O Senado Federal aprovou em primeiro turno, na quarta-feira passada, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata da reforma partidária. É “uma resposta à sociedade brasileira, que não pode mais conviver com 35 partidos políticos registrados e mais 30 partidos com solicitação de regularização no Tribunal Superior Eleitoral (TSE)”, nas palavras de um dos autores da proposta, o senador Aécio Neves, presidente nacional do PSDB. A PEC estabelece, entre outros dispositivos, a chamada cláusula de barreira, ou de desempenho, para que os partidos tenham direito de acesso aos recursos do Fundo Partidário e à programação eleitoral na mídia eletrônica. Para ter esse acesso, em 2018 os partidos terão que conquistar pelo menos 2% dos votos válidos em 14 unidades da Federação. A partir de 2022 o porcentual será de 3%. Ficam proibidas, a partir de 2020, as coligações nas eleições proporcionais.
O PT passou 13 anos no poder empurrando com a barriga iniciativas concretas para a reforma política que sempre declarou imprescindível para o aperfeiçoamento da democracia brasileira, enquanto aproveitava as deficiências do sistema em benefício de seu próprio projeto de poder. Foi assim que, valendo-se do toma lá dá cá que é a razão precípua da existência da maior parte das legendas nanicas – e de algumas das grandes –, Lula construiu uma sólida base de apoio parlamentar posteriormente demolida pela arrogância e incompetência política de Dilma Rousseff. Agora na oposição, o PT continua, para demonstrar coerência, oficialmente alardeando que é a favor das reformas que não teve interesse em estimular quando era governo, mas libera suas bancadas no Parlamento para votar contra a PEC da cláusula de desempenho, sob o argumento incongruente de que precisa se manter solidário com os pequenos partidos de “esquerda” que são seus aliados tradicionais.
Na verdade, qualquer pretexto serve para o PT manter-se intransigentemente contra qualquer medida proposta pelo governo “ilegítimo” de Michel Temer, como a PEC do Teto dos Gastos, mesmo que seja essencial para o saneamento fiscal do País. É o que está mais uma vez acontecendo, agora na tramitação da PEC da cláusula de desempenho: dane-se o interesse nacional.
O argumento dos que defendem a flexibilização das regras, como a redução do porcentual de votos exigidos, parte do princípio de que, como está, a proposta “inviabiliza” pequenos partidos politicamente ativos no Congresso, como Rede, PSOL, PCdoB e PPS. Ora, a legitimidade de sua representação popular os partidos têm que conquistar nas urnas, não nos conchavos parlamentares. E a suposição implícita nos argumentos favoráveis a esses pequenos partidos, de que merecem tratamento especial porque representam correntes “progressistas”, é altamente questionável, porque implica julgamento de valor que ofende o princípio da isonomia. Afinal, quem é que estabelece o critério para a definição do “mérito” que justificaria facilitar a vida de partidos, não por coincidência, todos de “esquerda”?
De qualquer modo, como admitem os próprios autores da PEC, os senadores tucanos Aécio Neves (MG) e Ricardo Ferraço (ES), para viabilizar sua aprovação na Câmara, onde as legendas nanicas têm peso muito maior que no Senado, certamente será necessário reduzir em alguma medida o porcentual de eleitores exigido na proposta original.
Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que advoga em causa própria, “não se trata de ‘liberou geral’, mas da preservação de legendas de conotação ideológica”. O PT está de acordo, tanto que votou contra a PEC nessa primeira oportunidade. Mais uma vez, porém, coloca-se a questão de saber, primeiro, o que significa exatamente “conotação ideológica”, uma vez que é lícito supor que essa não deva ser uma qualificação privativa do “pensamento progressista” – que também carece de definição precisa. Depois, resta a dificuldade de definir objetiva e democraticamente quais legendas partidárias nanicas merecem ser distinguidas com a honrosa condição de “ideológicas”. A propósito, qual é a “ideologia” do PT?
Melhor promover logo essa reforma a partir de uma proposta que finalmente existe e deixar a extensão de suas consequências político-partidárias nas mãos do eleitor, que é, afinal, quem paga a conta.
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