Folha de S. Paulo
O sommelier de vacina é um egoísta, um
baita ignorante
A Prefeitura de São Paulo, a exemplo do que
já tinha feito a de Belo Horizonte, decidiu que vai para o fim da fila quem
tentar escolher o fabricante do imunizante contra Covid-19. Aos críticos
dos sommeliers a
medida parece justa. Quem muito escolhe fica sem nada.
Com mais de 550 mil mortes, parece suicídio recusar qualquer que seja a oferta. Então, que se lasquem. Eu mesma pensei assim, num primeiro momento. Mas não é uma questão de revanche contra quem brinca com a própria sorte numa pandemia.
A medida não parece tão simples de ser
cumprida. Aos profissionais de saúde, que já têm a enorme responsabilidade do
corpo a corpo com a população, caberia fiscalizar e punir os dribladores. Num
país onde a frase favorita é "você sabe com quem está falando?", dá
para imaginar de que lado a corda roeria.
Parece também muito fácil chegar a um posto de saúde qualquer e, antes de
entrar na fila, obter a informação sobre qual imunizante está sendo aplicado e
dar marcha à ré, sem ser enquadrado nem receber uma advertência por escrito.
Fazer de conta que o sommelier vai ficar de castigo faz barulho nas redes
sociais, ganha espaço na impressa, mas resolve pouco o que de fato importa: ter
vacinas, várias, para todos.
Importante dizer que o sommelier de vacina
é um egoísta. E um baita ignorante. Sabemos que os imunizantes disponíveis têm
performances distintas, mas os aprovados funcionam dentro de um plano nacional
que inclui diferentes laboratórios.
Mais vale a maior parte da população vacinada com um imunizante que tem 50% de eficácia do que nem metade imunizada com um mais eficaz, como acontece nos Estados Unidos. O país já enfrenta uma nova pandemia, a dos não vacinados, e vê o número de casos e de internações disparar entre os negacionistas, que representam mais de 95% das mortes pela Covid-19 em alguns estados. Então, pior do que tomar qualquer uma, é não tomar nenhuma.
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