Folha de S. Paulo
Jogar fora das quatro linhas, como quer
Bolsonaro, é não aceitar o resultado das urnas
Para compor sua linguagem estropiada, não há como Bolsonaro dispensar o uso de muletas. Qualquer assunto é uma "cuestão", as respostas sempre começam com "no tocante a isso daí", além do já personalizado arremate "talquei". Uma das expressões, por revelar a crueldade de quem a diz, foge à pobreza de repertório: "ponta da praia" era uma gíria de militares no tempo da ditadura para se referir a uma base na Restinga da Marambaia, no Rio de Janeiro, onde presos políticos foram executados.
Para atacar o Judiciário, a preferida é "dentro
das quatro linhas", velho lugar-comum da imprensa esportiva. No
bolsonarês, ela significa o contrário e identifica uma ameaça: rebelar-se e não
aceitar o resultado das urnas. "Não serão dois ou três que decidirão como
serão contados esses votos", disse Bolsonaro, num recado a Luís Roberto
Barroso, ex-presidente do TSE; Edson Fachin, o atual; e Alexandre de Moraes,
que assume o tribunal em agosto.
Jogar fora das quatro linhas é dar um golpe contra as instituições, caso ele
não seja reeleito. Bolsonaro tem descumprido todas as regras do jogo –sem ser
incomodado ou punido. Pelo contrário: tem apoio do centrão (cujos membros
parecem não se importar com o risco de o Congresso fechar num futuro próximo)
e, sobretudo, das camadas militares e empresariais. Só falta marcar o gol de
mão, estando em impedimento, depois do tempo regulamentar esgotado.
Os adversários são obrigados a respeitar a lei eleitoral; ele não. Depois de
promover com dinheiro público motociatas Brasil afora e espalhar nas redes
mentiras a seu favor, transforma qualquer evento da Presidência da República e
até cultos evangélicos em comícios antecipados.
Na batalha da desinformação, ainda age um elemento extra: o general golpista
que se finge democrata filiando-se a partidos políticos e lançando-se candidato
às eleições ao mesmo tempo em que elogia o Golpe de 64.
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