O Povo (CE)
Precisamos falar da socióloga Rosângela Lula
da Silva, popularmente identificada como Janja, que vem a ser a mulher do atual
presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e que assumiu protagonismo
no cenário político dos últimos dias, "acusada" por gente da própria
base de estragar os efeitos positivos de uma viagem do marido à China marcada
por anúncios de investimentos e acertos bilionários para o Brasil. O que fez
ela então, para carregar tal peso?
Antes de chegar ao episódio específico é preciso discutir o que tem representado a entrada de Janja na vida de Lula, em relação às suas consequências políticas. Há uma diferença abissal entre o comportamento dela e o da antiga cônjuge do petista, Marisa Letícia, esta sempre apontada como fundamental à trajetória dele pelo papel de dona de casa que cumpriu exemplarmente até quase à morte, que aconteceu em 2017. Diz-se, inclusive, que sem ela teria sido mais difícil até criar o PT diante do suporte que oferecia, de sua posição doméstica, para os encontros e reuniões do grupo precursor que tinha Lula como ponto central.
De certa forma, o PT acostumara-se com o
estilo Marisa. O que ajuda a justificar, talvez, o incômodo evidente que tem
sido para muitos dos que convivem há mais tempo com Lula se adaptar à forma
Janja de ser, mais presente às questões políticas, mais ativa, com opinião e
disposta a colocá-la na mesa sempre que entender necessário. Quem não lembra,
confirmada pelo próprio presidente, a história de que a voz mais firme na
resistência à ideia de decretar uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem) em meio ao
conturbado 8 de janeiro de 2023 era a de sua mulher, contrapondo-se a
posicionamentos importantes no grupo que indicavam aquele caminho como mais
adequado? Para muitos, isso pode ter salvado o governo.
Janja não é Marisa nem faz qualquer esforço
para gerar comparação do tipo. Pode-se dizer, na perspectiva do governo, o que
em geral se confunde com o que é de interesse do PT, que melhor seria se ela
fosse igualmente discreta, aparecesse menos ao lado do marido, que se anulasse
em nome do que representa hoje. Só que a opção pessoal tem sido outra e isso
precisa ser tão respeitado quanto era o distanciamento das tensões políticas
que demarcava a preferência clara da primeira dama que estava ao lado de Lula nos
seus governos anteriores. Considere-se, inclusive, a trajetória de militante
que levou Janja ao encontro do político que hoje é seu marido.
Sobre a questão na China, voltando a ela,
consta que até ministro que integrava a comitiva brasileira sentiu-se
incomodado com o fato de Janja haver pedido a palavra, durante jantar com o
líder Xi Jiping, para reforçar argumentos do presidente brasileiro acerca dos
efeitos do mau uso do Tik Tok, uma rede social de origem chinesa, especialmente
sobre crianças e mulheres em nosso país. Convenhamos, se realmente algo
estabelecido neste limite, coisa pequena demais para justificar a ação de
alguém, que, a partir de contatos com jornalistas feitos ainda de lá, a
transformasse numa espécie de síntese noticiosa de uma visita marcada por
resultados expressivos para a nossa economia e o próprio governo.
Lula, pode-se dizer, adota um comportamento
correto nas situações em que vê sua mulher inserida no contexto de polêmicas
políticas. Sua opção tem sido por defendê-la sempre, como fez no caso recente
chinês, afirmando que ela tem direito a falar, entende mais de redes sociais do
que ele e "não é uma cidadã de segunda classe".
É o que qualquer companheira espera de um companheiro, claro, restando entender se na intimidade do lar, olho no olho, dá-se uma conversa sobre os momentos em que ficar quieta também funciona como uma forma de ajudar o marido a governar. É certo que Janja perdeu algumas oportunidades nesse sentido em quase dois anos e cinco meses do governo atual e nem estou falando deste caso recente da China, que entendo supervalorizado. Uma crise meio artificial que, de alguma forma, involuntariamente o comportamento dela ajuda a alimentar, o que acaba sendo uma vantagem do estilo Marisa na comparação entre as duas. Até porque, admita-se, as crises e os desafios reais e concretos já são suficientes para manter Lula e os seus ocupados. Preocupados talvez seja o termo mais correto.
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