Folha de S. Paulo
Sem anistia em 1979, em 2006 e em 2025
Anistia é negação da justiça. Em graves
violações de direitos humanos ou atentados contra a democracia, anistia não é
pacificação, é medo. É o medo que a democracia tem, às vezes, de chamar tortura
pelo nome, de chamar invasão do
Parlamento de golpe, de chamar morte pela polícia de
assassinato.
Guardadas as devidas proporções de cada
momento histórico, a função que a anistia executa é a mesma: impunidade
certeira.
Torturadores da ditadura não deveriam ter sido anistiados em 1979. Não estaríamos no imbróglio em que o bolsonarismo nos jogou se o time de Ustra e quem o aplaude estivessem na cadeia. A persistência da anistia de 1979 é ilegal porque viola compromissos internacionais do Brasil, apesar de o STF já ter decidido erroneamente sobre o tema. A anistia da ditadura não gerou pacificação alguma (a estrutura militarizada da polícia que o diga). A pacificação que a anistia de 1979 gerou foi o medo do Exército que temos.
Anistia, tampouco, não deveria ser aplicada
aos crimes de maio de 2006, por meio da prescrição da indenização de vítimas
mortas ou feridas por agentes do Estado. Enquanto a direita flerta com a
anistia por golpe, nesta semana o STJ (Superior Tribunal de Justiça) debate se
é favorável a outro golpe longe dos holofotes do noticiário: se o Estado e seus
agentes devem ser punidos —de forma imprescritível, como são as violações de
direitos— por executar civis. A pacificação que a anistia aos crimes de 2006 gera
é o medo da polícia.
Anistia não deveria, por fim, ser aplicada em
2025 para conceder impunidade àqueles que buscaram reverter na marra o
resultado das eleições e prender opositores. Colocar impunidade em termos de
pacificação —como fez Tarcísio
de Freitas—
implica reencenar a velha prática brasileira de varrer a bomba do autoritarismo
para baixo do tapete esperando que ela não exploda eventualmente.
A pacificação que a anistia de 2025 geraria
será a certeza de impunidade por novos golpes. Anistia não foi uma boa ideia em
1979 ou em 2006 e não será em 2025.
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