O Globo
O investimento para implantar o 5G não deve
aumentar muito as inversões do setor de telecom, mas em compensação estarão
abertas as possibilidades para os investimentos dos setores em geral. A
manufatura 4.0, a telemedicina, a agricultura conectada, as cidades
inteligentes, as construções inteligentes. Muitos projetos passam a ser
possíveis. Antes, contudo, há um pedregoso caminho para as operadoras.
Marcos Ferrari, presidente-executivo da Conexis, entidade que reúne as empresas de telecom, diz que será instalada a estrada, mas tudo dependerá da forma como ela será usada:
— A grande mudança do 5G é essa, é mudar a
maneira pela qual a sociedade se organiza do ponto de vista social e econômico.
Claro que vai estimular o investimento em outros setores. A gente monta a
rodovia, o consumidor vai usar a rodovia via celular, mas os setores é que
decidirão como farão a sua transição. Tudo depende de como a indústria, o
comércio, os serviços, a agricultura, a saúde, a educação vão adotar o 5G.
A nova tecnologia foi atrasada pelos
adiamentos do leilão, mas a implantação da nova via rápida de transmissão de
dados poderá induzir investimentos, apesar de o país estar vivendo uma
conjuntura econômica e política das mais hostis. O ano que vem será de
estagnação, inflação alta, juros subindo e aumento da incerteza fiscal.
Contudo, o 5G pode ser uma força motriz de investimento nos próximos anos, e
não apenas neste difícil 2022.
O que foi leiloado este ano começará a ser
implantado no ano que vem. Mas haverá barreiras tecnológicas, logísticas,
regulatórias. Primeiro, será necessário “limpar” a faixa de 3,5 GHz, o que
significa contatar os 20 milhões de brasileiros, nas áreas rurais ou
periféricas das cidades, que usam as antenas parabólicas e trocar essas
antenas. É na mesma faixa das parabólicas que será instalada a internet de alta
velocidade. Depois ainda será preciso esperar que as cidades tenham leis
atualizadas para as antenas, que agora são pequenas, e não aquelas enormes para
as quais criou-se a regulação vigente.
— A Lei Geral de Antenas foi aprovada em
2015, no governo Dilma, e regulamentada no ano passado. As leis municipais
tinham que se adequar a ela, mas 95% das cidades não o fizeram. Vinte capitais,
por exemplo, não têm, inclusive São Paulo. Então as empresas têm que seguir a
ordem da Anatel e obedecer aos prazos de instalação, mas não podem desrespeitar
as leis municipais que são ainda velhas. Eu tenho que escolher se vou ser
multado pela Anatel ou pelos municípios. Como Porto Alegre já fez sua mudança
na lei, a cidade pode ter uma internet muito melhor do que São Paulo, por
exemplo — disse Ferrari.
A explicação da Conexis para o fato de que
o investimento global do setor não deve subir muito, apesar da entrada na nova
fronteira tecnológica, é que haverá, ao mesmo tempo, um investimento crescente
no 5G, e uma queda do que está sendo aportado em 4G:
— Do ponto de vista econômico, o 4G está no
auge da receita. É nesse momento que começará a entrar o 5G. Haverá uma migração
gradual de um para o outro, e a Anatel prevê o fim desse processo em 2029. O
setor de telecom é capital intensivo. Investimos em média R$ 32 bilhões por
ano. O que vai acontecer a partir do ano que vem? Provavelmente vai mudar a
composição do investimento, porque naturalmente o que for destinado ao 4G vai
cair, e o do 5G vai subir.
Do ponto de vista do consumidor há uma
barreira econômica. Hoje o dispositivo para usar o sinal 5G é muito caro. Teria
que haver a troca dos atuais smartphones pelos novos aparelhos. Portanto, o
serviço é excludente. Mas ao longo dos próximos anos o custo certamente vai
cair muito, pelo aumento da produção.
Quem venceu a concorrência pelos 26 GHz
terá que aportar dinheiro para conectar as escolas. Mas ainda não está claro
como e quem vai pagar pelo uso dessa internet na sala de aula. As operadoras
dizem que têm que levar o 5G até a porta das escolas, por isso vai ter a
infraestrutura, mas quem vai pagar pelo serviço, ainda não se sabe. Uma ideia
sem dúvida seria o velho Fundo de Universalização dos Serviços de
Telecomunicação (Fust). Arrecadou R$ 26 bilhões desde a privatização, ou R$ 40
bilhões, ao preço de hoje, uma vez e meia o capex (investimento) anual das
empresas de telecom no Brasil, e nunca foi usado para o fim pela qual foi
criado.
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