Folha de S. Paulo
Nos mandamentos do coach, terceiro lugar
equivale ao último
Pablo Marçal não chegou a sentar na cadeira de prefeito antes da apuração dos votos —como Fernando Henrique Cardoso fez na disputa com Jânio Quadros, em 1985—, mas estava certo da vitória. Iria para o segundo turno, com chances totais de derrotar o adversário, fosse Guilherme Boulos ou Ricardo Nunes.
Incrivelmente levado a sério por alguns segmentos da sociedade e do eleitorado, Marçal seria o Midas da prosperidade, o Milei brasileiro, o novo líder da direita, o futuro presidente da República. O candidato que, de tão descontraído e confiante, apareceu em cima da hora para votar, e descalço.
O autoengano começou a se revelar com a abertura das urnas. Depois de avacalhar os debates e perpetrar uma enfiada de irregularidades na campanha, o coach com milhões de seguidores nas redes não chegou ao segundo turno, derrotado por Boulos, representante da esquerda, e Nunes, apoiado pelo governador Tarcísio de Freitas e rejeitado por parte do bolsonarismo e pelo próprio Bolsonaro (este levou uma surra no Rio).
O meteoro não atingiu o objetivo de destruir a democracia. Na galeria dos trapaceiros que se vendem como antissistema, Marçal foi o mais ligado de todos ao sistema, na transgressão das leis e no comportamento criminoso.
Às vésperas do pleito, a tentativa de bala de prata saiu pela culatra. O laudo
grosseiramente fraudado, que associava Boulos ao uso de cocaína, é uma peça de
baixaria para entrar nos anais do folclore político. A filha do médico afirmou
que a assinatura do pai que está no documento é falsa mostrando a verdadeira
tatuada na costela. Nem os mais delirantes roteiristas da série "Law &
Order" poderiam imaginar uma cena igual.
Apesar do decepcionante terceiro lugar —que nos mandamentos do coach equivale ao último—, não se pode garantir que a aventura política de Marçal acabou. Está, digamos, congelada, como aqueles bilionários que acreditam na criogenia e aguardam o momento de serem religados. O influencer insistirá no golpe. Mas tudo ficará muito mais difícil após a comprovação de seus crimes. De tanto seguir os passos do capitão, ele está perto de tornar-se inelegível.
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