Folha de S. Paulo
Partido é contra ditaduras; desde que sejam
de direita
Enquanto Lula
era recebido com honras pelos líderes das principais democracias
europeias, Bolsonaro
fazia um tour por ditaduras árabes. O contraste traz saudades da
projeção internacional que já tivemos e que perdemos com o desastre
bolsonarista.
Mas ele não nos deve cegar para o outro
lado, menos vistoso, da política internacional de Lula e do PT:
o apoio reiterado a ditaduras de esquerda, bem como a governos populistas que
empurram seus países nessa direção.
Há duas semanas tivemos a nota de celebração à vitória de Daniel Ortega na Nicarágua em eleições fraudulentas. Para o PT, tratou-se de "uma grande manifestação popular e democrática", ecoando, aliás, o apoio às eleições de fachada na Venezuela em 2020. A nota foi deletada posteriormente, mas nenhuma mudança de postura veio.
Não é caso isolado. A cada nova fala sobre
política internacional, o problema reaparece. Em agosto, em entrevista a um
canal mexicano, Lula se restringira a dar um "conselho" a Ortega: não
abrir mão da democracia. Dar esse conselho a um ditador que vem há anos
destruindo a liberdade de imprensa e que chegou mesmo a prender seus
adversários políticos é o mesmo que recomendar a Bolsonaro, em 2021, que não
faça rachadinha.
Em entrevista ao El País da Espanha, no
sábado, Lula se mostrou ainda mais receptivo ao governo Ortega: "Por que
Angela Merkel pode ficar 16 anos no poder, e Daniel Ortega não?",
ignorando que a Alemanha tem liberdade de imprensa e eleições limpas.
Na mesma entrevista, falou de Cuba. Lula evita
elogiar diretamente aquela que é a pior ditadura das Américas na atualidade,
mas reproduziu o discurso do próprio regime: os males da ilha, incluindo a
falta de democracia, devem-se ao embargo americano. Nada sobre a
responsabilidade do governo cubano e de seus aliados.
Nesta segunda (22) foi
a vez de Dilma, que louvou o Estado totalitário chinês. "A China
representa uma luz nessa situação de absoluta decadência e escuridão que é
atravessada pelas sociedades ocidentais", disse ela no evento de
lançamento de um livro. É, temos um padrão.
O PT é contra ditaduras; desde que sejam de
direita. Se forem de esquerda, o máximo de dureza serão reticências discretas,
quando não afagos. Esse alinhamento não é inofensivo. A degeneração das
instituições democráticas promovida em nome de um discurso de esquerda é um
caminho perfeitamente possível em nosso contexto. Aconteceu na Venezuela,
acontece na Nicarágua e na Argentina. E pode acontecer aqui.
Não haveria nada mais simples do que se
colocar clara e inequivocamente contra ditaduras: "Democracia é um valor
inegociável, e mesmo o bem-estar social e combate à pobreza ocorrem melhor em
um ambiente democrático e com liberdade de imprensa. Ortega, Maduro e
Diaz-Canel têm que deixar o poder". É o que faz Mujica no Uruguai. Uma
fala simples dessas, aliás, já lhe traria ganhos com a opinião pública, que não
nutre mais as miragens socialistas da Guerra Fria. O fato de não se posicionar
dessa maneira é sinal de que uma parcela importante de sua base de apoio
acredita justamente nesse caminho e provavelmente espera voltar a cooperar com
os piores regimes do continente, e quem sabe repetir sua receita aqui. O
controle social da mídia é um passo nessa direção.
Lula busca eleitores moderados e nos fazer
sonhar com um Brasil respeitado mundialmente. Continua, contudo, a cultivar
laços com os piores regimes do nosso continente e do mundo. Dá para acreditar
em seu compromisso com a democracia?
Um comentário:
pela primeira vez concordo com o joel.
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