Valor Econômico
Presidente da Câmara não foi o condutor das
negociações, ou não aparece como tal; papel de Arthur Lira foi fundamental
As versões sobre o acordo que fez a tropa de
choque baixar a guarda e a Câmara e o Senado retomarem seus trabalhos mudaram a
cada três horas, em média, na quinta-feira (7) pelos corredores do Congresso,
mas convergem em dois pontos: o ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) teve
um papel central e um confronto do Congresso com o Judiciário se aproxima. A PEC do foro privilegiado ganhará protagonismo.
A PEC do foro privilegiado poderá ser vendida para o público externo como o fim de privilégios, a igualdade de todos perante a lei, com ônus de detentores ou ex-detentores de mandatos eletivos serem julgados por instâncias inferiores do Judiciário e o bônus de contar com a múltipla jurisdição. Mas essa embalagem é fina e relativamente transparente: o objetivo real será a blindagem total de deputados e senadores.
Alguma forma será
encontrada por parlamentares do Centrão para garantir que processos contra
congressistas só avancem se contarem com a anuência prévia da Câmara ou do
Senado. Seria
a restauração do espírito da imunidade parlamentar plena que havia antes de
2001. Na ocasião, este benefício foi restringido às opiniões, palavras e votos.
A ideia agora será a proteção total, não
contra iniciativas do ministro Alexandre
de Moraes. O alvo, ao que tudo indica, são processos que
tramitam em outro gabinete do STF, o do ministro Flávio Dino, que conduz
investigações acerca da persistência do chamado orçamento secreto e que já
produziu operações policias contra pelo menos quatro deputados federais,
acusados de corretagem de emendas.
A anistia a Bolsonaro, inicialmente, entraria em pauta
depois de tudo aprovado, para ser negociada em outros temas. Na projeção das
lideranças bolsonaristas, o Supremo perderia um poder coercitivo sobre
deputados e senadores que momentaneamente constrange o Congresso a aceitar uma
intervenção tão drástica no funcionamento do Judiciário como seria a anistia
aos investigados por golpismo.
E onde entra Lira nessa história? As conversas que
levaram ao destravamento do Congresso deram-se no gabinete dele, segundo
divulgou a colunista Malu Gaspar, de “O Globo”. O líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ),
disse na quinta que o acordo foi costurado com os líderes partidários, e não
com o presidente da Casa, e Hugo
Motta em entrevista afirmou que pautará a anistia se essa
for a decisão do Colégio de Líderes, na próxima semana.
Motta não foi o condutor do processo, ou não
aparece como tal, o que prenuncia um cenário em que sua eventual reeleição como
presidente da Câmara em 2027 parece improvável.
Em entrevista ao portal Metrópoles, o
presidente da Câmara respondeu do seguinte modo ao ser perguntado sobre o foro
privilegiado: “Tem um sentimento de incômodo tanto dentro da Câmara quanto no
Senado com algumas decisões que são tomadas no Supremo Tribunal Federal. Isso é
um sentimento dentro da Casa, muitas vezes de invasão de algumas prerrogativas,
de interferência do Judiciário no poder Legislativo”. E concluiu: “Às vezes
pautas que são anti-Supremo, anti-Poder Judiciário, acabam tendo solidariedade recíproca.”
Essa é a expressão chave: solidariedade recíproca.
Entre que partes? Obviamente, de um lado, o bolsonarismo e, do outro, o que
Motta chamou de “sentimento” do Congresso. Solidariedade recíproca contra o
protagonismo do Supremo.
Caso este acordo prospere, representará uma guinada importante para o bolsonarismo, que para chegar aonde chegou se apoiou nos ombros da Lava-Jato na década passada. Já faz bastante tempo, mas é bom lembrar que Eduardo Bolsonaro em 2016 foi um dos mais estridentes apoiadores das “dez medidas contra a corrupção”, projeto de iniciativa popular que nasceu no Ministério Público Federal, e que por obra e graça do Congresso de então se transformou em um substitutivo que anistiava o uso de caixa dois em campanhas eleitorais. Uma liminar do ministro Luiz Fux, pedida por Eduardo, determinou que a tramitação da proposta voltasse para o zero. Está parado na Câmara desde o início da legislatura.
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