Folha de S. Paulo
Marqueteiros habilidosos não têm
dificuldades para contrabandear coisas para nossos cérebros
Como o cérebro pensa? Para o linguista
George Lakoff, ele o faz através de metáforas ou "frames"
(enquadramentos). Podemos chamar um grupo armado que lute por uma causa de
"terroristas" ou de "guerreiros da liberdade" —e isso faz
toda a diferença. É que neurônios que disparam juntos acabam se ligando em rede
e, quando isso ocorre, sempre que um dos elementos é evocado, ele aciona o
outro.
Se chamo os combatentes de terroristas, eu os ligo indelevelmente aos sentimentos de medo e angústia deflagrados pelo neurônio do terror. Inversamente, se os descrevo como campeões da liberdade, pinto-os com as cores positivas associadas a essa ideia.
Marqueteiros habilidosos não têm
dificuldades para contrabandear coisas para nossos cérebros. Associar cigarro a
esportes radicais e cerveja a mulher bonita são dois exemplos clássicos. Mas o
jogo dos "frames" não serve só para manipular. Ele também pode ser
usado para nos fazer ver novas soluções para problemas velhos ou, ao menos,
para nos darmos conta de que muitas convicções se assentam em bases frágeis.
Um bom exemplo é o da prisão após a decisão
de segunda instância. Se a enquadrarmos como um debate essencialista sobre
direitos, produzimos uma acalorada disputa sobre presunção de inocência,
trânsito em julgado e cláusulas pétreas. Mas há outros modos de abordar o
problema. Podemos, como propôs o ex-ministro do STF Cezar Peluso, vê-lo como
uma discussão sobre detalhes do sistema recursal brasileiro.
Se alterarmos os artigos 102 e 105 da
Constituição, fazendo com que os recursos extraordinário e especial deixem de
ser recursos e se tornem ações revisionais, todas as decisões de segunda
instância da Justiça em todos os ramos se tornam transitadas em julgado,
conservando-se a possibilidade de revisão pelas cortes superiores.
O problema segue existindo, mas ganha uma
dimensão menos emocional, que permite tratamento mais técnico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário