- O Globo
O cheque de R$ 1 milhão depositado pelo PMDB na conta do então vice-presidente Michel Temer na campanha de 2014 está sendo tratado pela oposição como uma prova irrefutável de que ele também recebeu dinheiro desviado da Petrobras da empreiteira Andrade Gutierrez. Tornou-se um novo foco de desequilíbrio institucional.
É uma espécie de vingança dos advogados da ex-presidente Dilma Rousseff que, em vez de defendê-la, tentam incriminar o atual presidente. O ex-presidente da empreiteira Otávio Azevedo, em sua delação premiada, disse que deu ao PT uma doação de R$ 1 milhão proveniente de propina de obras, e o partido apresentou um cheque do mesmo valor depositado na conta do candidato a vice, como que dizendo que também ele se beneficiou de dinheiro ilegal no financiamento de campanha.
Já não pretendem mais alegar que a campanha presidencial de Dilma Rousseff não recebeu dinheiro de propina, mas tentam impedir que o então vice Michel Temer saia incólume do processo aberto no Tribunal Superior Eleitoral e continue exercendo o cargo de presidente da República.
O relator do processo, ministro Herman Benjamim, que já se disse espantado com volume de dinheiro ilegal que está sendo descoberto nas investigações do TSE, inclusive com o compartilhamento de provas com a Operação Lava-Jato, desistiu de realizar uma acareação entre o ex-presidente da empreiteira e o ex-tesoureiro do PT Edinho Silva para definir, afinal, qual a origem daquele cheque, já que ele não é da Andrade Gutierrez, mas do PMDB.
Na delação premiada, Otávio Azevedo disse explicitamente que o R$ 1 milhão do PT era de dinheiro ilegal que foi “lavado” como doação legal. A Presidência da República garante que o milhão de Temer não tem nada a ver com o do PT, embora os dois tenham sido doados pela mesma Andrade Gutierrez.
A doação ao PMDB, de R$ 3 milhões, teria sido legal e em outra época, e o partido teria destinado parte dela para a campanha do vice. Caímos na discussão básica desde que descobriram que o PT inventou um novo truque no processo de corrupção política: em vez de receber dinheiro por vias ilegais, combinava com os financiadores que a propina fosse entregue como contribuição legal, através do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Descobriu-se até uma conta-corrente no departamento de propinas da Odebrecht que descontava da conta geral as parcelas que eram transformadas em doação legal da empreiteira para o PT. Uma espécie de contacorrente de propinas.
Os petistas perguntam como se fizesse sentido: o dinheiro do PT era ilegal, e o dos outros partidos, legal? Tinha um cofre distinto para cada partido? O fato é que os empreiteiros do cartel formado na Petrobras e em outras estatais são unânimes em afirmar que as doações ao PT faziam parte de um esquema de manutenção das obras que eram contratadas, sem o que a empreiteira que se recusasse a pagar a propina perdia a obra.
Com relação aos outros partidos, as doações eram investimentos no futuro ou mera diplomacia, já que eles não tinham o poder de definir o destino das obras do governo petista. No caso do PMDB, o partido estava no governo e detinha poder para nomeações específicas em algumas áreas, como na Transpetro ou na diretoria de Renato Duque na Petrobras.
Em vez da acareação, o ministro Herman Benjamim decidiu ouvir novamente Otávio Azevedo para que esclareça a origem daquele cheque ao PMDB que foi parar na conta da campanha de Temer. Muito embora os oposicionistas estejam vibrando com o que consideram ser uma prova definitiva de que também o presidente atual recebeu dinheiro de propina, o tal cheque não parece ter grande valor de denúncia, a não ser que todas as doações de empreiteiras fossem consideradas ilegais.
O que está em jogo no TSE não é mais se é possível cassar a chapa vencedora da eleição presidencial por abuso de poder econômico, pois já existem provas suficientes de que isso aconteceu realmente. O que se discute agora, e essa será uma discussão longa e demorada, é se é possível separar as contas de Dilma e de seu vice Temer. Se o TSE considerar que a campanha do vice recebeu dinheiro do PT sem saber a origem, ele não será punido, apenas ela.
Se a maioria considerar que não é possível separar as contas, Temer também terá sua eleição impugnada. Com todas as implicações institucionais que estão vinculadas a uma decisão dessas: dois presidentes depostos em menos de um ano, o país mais uma vez parado e uma eleição indireta para um mandato tampão até a próxima eleição presidencial, em 2018.
Nenhum comentário:
Postar um comentário