Desde o início dos anos 90, vários serviços de infraestrutura foram objeto de privatização nos setores de energia, telecomunicações, transportes e, em menor escala, saneamento. No caso da telefonia e na geração de energia optou-se pelo processo de venda de ativos e na distribuição de energia e transportes o modelo foi de concessão da operação por um determinado período. Recentemente, ocorreram algumas experiências de concessão do tipo de parceria público privada, as chamadas PPPs, nas quais existem responsabilidades compartilhadas entre governo e concessionário. Em alguns casos no saneamento e em energia houve a abertura do capital das empresas que, embora continuando sob o comando estatal, estão listadas na bolsa e adotam políticas de governança corporativa e prestação de contas a seus acionistas. A concessão da gestão de serviços de infraestrutura à iniciativa privada oferece oportunidade de investimentos e possibilidade de melhoria na qualidade do serviço, contribuindo para maior eficiência da economia, resultando em estímulo ao crescimento econômico e à geração de empregos. É hora de fazer uma avaliação desses programas.
Ao menos três motivações podem ser consideradas para a privatização dos serviços de infraestrutura. A crise fiscal foi a causa imediata que exigiu a retirada do Estado de várias atividades, gerando recursos para reduzir a dívida pública e desonerando o tesouro de investimentos, operação e manutenção de serviços passíveis de transferência à iniciativa privada. Ademais, o ambiente de reformas econômicas e de retomada do crescimento propiciou a mobilização de recursos privados, quer do Brasil ou do exterior, abrindo novas oportunidades para investimentos. Finalmente, esperava-se que, com gestão privada, os serviços teriam melhor qualidade e o aumento da eficiência da economia seria o resultado final.
O recente anúncio da retomada de concessões de rodovias e aeroportos e as punições a três concessionárias de serviços de telefonia indicam, de um lado, a opção do governo federal em assumir definitivamente os programas de privatização de serviços de utilidade pública e, de outro lado, sua preocupação com a qualidade da oferta desses serviços. Seria oportuno, nesse momento, avaliar como está o programa de privatizações, quais seus acertos e seus erros e como melhorá-lo. Entendo que os três aspectos merecem uma análise para aprimorar as concessões de serviços de infraestrutura no País.
Primeiro: um planejamento bem elaborado. O governo tem a responsabilidade de definir objetivos, desenhar e implementar programas com cronogramas preestabelecidos e divulgá-los para que os investidores e a população tomem conhecimento. Anúncios pontuais não garantem a continuidade do programa nem, tampouco, contribuem com o planejamento do setor privado. Quem sabe hoje o que o governo quer com os serviços de utilidade pública?
Segundo: um respeito maior ao modelo regulatório vigente. O processo de privatização dos serviços de infraestrutura requer a criação de agências reguladoras e a clara segregação de funções entre a administração direta - definição de políticas e estratégias - e as agências - supervisão e fiscalização dos serviços. Atualmente, essa é a parte mais frágil do modelo adotado no Brasil porque as agências carecem de real autonomia.
Terceiro: um acompanhamento mais rigoroso do padrão dos serviços prestados, o que exige, ao mesmo tempo, um adequado modelo de concessão, em que a qualidade dos serviços tem lugar central, e a adoção de indicadores de desempenho que possam ser acompanhados pelos usuários. Concessões que visam exclusivamente a aumentar a receita pública são fadadas a oferecer serviços de baixa qualidade ou a favorecer o não cumprimento de exigências contratuais de investimentos. Deve-se evitar o risco de adotar apenas o preço como critério de decisão, o que, de imediato, agrada ao usuário, mas lhe sairá bem mais caro no futuro. Preço não é tudo. Padrão de qualidade é fundamental.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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