Folha de S. Paulo
Qualquer desfecho em que Putin conserve o
poder se torna inaceitável.
Ainda falta o carimbo de algum órgão investigativo, mas não creio que haja dúvida de que atrocidades foram cometidas na Ucrânia e de que tropas russas são responsáveis por elas. Se invadir um país soberano, expondo a população local aos riscos das operações de guerra, já é moralmente injustificável, muito pior é tolerar que as tropas perpetrem massacres ou mesmo utilizá-los deliberadamente para instilar o pânico entre civis. Se a última hipótese se comprovar, Vladimir Putin terá assegurado seu lugar na história como um dos grandes criminosos de guerra do século 21.
As implicações da escalada são não só
éticas mas também práticas. As imagens de valas comuns e corpos estendidos nas
ruas dão impulso a um movimento pelo endurecimento das sanções contra Moscou. O
próximo passo seria os países da União Europeia deixarem de comprar gás e
petróleo russos. Seria uma medida economicamente dolorosa para as nações
europeias, mas ainda pior para a Rússia, talvez afetando até sua capacidade de
financiar a guerra.
A menos, porém, que as sanções levem a um
colapso do regime, o que não parece um cenário iminente, os crimes contra civis
tendem a prolongar e não encurtar o conflito. É que quanto mais as diferenças
entre russos e ucranianos são descritas em termos morais, isto é, quanto mais
viscerais ficam, mais difícil é chegar a uma saída negociada. Se já é
complicado acertar-se com seu inimigo, muito mais é entender-se com alguém que
você vê como um genocida, empenhado em destruir seu povo.
Isso vale também para o Ocidente. Pintar Vladimir Putin como monstro ajuda a justificar a adoção de sanções que prejudicam os próprios países que as impõem, mas dificulta, se não inviabiliza, um retorno ao "statu quo ante". Se Putin é o novo Hitler, é difícil imaginar Biden e os líderes europeus apertando a sua mão. Qualquer desfecho em que o autocrata conserve o poder se torna inaceitável.
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