E
aí está o governo Bolsonaro, dependente da vacina chinesa
O
mundo real se impõe. E o governo federal recorrerá à CoronaVac. O mundo real se
impôs. E aí está o governo Bolsonaro, dependente da vacina chinesa,
requisitando a vacina do Doria, aquela, comunista!, que o presidente prometera
não comprar. Nunca houve dúvida de que o faria. A questão sempre sendo a demora
— a demora em imunizar os brasileiros —decorrente da irresponsabilidade.
O
mundo real se impôs, mas é o atraso que importa. O mundo real se impõe sempre.
Mas também se impõem os efeitos do atraso deliberado; projetando golpes
adicionais de tensão sobre um já esgarçado tecido social. A oferta de
imunizantes, por óbvio, não é infinita; sendo provável, por consequência, que,
já havendo vacinas aptas, não haja doses suficientes para todo o primeiro grupo
de prioridades, de modo que seria necessário definir prioridades entre
prioridades.
O
fim da fila em que se encontra o Brasil é obra exclusiva de Bolsonaro, o maior
agente antivacinação do mundo — tocador de uma campanha de desinformação e
descrença na praça desde março de 2020.
Jamais
foi a preocupação com a economia popular o que o motivara a pregar contra o
distanciamento social. Ou teria de ser um obcecado pela vacinação em massa.
Como se vê, consiste no próprio empecilho. Seu propósito é não apenas o
espalhamento do caos, mas sua constância. Bolsonaro se dedica à sustentação de
um estado de calamidade por meio de que alimenta um governo calamitoso.
Torceu pela segunda onda. Trabalha para que perdure. Seu governo — sua própria existência competitiva — depende da anormalidade. O fenômeno reacionário que encarna depende da imprevisibilidade. Nada melhor do que uma pandemia que permaneça para muito além do que seria o tempo possível de o Brasil domá-la. Nós ainda não vacinamos porque Bolsonaro não quis.
A
pandemia que mata brasileiros novamente aos mil por dia é a mesma por meio de
cujos impactos desorganizadores da economia o presidente acredita poder
justificar a incapacidade do governo. A pandemia como desculpa. A pandemia em
cujos efeitos paralisantes sobre a política aposta para neutralizar qualquer
tentativa de impeachment. A pandemia como escudo. A pandemia de cujo desarranjo
social aprofundador da miséria extrairá a licença para o livre exercício de seu
populismo autoritário com vista a 2022. A pandemia como eleitora.
O
ano eleitoral chegará e, depois de um 2021 terrível, em que o governo terá
sustentado a circulação do vírus, veremos afinal refreada a peste, restando
apenas a derrama de dinheiros com a qual Bolsonaro viajará o país para
enfrentar a pobreza causada — o discurso está pronto — por governadores e
prefeitos; aqueles que, fechando estados e municípios, teriam quebrado a
economia popular. O discurso está pronto e testado.
O
presidente foi bem-sucedido em sua cantilena de que as mortes pelo vírus seriam
inevitáveis e de que era preciso enfrentá-lo sem covardia, que equivalia à
reclusão. Cuidados sanitários comporiam conjunto histérico de excessos — coisa
de maricas. Esse foi o discurso que prosperou, o da masculinidade heroica. Ele
plantou a oposição saúde pública, coisa de elite, versus saúde econômica. Falou
àqueles que não tinham reservas e que precisariam correr risco para ter comida
na mesa — e que se puseram às ruas convencidos de que até usar máscara era
bobagem.
Diga-se
que nunca houve algo nem sequer parecido com lockdown no Brasil, mas é contra
este inimigo imaginário — cerceador das liberdades — que luta e avança o
bolsonarismo. Um dos pilares mantenedores da farsa de Bolsonaro é a distorção
segundo a qual estaria de mãos atadas pelo STF. Uma mentira. Ele mandaria
dinheiro —teria enviado mundos e fundos a Manaus —, sem mais o que pudesse
fazer. Mentira.
Bolsonaro
depende do clima de exceção, desde o qual também opera a vitimização. Necessita
de condições que forjem a arena para crise perene — desde onde multiplica
adversários. A pandemia lhe é um presente. Daí por que a pazuellização do
Brasil. Um plano. A garantia de longevidade da depauperação nacional. Pazuello,
general da ativa, é o boi de piranha. Não entra sozinho no rio, porém. Leva
junto o Exército.
Levou
o Exército consigo quando voou a uma Manaus já sem oxigênio para fazer
propaganda de tratamento preventivo contra o vírus. A fixação na cloroquina é a
estrela do programa de manutenção da pandemia. Um medicamento que não é eficaz.
Manaus é produto da prevenção que assegura a propagação da peste. É produto do
sermão bolsonarista por desobediência civil — da criminosa doutrinação bolsonarista
para que as gentes se aglomerassem.
Não
se chega à falta de oxigênio em unidades de saúde — algo que se mede e controla
— sem letal combinação de negligência e ignorância. Num hospital brasileiro,
normalmente precário, as pessoas — havendo oxigênio — são capazes de sobreviver
mesmo com as faltas habituais. A falta de leitos, por exemplo. A falta de
oxigênio é de outra categoria. Sobrevive-se com oxigênio ainda que deitado no
chão. Sem oxigênio, será a morte. É o que produz o Ministério da Saúde de
Bolsonaro, aquele que prepara — que adesiva — um avião para buscar vacina
indisponível.
O mundo real se impõe. O golpismo voltará.
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