- Folha de S. Paulo
O fim dos tempos é anunciado com frequência superior àquela com que o mundo costuma acabar. É ruim que Donald Trump tenha sido eleito presidente dos EUA, mas é improvável que isso se reverta no colapso da civilização.
O principal problema com Trump, além da personalidade instável e das ideias bizarras, é a enorme dose de incerteza que ele traz consigo. Nós simplesmente não sabemos o que o futuro presidente fará depois que assumir o poder em janeiro próximo.
Na campanha, ele prometeu coisas horríveis, como deportações em massa, o uso de tortura contra terroristas e a revisão de vários acordos internacionais. É improvável, porém, que ele consiga ou mesmo tente pôr tudo isso em prática. Para começo de conversa, estamos falando dos EUA, um país onde as instituições são fortes e o sistema de "checks and balances" (freios e contrapesos) funciona.
Mais importante, Trump é um fanfarrão, e a jactância tende a ser limitada por interesses. Sempre ao sabor das conveniências, Trump muda de opinião sobre tudo. Já o fez em relação ao aborto, à tortura, ao banimento de muçulmanos etc. Suas primeiras declarações depois de eleito também apontam um presidente bem mais moderado do que o candidato.
E, se a baixa confiabilidade de Trump é em si um problema, ela também encerra um aspecto positivo. O magnata é mais bem descrito como um oportunista pragmático do que como alguém imbuído de convicções sinceras e um sentido de missão. Isso significa que, ao contrário de religiosos ou militantes de causas, ele não deverá agir como portador de uma verdade imutável que precisa ser imposta a todos —o que abre espaço para a negociação política.
Não estou sugerindo que Trump não tenha condições de infligir consideráveis estragos aos EUA e ao mundo, mas apenas que não antecipo uma hecatombe. Estas têm como pré-requisito o fervor ideológico, algo que Trump não ostenta.
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