O Estado de S. Paulo
Lula avançava para o fim do terceiro ano de
mandato sem identidade positiva para o seu governo reativo, até há pouco um
apagador de incêndios não raro criados ou alimentados por si. Não mais. A
isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil é marco de caráter a
partir do qual desenrolar – a um ano da eleição – uma agenda competitiva, cujo
poder só com o tempo se conseguirá medir.
Lula, que nunca foi carta fora do baralho, tem dado as cartas. É mensagem pujante a do governo taxador das blusinhas que afinal isenta o pobre do IR. O texto está pronto e se desenvolve livremente, com fundamento na história da esquerda brasileira e favorecido pela inexistência de oposição organizada – a direita bolsonarista hegemônica de todo paralisada sob a bandeira da anistia. Lula agradece.
Ele está de volta ao discurso original, o de
combate à desigualdade, reapropriando-se do compromisso, dando centralidade ao
compromisso, de combater as disparidades de renda no Brasil – o mais rico, essa
categoria etérea, a arcar com o custo do esforço por justiça tributária.
Gleisi Hoffmann deu a letra, a partir da
vitória (decisivamente devida a Arthur Lira) da última quarta-feira na Câmara:
“Coloca num outro patamar a discussão sobre a diferença de renda do País. Acho
que o mais importante foi ter atingido pela primeira vez o andar de cima. É
algo paradigmático para nós”. A ministra prenuncia um programa.
A isenção do IR para os que ganham menos era
um tabu. Foi vencido. Ora oferecidas as condições políticas para outro
“enfrentamento” que, desde o imaginário da esquerda, poderia seduzir o eleitor
sobre o qual o lulopetismo perdera influência: aquele pelo fim da escala de
trabalho 6x1, em defesa de o trabalhador ter mais tempo para si e os seus. É recado
poderoso, de comunicação fácil.
Se o cronista gostasse de apostar e tivesse
dinheiro para apostar, casaria firme em que a campanha de Lula pela reeleição
explorará essa ideia simbólica de um futuro melhor e acessível.
Em entrevista ao jornalista Thiago Prado, do
Globo, o outrora marqueteiro petista João Santana pregou que o caminho para a
reeleição do presidente passaria por comprar brigas “à esquerda”, numa espécie
de regresso à tradição. A mudança da carga de trabalho devendo estar “na linha
de frente das iniciativas do Planalto”. Tudo leva a crer que estará.
Enquanto isso, Eduardo Bolsonaro investe no
alheamento e expressa a constituição de uma dissidência bolsonarista: “Sem
anistia, não haverá eleição”. Haverá. Sem Jair Bolsonaro. Sem Eduardo Bolsonaro.
Com Tarcísio de Freitas? Eduardo já respondeu, falando ao Metrópoles: “Se eu
estiver inelegível porque fui condenado pela minha atividade nos EUA, eu acho
possível que os EUA não reconheçam a eleição do Brasil”.
É certo que o projeto “Tarcísio presidente”,
ainda que com o apoio de Jair Bolsonaro, terá a oposição do bolsonarismo
eduardista. A oposição que Lula, grato, não tem.
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