O Estado de S. Paulo
O sucesso desse novo desenho está condicionado
à transformação de uma coalizão de governo em apoio eleitoral
“Eu
sou do Centrão.” A exposição do pertencimento a essa controversa entidade da
política brasileira é do próprio presidente Bolsonaro, com vistas a
reduzir o custo da aproximação com a “política tradicional”. O choque dessa
estratégia em relação ao discurso eleitoral do presidente já virou lugar comum
e não surpreende ao observador minimamente atento das movimentações palacianas.
O ponto mais relevante da reforminha ministerial é justamente a escolha de um
nome da política tradicional em substituição de um nome oriundo das Forças
Armadas, já que o próprio presidente reiteradamente legitima seu governo pela
ligação com os militares e recentemente promoveu trocas em postos militares em
nome de maior aproximação política com a instituição.
A reforma tem fundamentalmente o objetivo de proteger o mandato presidencial, ou a busca pelo “equilíbrio”, nas palavras do novo ministro, Ciro Nogueira. Não por um acaso, o escolhido vem do Senado, casa que irá julgar as indicações no campo jurídico feitas pelo presidente e, no limite, irá definir o grau de pressão política, quando da votação do relatório da CPI da pandemia, possivelmente responsabilizando o presidente por crimes de responsabilidade.
O equilíbrio citado depende do mínimo de estabilidade política, o que significa conter os choques decorrentes do próprio estilo presidencial e dos constrangimentos oriundos da politização das Forças Armadas. A desconfiança entre militares e políticos ajuda a preservar o mandato. O eventual impeachment representaria a transferência de poder justamente para os militares, que ameaçam esse espaço da política tradicional.
O presidente parece ter percebido que, no
limite, é a política o principal pilar de proteção à sua administração,
especialmente diante da proximidade do calendário eleitoral. O sucesso desse
novo desenho está condicionado à transformação de uma coalizão de governo em
apoio eleitoral. A rejeição elevada do presidente é uma eterna porta de saída
do governo, mesmo sem o impeachment.
As chances de proteção do mandato são
relevantes, mas a construção da base eleitoral esbarra no jogo de interesses
entre os partidos do Centrão, campo que é homogêneo apenas no imaginário
político.
*Sócio da Tendências Consultoria é Doutor em Ciência Política (USP)
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