A Europa e o FMI estão impondo à Grécia muito mais do que qualquer país pode suportar
O tucano José Serra costuma dizer que o jornalismo brasileiro contemporâneo é como a Grécia: só tem colunas e ruínas.
O leitor dirá se a avaliação do jornalismo é ou não correta. A da Grécia deixou de ser: o país hoje está resumido apenas a ruínas, econômicas, políticas e, principalmente, sociais.
E mais ruínas virão ante a evidência de que o programa aplicado à Grécia "tem sido um fracasso sem paliativos", no dizer de um colunista liberal como Wolfgang Münchau ("Financial Times"), evidência que, segundo ele, começa, a invadir a mente dos políticos em "algumas capitais do Norte da Europa" (leia-se: Alemanha, Holanda, Finlândia).
Invadiu pelo menos a cabeça de Peter Bofinger, um dos membros do Conselho Alemão de Especialistas em Economia -chamados de "Os Cinco Sábios"-, órgão independente que assessora o governo em política econômica. Em entrevista a Carolina Vila-Nova, Peter Bofinger "defende o indefensável hoje na Alemanha: mais dinheiro, mais tempo e menos austeridade à Grécia", como escreveu essa excelente jornalista,
Diz Bofinger: "Qualquer engenheiro sabe que uma ponte suporta um limite de peso. Esses limites também têm de ser respeitados em política econômica". Elementar. Inacreditável é que a União Europeia desconheça completamente uma verdade tão básica e force a Grécia a amontoar ruínas sobre ruínas.
Será que nenhum dirigente europeu parou para pensar nos efeitos nefastos dos três anos de austeridade impostos à Grécia? Nefastos não apenas socialmente, coisa que pouco interessa ao resto da Europa, mas também do ponto de vista da correção dos problemas que se supõe que a austeridade deveria enfrentar.
Basta ler o blog da economista Karine Berger: "A dívida grega passou de € 263 bilhões, em 2008, a € 355 bilhões em 2011. O PIB caiu, no período, de € 233 bilhões a € 218 bilhões. E, com uma taxa de juros oficial de 32%, nem é preciso dizer que a Grécia não pode de jeito nenhum se financiar nos mercados" [o que era ou ainda é a meta última dos programas europeus].
Os novos passos dados na tragédia -a aprovação pelo Parlamento de um novo aperto e a eventual liberação de novo pacote pela "troica" União Europeia/Fundo Monetário/Banco Central Europeu- evitarão a ruína final? Não, prevê Münchau no "FT". Pode, imagina ele, haver um período de calma, mas logo "se tornará claro que os cortes nos salários e aposentadorias piorarão a depressão".
Sua sugestão, válida para a Grécia, mas também para Portugal, que está voltando a entrar na zona de desastre: "O melhor seria reconhecer o estado desolador de ambos os países, deixá-los quebrar dentro da união monetária [sem sair do euro, portanto, ao contrário do que vêm sugerindo autoridades alemãs], e utilizar, então, um fundo de resgate suficientemente incrementado para ajudá-los a se reconstruir, ao mesmo tempo em que se ergue um muro de proteção ao resto [dos países da eurozona]".
Fecha o raciocínio com outra lógica elementar: "Será muito caro, mas ignorar a realidade por mais dois anos será ruinoso".
Posto de outra forma: a Grécia não ficaria sozinha na sua ruína.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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