• Em depoimento, Cerveró cita documento que teria de ser do conhecimento de Dilma
Alexandre Rodrigues – O Globo
RIO - O ex-diretor internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, começou a elevar o tom que adotou até agora em sua defesa no caso Pasadena. Na última segunda-feira, discretamente, ele prestou depoimento à comissão interna criada pela presidente da Petrobras, Graça Foster, para apurar supostas irregularidades na aquisição de 50% da refinaria americana, em 2006. Segundo uma fonte que teve acesso ao depoimento, Cerveró indicou que não vai aceitar assumir sozinho a responsabilidade pelos prejuízos da estatal. Na linha do ex-presidente da Petrobras José Sergio Gabrielli, ele cobrou, ainda que indiretamente, a responsabilidade da presidente Dilma Rousseff, que na época era presidente do Conselho de Administração da estatal, ao mencionar o parecer jurídico que subsidiou a aquisição.
Em março, ao explicar por que votou pela compra da refinaria, Dilma acusou Cerveró de ter apresentado ao conselho um resumo executivo “técnica e juridicamente falho”. Segundo ela, o documento omitiu duas cláusulas do contrato: “Marlim” (que garantia rentabilidade de 6,9% à Astra) e “put option”, que foi a invocada pela sócia belga Astra Oil para obrigar a Petrobras a comprar a outra metade da refinaria do Texas. Ela estabelecia essa saída em caso de divergência. Foi o que aconteceu por causa das obras de reestruturação da refinaria. Segundo Dilma, o conselho não teria aprovado o negócio se soubesse das cláusulas. A estatal já gastou cerca de US$ 1,9 bilhão com Pasadena e reconheceu prejuízo contábil superior a US$ 500 milhões.
Cerveró passou oito horas depondo na sede da estatal, no Rio, onde foi ouvido por uma comissão de oito funcionários indicados por Graça. Ele repetiu que as cláusulas são recorrentes em contratos similares, não sendo essencial a citação delas no resumo, e que os documentos complementares, inclusive a íntegra do contrato, estavam à disposição do conselho. Ao fim do depoimento, entretanto, ele entregou uma defesa por escrito redigida em duas páginas por seu advogado, Edson Ribeiro.
O documento, obtido pelo GLOBO, recorre ao Estatuto Social da Petrobras para dizer que o conselho não poderia ter decidido pela aquisição de Pasadena apenas com base no seu resumo técnico, mas subsidiado pela decisão encaminhada pelo colegiado da diretoria executiva, pelas manifestações da área técnica ou comitê competente e pelo parecer jurídico. Essa previsão está no artigo 31 do estatuto. Dessa forma, Cerveró sustenta que sua participação na reunião do conselho era “complementar”.
De fato, o parecer jurídico JIN-4060/2006, também obtido pelo GLOBO, faz referência à cláusula “put option”, razão da perda dos processos judiciais e arbitrais da Petrobras contra a Astra, nos Estados Unidos. Esse parecer é um dos anexos à ata da reunião do Conselho de Administração de 3 de fevereiro de 2006, que sacramentou a compra de Pasadena. Com data de 27 de janeiro, o parecer diz que o acordo de acionistas da refinaria contempla “cláusulas necessárias ao relacionamento entre as sócias”. O texto, assinado pelo gerente do Jurídico Internacional da Petrobras, Carlos Borromeu de Andrade, informa que, no contrato, há “a previsão da compra pela PAI (put option) da participação da Astra em situações de impasse”. PAI é a sigla usada para Petrobras America, subsidiária americana da estatal. O parecer ainda diz que o contrato tem “cláusulas usuais em transações do gênero”, sem ressalvas.
Com a entrega desse documento, Cerveró procurou deixar claro à comissão interna que Dilma e o conselho teriam conhecimento da cláusula. Se não leram ou não receberam o parecer, Dilma é que teria falhado ao autorizar a votação do conselho. Procurado pelo GLOBO, o advogado de Cerveró confirmou o depoimento, mas não quis falar do conteúdo. A Petrobras também não quis comentar.
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