Vencer eleição não é difícil, sobretudo, com recursos às mancheias. Difícil é satisfazer expectativas: cumprir promessas espalhadas ao ar como confetes, honrar acordos, conciliando interesses; definir prioridades e demonstrar como realizá-las. Passadas as disputas na Câmara e no Senado, os vencedores devem mostrar que estão prontos e sabem o que fazer. Liderança é um estado de prontidão.
Agrega-se
a eles nessa obrigação também o Executivo, pois, no limite, foi o presidente da
República proclamado como grande vitorioso do processo. Para Jair Bolsonaro
será, aliás, um desafio interessante: a partir de agora, não poderá dizer que é
impedido pelo Congresso, não poderá atribuir a desafetos a origem de suas
dificuldades: ao vencedor, não cabe desculpas.
Nesse sentido, era natural que os principais dirigentes políticos do país viessem a público expressar seus propósitos. No processo eleitoral, Arthur Lira, por exemplo, não conseguiu elaborar nada que extrapolasse o corporativismo, o interesse e as questiúnculas de seus pares do baixo clero. Logo, cumpria mostrar ao que vieram. Foi o que tentaram simbolizar ao trocarem quase protocolarmente cartas de intenção.
Primeiro,
Pacheco e Lira enfatizaram o enfrentamento à pandemia na aquisição de vacinas —
atribuição do Executivo, diga-se –, apontaram a necessidade do retorno ao
Auxílio Emergencial; comprometeram-se com o teto de gastos, mencionaram as
“reformas”. Não disseram como.
Depois,
foi presidente: numa lista de 35 propostas, Bolsonaro desenrolou um pergaminho
de questões ao gosto de uma base eleitoral conservadora e extremista. Para o
mercado, houve espaço até para mencionar a retomada do investimento e a questão
fiscal.
Mas,
é forçoso reconhecer que o rol de questões é perigosamente amplo e genérico.
Parece produtivo, mas prima pela falta de objetividade. Em ambiente de
escassez, o governar é definir prioridades. No mais, apresentar um plano para
realizá-las. Isso, sim, expressaria liderança e sinalizaria caminhos para
superação da crise ampla, geral e irrestrita em que o país se encontra.
É
certo que em política não há o rigor de uma ordem burocrática, nem movimentos
exatos; nada é simples, há conflitos e movimentos de opinião pública podem
ajudar ou inviabilizar pautas importantes. É da natureza da atividade que
intercorrências possam se interpor aos desejos. Mas, o timing é fundamental:
iniciar o processo com clareza, seria importantíssimo. Por definição, ter mais
de uma prioridade, é não ter prioridade alguma.
*Carlos Melo, cientista político. Professor do Insper.
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