Correio Braziliense / Estado de Minas
Desacreditar urnas e
tumultuar processo eleitoral serão indicadores que o presidente da República
não aceitará uma eventual derrota eleitoral, como Donald Trump nos EUA
Não estou entre os que acreditam que a
alternativa golpista, para o presidente Jair Bolsonaro, se esgotou em 7 de
setembro do ano passado, quando mobilizou todas as suas forças contra a urna
eletrônica e confrontou o Supremo Tribunal Federal (STF), que viria a ser
cercado por caminhoneiros. No dia seguinte, com as estradas bloqueadas e os
caminhões na Esplanada, o presidente da República deu um cavalo de pau e mandou
uma carta ao ministro do STF Alexandre de Moraes com juras à democracia, numa
espécie de pedido de desculpas pelos ataques que havia feito ao ministro e
outros integrantes da Corte, principalmente durante manifestação de seus
partidários na Avenida Paulista, à qual compareceu. Naquela ocasião, a
narrativa golpista havia atingido o seu clímax.
Há muitas versões sobre o que aconteceu
naqueles dois dias, principalmente sobre as conversas entre Bolsonaro e o
ex-presidente Michel Temer, que redigiu a carta, e o ministro do Supremo
Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news,
que segura a espada de Dâmocles sobre a cabeça dos bolsonaristas radicais
envolvidos em ações contra a Corte.
Uma das versões é a de que o presidente do Supremo, ministro Luiz Fux, havia ameaçado solicitar ao Exército uma operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em defesa do STF, o que teria consequências posteriores, pois isso, obviamente, caracterizaria ato de sedição liderado pelo próprio presidente Bolsonaro.
Sabemos que o Comando Militar do Planalto
estava de prontidão, com oito mil homens mobilizados para intervir, caso fosse
preciso. Seu estado-maior monitorava não somente a manifestação, como a própria
atuação da Polícia Militar do Distrito Federal, que, no primeiro momento, havia
permitido que os manifestantes rompessem a barreira instalada no Eixo
Monumental e avançassem pela Esplanada dos Ministérios, em direção à Praça dos
Três Poderes.
Por vários meios e interlocutores, na semana anterior, oficiais de alta patente
fizeram chegar às redações o recado de que não havia a menor possibilidade de
envolvimento das Forças Armadas em qualquer tentativa de golpe de estado. A
narrativa era de que os comandantes militares cumpririam com seus deveres
constitucionais e que a democracia brasileira tem instituições fortes e
consolidadas.
Havia um esforço para desfazer a péssima
impressão deixada pelo desfile de carros blindados e anfíbios da Marinha na
Esplanada, em 10 de agosto, um espetáculo que revelou o sucateamento dos
equipamentos do seu Corpo de Fuzileiros Navais e acabou ridicularizado.
O descolamento das Forças Armadas dos
arroubos autoritários de Bolsonaro não deixa de ser alvissareiro, mas ninguém
se iluda. O presidente da República já trocou os comandantes das Forças Armadas
e pode voltar a fazê-lo, antes das eleições, se estiver disposto a adotar um
plano B diante de uma derrota eleitoral inevitável. É flagrante a fricção entre
a orientação de Bolsonaro e a do comandante do Exército, general Paulo Sérgio,
em relação à obrigatoriedade da vacina e outros protocolos contra a Covid-19,
por exemplo.
Plano B
Em artigo recente, na Veja, o jornalista
José Casado destacou que o ministro da Defesa, general Braga Neto, principal
aliado de Bolsonaro no meio militar, por orientação do Presidente da República,
fizera questionamentos formais à segurança das urnas eletrônicas junto ao TSE.
Ou seja, a disposição de não aceitar um resultado eleitoral desfavorável
continua existindo. Não por acaso, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE), ministro Luís Barroso, convidou o ex-ministro da Defesa Fernando de
Azevedo e Silva para assumir a Secretaria Geral da Justiça Eleitoral e comandar
a logística de realização das eleições de outubro próximo.
No 7 de setembro, as manifestações
realizadas na Esplanada, em Brasília, e na Avenida Paulista, demonstraram o
enorme poder de mobilização de Bolsonaro. Nada impede que isso se repita. Sua
capacidade de atuação nas redes sociais para construção de uma narrativa golpista
permanece intacta, as fake news nas redes sociais continuam, inclusive com
ataques ao Supremo. Mesmo com o governo mal avaliado e alto índice de rejeição
nas pesquisas de opinião, Bolsonaro tem uma sua base eleitoral coesa e
resiliente, além de militantes armados, dispostos a lutar para mantê-lo no
poder, recorrendo à força, se preciso.
É um erro imaginar que Bolsonaro não tenha
um Plano B, caso a derrota eleitoral seja inevitável por antecipação.
Desacreditar a urna eletrônica e tumultuar o processo eleitoral serão
indicadores de que não está disposto a aceitá-la, a exemplo do que fez o
ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, um ano atrás. Felizmente, os
demais candidatos à Presidência não endossam esse questionamento. Todos
defendem a urna eletrônica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário