetário
Valor Econômico
Aperto monetário piora a situação do
desemprego, que já é crítica
O Banco Central aumentará a dose dos juros
para enfrentar uma inflação que já ultrapassou o limite de tolerância em 2021 e
começa a fugir da meta para o ano que vem, ao mesmo tempo que deixou em aberto
a possibilidade de acelerar o ritmo da alta, se uma “atuação mais tempestiva”
se revelar necessária no futuro. O Comitê de Política Monetária elevou a taxa
Selic a 4,25%, prometeu outra alta de 0,75 ponto percentual para a próxima
reunião, sem descartar que o ajuste possa ser maior.
Os fatores que pressionam a inflação se
alinharam de uma forma em que tornou-se inadequada a manutenção da
“normalização parcial” dos juros, deixando algum espaço para continuidade do
estímulo monetário. Os riscos existentes para uma elevação da inflação se
mantiveram e novos surgiram, como a “deterioração do cenário hídrico”, que
resultará em pressão adicional sobre as tarifas de energia.
Uma comparação entre os comunicados da
recente reunião e a anterior explicita diferenças relevantes da análise do
balanço de riscos. Esmaeceu a confiança no diagnóstico de que “os choques
atuais são temporários”. A frase saiu do comunicado para aparecer, mais discreta,
no momento em que o Copom justifica a necessidade de elevação mais forte dos
juros para “mitigar os atuais choques temporários” sobre a inflação.
Por outro lado, dissipou-se a “incerteza
acima do usual” sobre o ritmo de crescimento da economia. Em seu lugar, entram
revisões relevantes (para cima) nas projeções de crescimento e redução
significativa dos riscos para a recuperação.
No cenário básico para a inflação, o Copom
não mais avalia que o processo de recuperação da economia poderá ser mais
lento. Na verdade, a possibilidade de redução da inflação repousa
solitariamente na reversão da alta do ciclo das commodities, auxiliada pela
apreciação recente e de continuidade não assegurada do real ante o dólar. O
risco fiscal, “apesar da melhora recente nos indicadores de sustentabilidade da
dívida pública” continua provocando “assimetria altista” no balanço de riscos,
podendo elevar a inflação acima dos níveis projetados no horizonte relevante da
política monetária, que começa a adentrar 2023.
Por outro lado, avolumaram-se os riscos de
que a inflação fuja da meta de 2022. Alguns deles preocupam outros bancos
centrais, como o Fed. Há problemas para a normalização da oferta, desnivelada
pela pandemia, que desorganizou as cadeias de produção globais. No caso brasileiro,
há o agravante de que, pelas desconfianças sobre a sustentabilidade fiscal,
houve um duplo choque de forte valorização das commodities e megadesvalorização
cambial. A alta dos alimentos deixou de ser uma preocupação para o Copom que
indica que “a persistência da pressão inflacionária revela-se maior que o
esperado, sobretudo entre os bens industriais”.
O BC e os analistas tinham dúvidas sobre a
sustentação da demanda após o fim do auxílio emergencial no primeiro trimestre.
A recuperação foi melhor que a esperada nesse período, assim como ocorreu com a
redução do nível de atividades em consequência da segunda onda da pandemia no
início do atual trimestre. E, se a regularização da oferta pode trazer algum
alívio aos preços, a recuperação dos serviços, com a aceleração da imunização
contra a covid-19, promete elevar os preços do setor.
O resultado desse conjunto é que o sinal de
riscos crescentes inflacionários foi dado de forma inequívoca pelo fato de as
“medidas de inflação subjacente apresentam-se acima do intervalo compatível com
o cumprimento da meta para a inflação”. A “normalização parcial” teve que sair
de cena e o BC entrou em modo de alerta ao admitir que “uma deterioração das
expectativas de inflação para o horizonte relevante pode exigir uma redução
mais tempestiva dos estímulos monetários”, ou seja, alta maior que 0,75 ponto,
por si uma cadência rápida ante os ajustes do passado recente da taxa Selic.
Em tese, a tarefa mais fácil é a de elevar
os juros - os exageros para cima são muito mais comuns do que os para baixo. No
entanto, há limites para seus efeitos. Com uma inflação com forte componente de
custos - e nenhuma pressão dos salários - juros mais altos tem pouco efeito
sobre eles, mas efeitos certos sobre o nível da atividade. Aperto monetário
piora a situação do desemprego, que já é crítica e indicava uma recuperação
muito lenta. A dosagem é essencial para evitar abortar uma trajetória de
crescimento futura que não é brilhante e impedir o aumento da oferta de
empregos, um dos objetivos secundários do BC, agora independente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário