Ausentes
medidas de ajuste estrutural, o desempenho da economia em 2021 continuará a ser
pífio
No
comunicado divulgado pelo Banco Central após a última reunião do Copom, a
instituição alertou que “um prolongamento das políticas fiscais de resposta à
pandemia que piore a trajetória fiscal do país, ou frustrações em relação à
continuidade das reformas, podem elevar os prêmios de risco”. Declarou ainda
que “o risco fiscal elevado segue criando uma assimetria altista no balanço de
riscos, ou seja, com trajetórias para a inflação acima do projetado no
horizonte relevante para a política monetária”.
Trata-se de mais uma advertência, desta feita vinda da Autoridade Monetária, de que a situação fiscal brasileira está exigindo resposta imediata. Lastimavelmente, com raras exceções, os políticos eleitos parecem que continuam subestimando os riscos fiscais que rondam o Brasil e que, se materializados, poderão jogar o país numa crise econômica de repercussões potencialmente desastrosas para a sociedade. Falta apoio, na classe política, a iniciativas para eliminar o déficit estrutural das contas públicas, ao tempo em que sobram apoios a iniciativas que aumentam o gasto público ou estendem benesses tributárias a grupos de contribuintes.
Após
o esforço fiscal durante a pandemia da covid-19, as contas públicas
encontram-se fragilizadas. Segundo cálculo da IFI (Instituição Fiscal
Independente), ligada ao Senado Federal, os gastos do governo federal com a
pandemia devem atingir 7% do PIB em 2020, elevando o déficit primário neste ano
para 10,9% do PIB. Como consequência, ainda de acordo com projeções mais
recentes da IFI, a dívida bruta do setor público chegará a cerca de 93 % ao fim
deste ano, nível extremamente elevado para uma economia emergente. Vale notar
que o crescimento da dívida somente não será maior porque a derrubada da taxa
Selic pelo Banco Central amorteceu a carga das despesas de juros em 2020.
Até
o momento em que escrevo este artigo, nada estava acertado entre o Congresso
Nacional e o Executivo a respeito do Orçamento de 2021. Não há ainda meta para
o resultado primário, sequer tendo sido votado o projeto da Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO) que deveria servir - como o próprio nome diz - como base
para a elaboração da Lei Orçamentária Anual (LOA). Tudo indica até que o
governo já desistiu de ver aprovada a LOA ainda este ano. Cabe recordar que o
Executivo, ao encaminhar o projeto da LDO em abril passado, inovou para pior ao
criar uma espécie de meta variável para o primário em 2021, alegadamente por
causa das incertezas derivadas da covid-19.
Além
disso, está praticamente paralisada a tramitação das iniciativas de ajuste
estrutural das contas públicas propostas pelo governo em novembro do ano
passado, como é o caso da PEC da Emergência Fiscal. E quando há algum “sinal de
fumaça” vindo do Congresso, normalmente é na direção de diluir o impacto
pretendido com as iniciativas de ajuste. É o caso, por exemplo, da discussão
sobre a PEC emergencial no Senado, em que o parecer divulgado por seu relator
prevê uma economia fiscal muitíssimo abaixo das expectativas iniciais.
As
medidas citadas, se aprovadas de forma íntegra, flexibilizariam a execução do
Orçamento, abrindo espaço para a redução dos gastos obrigatórios, viabilizando
o cumprimento do teto de gastos e o aumento do investimento público. Sem essa
flexibilização, vale insistir, o teto de gastos logo será letra morta e as
dúvidas sobre a sustentabilidade do endividamento público aumentarão.
Desse
modo, a entrada em 2021 com incertezas sobre o cumprimento do teto de gastos e
da obtenção de um resultado fiscal que aponte para a redução do endividamento
do setor público num horizonte de tempo razoável pode levar a dificuldades
crescentes para a recuperação da economia. Em especial, as incertezas no campo
fiscal podem influenciar a trajetória da taxa de câmbio, depreciando a moeda
nacional e colocando pressão sobre a inflação, além de dificultar o
financiamento da dívida pública. Cabe notar que o risco fiscal já está afetando
a estrutura a termo das taxas de juros, assim como provocado o encurtamento do
prazo médio da dívida pública federal em mercado.
Além
dos aspectos relacionados ao equilíbrio orçamentário, a agenda fiscal relevante
abrange também a reforma tributária. Há um profundo desentendimento entre o
Congresso e o Legislativo sobre o que deve ser feito a respeito, sinalizando
que muito provavelmente não teremos avanços substanciais no tema nos próximos
meses.
É
uma má notícia já que as disfuncionalidades do nosso sistema tributário são
responsáveis maiores pela inexistência de um ambiente de negócios no Brasil que
permita a alocação eficiente de capital, fator primordial para o crescimento da
produtividade e do PIB.
O
Brasil já está perdendo o impulso de crescimento trazido pelo bônus demográfico
e passa a depender cada vez mais do aumento da produtividade para acelerar o
crescimento econômico. Ausentes medidas de ajuste estrutural, o desempenho da
economia em 2021 e nos anos futuros continuará a ser pífio.
*Gustavo
Loyola, doutor em Economia pela EPGE/FGV, ex-presidente do Banco Central, é
sócio-diretor da Tendências Consultoria Integrada, em São Paulo
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