Não
teremos futuro sem escola com máxima e igual qualidade para todos
No
dia seguinte ao pleito de 15 de novembro, o ministro Luís Roberto Barroso,
presidente do TSE, pediu desculpas pelo atraso de algumas horas na divulgação
dos resultados eleitorais. Surpreende que ninguém antes tenha pedido desculpas
pelo atraso educacional de cem anos. Nem temos a quem responsabilizar: não há
TSE da educação nacional.
Presidentes
e ministros cuidam de universidades e escolas técnicas, enquanto a educação de
base é responsabilidade de quase 6 mil prefeitos e alguns governadores. A
população com renda não culpa o governo, porque utiliza escolas particulares;
os pobres acostumaram-se a ver a escola como restaurante para os filhos
receberem merenda. O eleitor não dá à educação a mesma atenção que ao resultado
rápido da eleição.
Todos
os presidentes e políticos, desde 1889, especialmente depois de 1985, devem
pedir desculpas pelo atraso e pela desigualdade educacional no Brasil.
Fui ministro por 12 meses e devo pedir desculpas por não ter construído força política para me manter no cargo pelo tempo necessário para implementar as ferramentas que defendo, e iniciei, como a Escola Ideal, embrião de um sistema nacional de educação de base. Como governador, implantei a Bolsa Escola e diversos programas na educação de base no Distrito Federal. Como senador, criei duas dezenas de leis, como a do Piso Salarial Nacional dos Professores, a obrigatoriedade de vaga desde os 4 até os 17 anos de idade. Mas nada disso mudou a realidade. Como candidato a presidente só consegui 2,5% dos votos.
Reitero
as desculpas por não ter convencido a opinião pública de que educação é o vetor
do progresso e a estratégia para isso passa pela nacionalização do sistema
municipal. A educação não será de máxima qualidade, nem será igual nas 200 mil
escolas do Brasil, enquanto a responsabilidade pela educação das crianças
brasileiras não for do governo federal.
Para
isso cinco passos são necessários: 1) transformação do MEC em ministério com a
responsabilidade exclusiva de cuidar da educação de base; 2) criação de uma
carreira nacional do magistério, todos os professores com muito boa formação,
avaliados permanentemente, com dedicação exclusiva e, para isso, muito bem
remunerados; 3) prédios escolares com a máxima qualidade e instalações
culturais e esportivas; 4) escolas com os mais modernos equipamentos da
pedagogia, que permitam saltar das tradicionais aulas teatrais para as aulas
cinematográficas com recursos da teleinformática, adotando métodos que
desenvolvam a criatividade; 5) todas as escolas em horário integral.
Raríssimas
cidades são capazes de financiar a execução dessa estratégia. Ela requer
processo de nacionalização da educação de base ao longo de alguns anos, com
adesão voluntária de cidades que queiram substituir seus frágeis sistemas
educacionais por um robusto sistema nacional.
O
custo para ter essa “escola ideal” é de R$ 15 mil/ano por aluno. Valor que
permitiria financiar todos os gastos e investimentos e pagar salário de R$ 15
mil ao professor por mês, em salas com 30 alunos. Esse salário faria do
magistério uma profissão atraente, permitindo que o selecionado aceitasse ir
para a cidade que lhe fosse determinada, com dedicação exclusiva à sua escola e
submetido a avaliações periódicas. Num ritmo de 300 cidades por ano, o novo
sistema chegaria a todo Brasil em 20 anos. Se o PIB crescesse a um ritmo médio
de 2% ao ano, o sistema nacional custaria cerca de 7% do PIB, para atender 50
milhões de alunos.
Considerando
que o número de alunos deverá ser menor e que as novas técnicas permitirão
diminuir o custo por aluno, a dificuldade dessa estratégia é política:
convencer os ricos de que a escola com qualidade apenas para seus filhos amarra
o progresso do País e limita o bem-estar e o futuro de todos; e os pobres, de
que seus filhos têm direito a uma escola que ofereça muito mais do que merenda
e seja tão boa quanto as melhores do país. Convencer também os políticos de que
terão de enfrentar eleitores mais conscientes; e mostrar aos sindicatos que os
interesses dos professores devem ser associados aos interesses das crianças, da
educação e do futuro do país.
Não
será fácil atrair a população para a ideia de que as escolas brasileiras
poderão ser tão boas quanto as de países com educação de qualidade. E que
crianças pobres devem ter escolas com a mesma qualidade das dos ricos.
No
final do século 19 tivemos dificuldade para convencer que era possível o Brasil
ser um país industrial e para isso era preciso abolir a escravidão. Agora o
desafio é convencer que sem escola com a máxima qualidade para todos não
completaremos a Abolição, nem avançaremos para o progresso com eficiência
econômica, justiça social e sustentabilidade ecológica no mundo global da
civilização que caracteriza o século 21. Antes não tínhamos futuro com a
escravidão, agora não teremos futuro sem escola com máxima e igual qualidade
para todos. E que nenhum cérebro seja deixado para trás. Enquanto isso não for
feito, precisamos pedir desculpas pelo atraso a que condenamos o Brasil.
*Professor Emérito da Universidade de Brasília
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