• Para especialistas, clima pacífico foi sinal amadurecimento, e protesto amanhã será contraponto às manifestações de ontem
Germano Oliveira – O Globo
SÃO PAULO - Nas manifestações desta sexta-feira, os apoiadores do governo carregavam bandeiras que, na prática, eram uma defesa prévia das manifestações contra a gestão Dilma Rousseff previstas para este domingo. Cientistas políticos ouvidos pelo GLOBO consideram que esse discurso teria sido a forma encontrada por entidades governistas para desqualificar o movimento contra a presidente e, assim, criar uma espécie de polarização entre os que seriam a favor e os que seriam contra a ideia do impeachment.
Segundo Fernando Antonio de Azevedo, da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar), os simpatizantes do governo reforçaram que as manifestações de amanhã serão uma espécie de terceiro turno das eleições — embora lideranças que estarão amanhã nas ruas tentem evitar falar em impeachment.
— É do jogo político que os governistas tentem desqualificar o movimento de domingo. Mas tudo indica que os manifestantes contra o governo serão basicamente os eleitores de Aécio Neves, reforçados pelos que sofrem com a crise econômica e criticam o aumento da corrupção, como revela o escândalo da Lava-Jato — disse Azevedo.
Parte do jogo democrático
Para o cientista, as manifestações a favor e contra o governo aprofundam a divisão do país, já explicitada nas eleições de outubro do ano passado. Azevedo diz que os dois atos mostram esse racha:
— O que está levando as pessoas para as ruas contra o governo é o agravamento da crise econômica, associado ao escândalo da Lava-Jato. Tudo isso está fomentando um caldeirão, que leva para as ruas a polarização vista nas urnas no ano passado. As manifestações fazem parte do jogo democrático. O que será ruim é se essa disputa acabar em radicalização, intolerância e violência. Isso seria nocivo para a democracia — comentou Azevedo.
Para ele, esse quadro de confronto não pode durar muito tempo.
— Tem que haver alguém que coloque água na fervura. O problema é que não temos uma liderança que faça a administração institucional da crise. As manifestações são democráticas, e pedir o impeachment é até legitimo — ponderou Azevedo.
Rubens Figueiredo, do Centro de Pesquisa, Análise e Comunicação, não acredita em clima golpista na manifestação deste domingo. Para ele, golpismo teria que partir das Forças Armadas, do Congresso, o que não é o caso do protesto marcado.
— As manifestações agora mostram que a vida das pessoas piorou, a inflação aumentou e o desemprego cresceu. E, diferentemente de 2013, agora as pessoas querem deixar claro que não concordam com a presidente, que ela não serve.
Propostas em vez de truculência
O fato de os protestos de ontem terem sido pacíficos foi elogiado por analistas:
— É fundamental que não haja radicalizações. Os atos de ontem foram um sinal do amadurecimento democrático. As manifestações foram compostas por propostas e não por truculência — disse Figueiredo.
Já na opinião do cientista político da FGV Marco Antonio Teixeira, o protesto de amanhã não será um contraponto às manifestações de ontem:
— O que alavancou as manifestações deste domingo foi o discurso da presidente Dilma Rousseff em cadeia nacional no Dia Internacional da Mulher, em que ela pediu paciência às pessoas por causa da crise. Quando Dilma falou, as pessoas já estavam sentindo na pele os efeitos do pacote fiscal.
Claudio Couto, também da FGV, concorda que o que deve levar muita gente às ruas amanhã é o cenário de deterioração do governo, com o agravamento da crise econômica, além de uma grande inabilidade política. Para ele, Dilma tem agido como militante política:
— Ela tem sido muito teimosa, agindo como na época em que era guerrilheira, conversando com um pequeno grupo que a rodeia, sem mostrar disposição ao diálogo com os próprios partidos da base aliada.
Couto acha que a manifestação de amanhã “terá de tudo um pouco”.
— Haverá gente querendo simplesmente protestar contra o governo e a crise econômica, mas também aquelas com ideias golpistas e os que desejam inviabilizar o governo no meio do caminho.
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