Folha de S. Paulo
Pela lógica dos números, democracias deveriam
sempre taxar muito pesadamente os mais ricos
Livro analisa dados de 20 países e mostra que
alta progressividade é mais a exceção do que a regra
Um dos paradoxos da democracia é por que elas
não levam a uma rápida e inexorável elevação
da progressividade dos tributos. Democracia, ao fim e ao cabo, é uma
questão de números, e há muito mais eleitores que se beneficiariam de um
sistema que taxa mais vigorosamente os mais ricos do que os que por ele seriam
prejudicados.
No caso do Brasil, o sistema tributário é tão regressivo que a proposta do governo que aumenta a taxação do andar de cima, que avança no Parlamento, não é muito mais do que um bom começo. A discussão, porém, é universal.
Volto ao instigante livro "Taxing
the Rich", de Kenneth Scheve e David Stasavage, que já comentei aqui.
A dupla analisou dois séculos de dados tributários de 20 países da América do
Norte e da Europa, bem como os debates em torno das mudanças na legislação, e
chegou a algumas conclusões contraintuitivas.
Democracias, contra as expectativas, parecem
ter uma dificuldade atávica em manter por longos períodos sistemas fortemente
progressivos. Não é que nunca consigam. Mesmo um país alérgico a tudo o que
tenha cheiro de socialismo, como os EUA, chegou a ter uma alíquota máxima de IR
de mais de 90% durante a 2ª Guerra Mundial e nos anos subsequentes, mas não
manteve essa situação por muito tempo.
E não apenas os EUA. Nações que podemos
considerar menos plutocráticas e menos individualistas, como Canadá e Suécia,
foram até mais longe que os americanos ao eliminar seus impostos
de sucessão.
Para Scheve e Stasavage, discussões
tributárias se dão em torno de três eixos: capacidade contributiva, percepção
de equidade e eficiência do sistema.
Alíquotas mais elevadas só se materializam
quando a sociedade as percebe como justas, seja porque os ricos foram poupados
de um grande sacrifício, como ser convocados para lutar na guerra, seja porque
foram indevidamente beneficiados por alguma política pública.
É interessante notar que essa história dos
tributos basta para desmontar a tese de que o eleitor vota sempre de forma
egoísta e privilegiando o bolso.
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