Coerência nunca foi o forte de Donald Trump. Durante a disputa pela Presidência dos Estados Unidos, o republicano se contradisse diversas vezes sem o menor pudor, como se a incerteza provocada pelo comportamento errático não constituísse um problema para candidatos à chefia do Executivo.
Seria imprudente, portanto, traçar um prognóstico detalhado das iniciativas na área da economia, mas já se podem entrever algumas de suas linhas de ação —e elas sugerem mudanças expressivas, especialmente porque seu partido obteve a maioria em ambas as Casas do Legislativo.
A plataforma apresentada na campanha divide-se em duas frentes principais. Primeiro, uma visão antiglobalização e nativista, com intenção de reavaliar acordos comerciais e limitar a imigração.
Daí por que, ao menos em termos gerais, a vitória de Trump ameaça a atual ordem econômica mundial, baseada justamente na lógica repudiada pelo magnata.
Por outro lado, espera-se que o republicano perceba o quanto seria arriscado adotar atitude agressiva em temas geopolíticos. Medidas drásticas alardeadas pelo candidato, como o abandono unilateral do Nafta (acordo de livre-comércio com Canadá e México) e acirramentos com a China, tenderão a ser matizadas pelo presidente.
A segunda parte de sua plataforma diz respeito à política interna. Trump prega uma combinação de cortes de impostos e aumento de gastos com potencial para expandir o deficit público americano em até US$ 5 trilhões em dez anos. A redução de tributos, a ser concentrada nas empresas, é a principal parte do plano. O aumento de despesas priorizaria a infraestrutura.
Neste momento inicial, o mercado financeiro atentou sobretudo para o lado doméstico, com a percepção de que a política econômica favorecerá as empresas.
Como contrapartida, porém, a maior expansão orçamentária num contexto de quase pleno emprego indica juros mais elevados.
Esse ponto preocupa o restante do mundo, pois os capitais poderiam retornar aos EUA em maior volume, valorizando o dólar e alavancando a taxa de juros também em outros países. Outra hipótese é que o aumento da dívida se mostre proibitivo e afugente investidores.
Ainda é cedo, de todo modo, para apostar na plena implantação do plano econômico, que teria vastas consequências globais. Muitos republicanos não toleram deficit maior e podem rechaçar uma mudança radical no Orçamento.
A vitória de Trump abre um capítulo de incertezas. A combinação de juros mais altos e risco protecionista aponta para um cenário global mais desafiador.
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