• Comércio foi contaminado pela política ideológica
- Valor Econômico
Em sua passagem pela Associação comercial de São Paulo, na semana passada, o senador Aécio Neves (PSDB), ao falar das relações e comércio do Brasil com o mundo, citou três vezes o embaixador Rubens Barbosa, da mesma forma que vem revelando as ideias que Armínio Fraga propõe ao seu projeto para a economia do Brasil. No Iedi, ocorreu o mesmo; em jantar com políticos na residência do ex-prefeito Gilberto Kassab, repetiu; e com banqueiros, idem.
Os dois experts estão mais expostos no périplo paulista do candidato, mas há outros, especializados nas diferentes áreas do programa de governo, convidados pelo ex-governador Antonio Anastasia, coordenador do trabalho, para uma primeira rodada de discussões em grupo, na próxima semana.
Armínio foi presidente do Banco Central e essas plateias o conhecem bem, bem como as ideias já aceitas pelo candidato. Rubens Barbosa, não. Embaixador em países importantes de todas as regiões do planeta, ocupou os cargos mais relevantes da carreira e teve como último posto a representação do Brasil nos Estados Unidos, ainda no governo Lula. Confirma que está convidado a ajudar o candidato na formulação do programa de trabalho não só para a Política Externa, como também para a Política de Comércio Exterior e Política de Defesa.
Na política externa, porém, e sua estreita comunicação com o comércio exterior, é onde o embaixador identifica um abismo cavado nos últimos 12 anos. Seria necessário, a seu ver, começar do zero, revisar tudo até trazer os fundamentos do Barão do Rio Branco de volta às relações do Brasil com o mundo. Rubens Barbosa é um crítico da política que se vem executando. Ele assegura que houve uma contaminação político-partidária-ideológica da política externa, e isso se reflete em algumas prioridades que acabaram criando desequilíbrios fortes, de que é exemplo o peso da relação sul-sul em contraponto à relação com os países desenvolvidos.
Essa opção é responsável por praticamente todos os grandes desastres diplomáticos dos últimos anos, alguns dos quais comenta no contexto da revisão. A começar pelo último e ainda não resolvido problema com a Bolívia. Depois de ter concordado em conceder o asilo ao senador boliviano Roger Pinto Molina, por pressão do presidente Evo Morales, e portanto uma submissão ao outro país por afinidade ideológica, o governo brasileiro não exigiu o salvo-conduto, previsto nos tratados observados na região para o caso de asilo, e permitiu que o senador ficasse morando nos escritórios da embaixada brasileira mais de um ano, com reconhecidos problemas psicológicos, sem condições de nenhuma natureza. No cargo de embaixador interino, o diplomata Eduardo Saboia quebrou a hierarquia e tomou uma atitude que acabou por resolver o problema do Brasil mas enfureceu a presidente. Dilma não aceitou a solução, recomendou a demissão do diplomata, que ainda está em banho-maria, demitiu o chanceler à época, Antonio Patriota, e comunicou a Morales que o havia afastado em razão do incidente.
A suspensão do Paraguai do Mercosul para a entrada da Venezuela, mesmo sem este país cumprir a cláusula democrática do bloco, foi o outro episódio catastrófico ocorrido em nome da diplomacia por afinidade ideológica. Nesse caso o Itamaraty, reativo, foi retirado da sala para que os presidentes pudessem negociar em compadrio com o amigo.
Na relação com desenvolvidos do Norte é o contrário, há desfeitas e choques. Pela Argentina, que bateu o pé contra inclusão de bens e serviços no acordo do Mercosul, tenta há seis meses acertar com a União Europeia acordo já aprovado por Uruguai e Paraguai, sem sucesso. Com os Estados Unidos, há o insolúvel caso da espionagem dos e-mails presidenciais.
Na avaliação de Rubens Barbosa, no início a reação da presidente Dilma foi correta, todos os chefes de governos espionados tinham mesmo que protestar contra o absurdo do ato. Ocorre, porém, que diante de 190 países, na ONU, a presidente brasileira tomou a atitude de anunciar que as relações só iriam se normalizar depois que os Estados Unidos dessem alguma satisfação e seu presidente pedisse desculpas formais. Satisfação, foi dada. Pedido de desculpas já é mais complexo, ele não o fez nem ao povo americano que protestou contra a espionagem. Hoje, não há solução, mas a questão, só no Brasil, ainda está em pauta, 50% pelo marketing, 50% por ideologia.
Estas situações não são inócuas, resultam na paralisação de acordos que interessam ao Brasil e em relações congeladas com os Estados Unidos.
No Sul, os países fazem o que querem, o Brasil se curva. Ao Norte, dá uma banana. "Quem ganhou a eleição tem não apenas a prerrogativa, mas o dever, de definir suas prioridades, não é disso que estamos discordando. O que questionamos são os resultados por causa da prevalência das questões ideológicas e partidárias. Não existem resultados".
O embaixador que prepara o programa de um eventual governo Aécio Neves afirma também que a influência partidária e ideológica na politica externa acabou contaminando a política de comércio exterior. "O comércio exterior brasileiro, nesses últimos 12 anos, ignorou um esforço de penetração nos mercados desenvolvidos e concentrou-se na América do Sul e África, também com resultados pífios Visitamos, criamos embaixadas em numerosos países, mas as exportações ficaram praticamente estagnadas. Nesse últimos anos, o Brasil negociou 3 acordos comerciais, com Israel, Egito, Autoridade Palestina. No mundo estão sendo negociados mais de 500 acordos de livre comércio".
"Vamos fazer uma revisão da estratégia de negociação comercial brasileira".
Aécio aprofundará a mudança na política externa com alguns objetivos, entre os quais se destacam: buscar restabelecer a projeção do Brasil no exterior, restabelecer o prestígio do Itamaraty, hoje completamente marginalizado, e restabelecer seu papel na formulação da política externa e comercial, para equilibrar as prioridades na recuperação dos vínculos de comércio, inovação, e tecnologia com a reinclusão dos países desenvolvidos, que é onde elas existem.
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