quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Por açodada, federação arrisca poder amealhado, por Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Depois de ver aprovado projeto que tipifica o devedor contumaz, ao qual se opôs, federação capitaneia defesa da venda do Master e abre flanco para vitórias do governo

Por açodada, a federação PP-União arrisca ir para o calabouço junto com Jair Bolsonaro. Se o ex-presidente, no limite, como ficou claro nas primeiras sessões de julgamento, tem como horizonte mais otimista uma pena de 30 anos, a federação, numa sucessão de erros, coloca em risco o poder de maior bloco partidário.

Depois de se expor na defesa dos devedores contumazes, atingidos pela Operação Carbono Oculto, foi a vez de a federação encabeçar uma investida em defesa da compra do Master pelo BRB com a defesa da prerrogativa do Congresso para demitir diretores do Banco Central. A primeira operação naufragou depois que a operação da PF/MP-SP mostrou o abrigo concedido ao crime organizado pelo devedor contumaz.

O pavor dos parlamentares de serem expostos a uma sociedade com o PCC zerou a oposição ao projeto que o tipifica e passou no Senado sem um único voto contrário. Da mesma maneira, com os fundos do Master nas mãos de gestores atingidos pela Carbono Oculto, vai ser difícil para o Congresso dar seu aval. No governo, se havia simpatia, da Casa Civil ao BC, pela operação, ficou impossível defendê-la. Na noite desta quarta, o banco anunciou o veto à operação.

Com os sócios que o Master arrumou no Congresso, a oposição à operação não ficou restrita a Renato Gomes. O diretor, um economista que até vir para o BC produzia estudos sobre regulação financeira para centros de pesquisa da Europa, foi alvejado até por outdoors patrocinados por interesses que movem a mídia brasiliense no compasso do novo cangaço.

De tantas frentes abertas para blindar o indefensável, a federação deixou flancos abertos para o governo aprovar, com votos do PL, um projeto que abriga R$ 12 bilhões em precatórios na meta e abre espaço fiscal no ano eleitoral. Não bastasse, ainda fracassou em levar à frente a PEC da blindagem que deixava os parlamentares fora do alcance do Judiciário.

E não é tudo. Com a quantidade de computadores e celulares apreendidos nas operações da segunda, além da ordem, já acatada pela Interpol, para a busca de foragidos, esperam-se novas frentes que permitam avançar, por exemplo, sobre a lavagem de dinheiro abrigada nas “bets”. Trata-se de outro flanco que expõe não apenas a federação mas um naco do Centrão e fatias do mercado mais estabelecidas que fintechs.

Foi em meio a este bombardeio que a federação anunciou a saída do governo. Foi uma reação com o fígado, órgão que nem Ciro Nogueira nem Antonio Rueda costumam usar na política, a uma menção desairosa sobre ambos por Lula na reunião ministerial. O fígado se mostrou mau conselheiro. O único dos três ministros do União sobre o qual têm ingerência, Celso Sabino (Turismo), se recusa a deixar o cargo em plena COP30 em sua cidade natal. Pode acabar trocando de partido. A pressão tampouco altera a Codevasf, hoje nas mãos do presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Eles ainda correm o risco de uma fuga de parlamentares que se recusam a ficar ao relento em 2026.

Já o PP pode acabar conseguindo arrancar André Fufuca dos Esportes, mas o feudo do partido na Caixa Econômica, gerido pelo ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (AL), permanecerá intocado. A saideira pode acabar desequilibrando, pró-Lira, o pêndulo do poder que se alterna entre o deputado e o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do partido. Conselheiro do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), Ciro já o colocou numa fria uma vez, ao recomendar que rejeitasse o decreto do IOF, episódio que acabou precipitando o “8 de janeiro de paletó”.

A briga não é apenas do Centrão com o governo. É rolo deles com eles mesmos. Como o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), é candidato ao Senado, Casa na qual Renan Calheiros (MDB) disputará a reeleição, resta a Lira permanecer na Câmara e tentar retomar a Mesa, desalojando Hugo Motta (Republicanos-PB). A visita de Lira a Bolsonaro foi um beija-mão. A Motta só resta a mão de Lula. A de Nogueira, seu padrinho, tem pouco a lhe oferecer.

A estrela da federação PP-União arrisca a se apagar precocemente. No espaço gravitacional do governo federal, deve ceder lugar ao Republicanos e ao PSD. No tarcisismo, a tendência é que a federação seja ultrapassada pelo PL, partido ao qual o governador de São Paulo deve se filiar, não importa o cargo que venha a disputar.

No afã de arrebanhar o bolsonarismo, o governador de São Paulo mete os pés pelas mãos. Para a fatia da política que é conservadora mas não é bolsonarista, Tarcísio é um nome palatável para se dividir um palanque, desde que não caia em esparrelas como a de que não confia na justiça. É paulista por adoção, aliado ao Centrão, personaliza o apoio dos “ricos” e defende Donald Trump. Não precisa de outros predicados para se complicar. Arvora-se a defender o bolsonarismo quando não há evidências de que o ex-presidente abra mão do seu sobrenome na urna.

Tarcísio e o Centrão agarraram-se à anistia antes mesmo de Bolsonaro ser condenado sem considerar que este possa ser um presente para Lula. Não é só o STF que pode derrubar a anistia. Qualquer projeto dessa natureza tem que ser sancionado pelo presidente. Dependendo do formato que venha a ter, beneficiando golpistas bagrinhos, por exemplo, é Lula quem, se reeleito, o sancionaria. Promoveria, no início do seu segundo mandato, a conciliação nacional que lhe escapou neste primeiro.

 

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