Obrigatoriedade
do voto inclui paternalismo arrogante
Sei
que escrevo contra a obrigatoriedade do voto com uma frequência maior do que a
recomendável, mas não tem jeito, essa é uma das jabuticabas brasileiras que
mais me incomodam.
O
incômodo é sobretudo filosófico, já que, na prática, eu dificilmente deixaria
de votar caso a obrigatoriedade fosse
eliminada. Aliás, resolver as pendências burocráticas por não ter visitado a
urna, seja justificando-se, seja pagando a multa, que não excede R$ 4, é quase
tão simples quanto votar, de onde concluo que, na vida real, não é o medo das
sanções que faz as pessoas aparecerem para digitar os números de seus políticos
favoritos.
Se a obrigatoriedade é quase inócua, por que então insurgir-se contra ela? Como antecipei, a questão é filosófica. Para os que, como eu, defendem que votar seja opcional, o instituto é um direito. Já para os apoiadores do voto compulsório, ele é um dever.
Só
que eu não vejo como sustentar que seja um dever. O sujeito que não vai votar,
afinal, não causa nenhum tipo de dano a ninguém nem a nenhuma instituição. Uma
eleição a que tenham comparecido 40% dos eleitores vale exatamente o mesmo que
uma a que tenham acorrido 90%. O número de mandatos resultantes é o mesmo,
assim como são os mesmos o poder e a legitimidade dos eleitos.
Há
um paternalismo arrogante por trás da defesa da obrigatoriedade: precisamos
assegurar que todas as classes sociais participem do processo eleitoral, mesmo
que não o desejem. Penso um pouco diferente. Precisamos assegurar que ninguém
seja impedido de participar do processo, mas sem jamais forçar uma pessoa a
fazer o que não quer quando a inação não gera dano.
Trocando em miúdos, se levamos a sério a ideia de democracia, não podemos aceitar uma regra que afirma que cabe ao cidadão decidir quem serão os dirigentes e legisladores, mas que o impede de decidir soberanamente se vai ou não comparecer à sua seção eleitoral.
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