Na verdade, fazer a feira toda semana – o
que inclui frutas, verduras, carnes e alguns cereais – tem se tornado
verdadeira maratona num labirinto no qual as mulheres – maioria – transitam de
um lugar para outro em busca do menor preço aliado à qualidade do produto.
Café, açúcar, banana, tomate, carne, manteiga, farinha de mandioca, óleo de
soja e pão francês são os produtos que tiveram maior alta de preço.
Justamente alguns alimentos básicos para a
população pobre.
Nós, as mulheres, que somos geralmente as responsáveis
por fazer a feira, vamos acumulando experiência na arte da economia. Na
prática.
Parte dos políticos e muitos economistas
deveriam passar por essa experiência.
O político para entender como será difícil
quando perder a eleição e já não ter disponíveis as verbas de gabinete e os
cartões corporativos.
Os economistas para elaborarem melhor as
propostas para os candidatos a presidente da República nesta eleição que se
aproxima.
Ambos deveriam entender o que é o dia a dia de uma família para sobreviver, fazendo malabarismos para sustentar uma prole, ainda que seja pequena.
A ceia do Natal já foi reduzida. Várias
histórias falam de famílias que não se reuniram para fazer a ceia, não em razão
da pandemia, pois todos já estavam vacinados, mas para reduzir o gasto com
alimentos, gás, transporte e energia.
Sei que vivemos numa economia de livre
mercado, mas o que deve ser feito para proteger as famílias que têm apenas um
salário mínimo, no valor atual de R$ 1.210 reais para sobreviver, em geral no
mínimo com quatro pessoas? O DIEESE também fala que o valor de R$ 5.800 reais
seria o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família com quatro
pessoas.
Esta pergunta deverá ser respondida neste
ano de eleição, através das propostas dos candidatos à presidência da
República.
A defasagem é grande, porque a desigualdade
no país também é grande, em todos os sentidos. Os programas voltados para a
agricultura familiar não têm sido eficientes para facilitar a chegada dos
alimentos à mesa de quem mais necessita.
“A inflação dos alimentos tem pressionado
os orçamentos das famílias desde 2020, especialmente de classes mais pobres”,
diz Joelson Sampaio, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação
Getúlio Vargas (FGV EESP). “As pressões sobre os alimentos, permanecerão pelo
menos até 2022-2023”, acrescenta o professor.
Essa previsão apresentada por dados
pesquisados indica que poderá crescer o número de brasileiros a sofrer com a
fome.
Nesse contexto podemos observar através de
pequenas histórias contadas nas feiras, nos supermercados, nas instituições de
solidariedade, várias formas experimentadas pelas famílias para superar a falta
de recursos na compra dos alimentos.
Algumas relatam que primeiro fizeram a
substituição dos alimentos; em seguida, a redução das porções e,
posteriormente, a redução do número de refeições.
Relatou para mim um dono de um pequeno
frigorífico que “em tempos normais” distribuía ossos com um pouco de carne para
umas dez famílias da região, estimuladas por ele a aceitarem a doação como
forma de garantir uma boa sopa à noite, e que de início elas sentiam vergonha
por precisar da ajuda. Atualmente já não consegue dar conta da demanda, por ele
estimulada como uma espécie de responsabilidade social, porque aumentou o
número de famílias necessitadas e caiu a venda da carne no frigorífico.
Quem frequenta as feiras e vários
supermercados, ouve as histórias, sobretudo das mulheres, preocupadas com a
sobrevivência dos filhos, as dificuldades geradas pela ausência da merenda
escolar no dia a dia da família.
Mulheres grávidas que também precisam se
alimentar e garantir nutrientes para a criança durante a gravidez.
As unidades de atendimento às políticas
para os mais fragilizados pela vida também reduziram o atendimento em função da
pandemia.
A tentativa de sobreviver através do
empreendedorismo tem pontos positivos e negativos, gerando níveis altos de
ansiedade em decorrência da incerteza, por conta da pouca prática e ausência de
experiência com negócios. Além de tudo, o empreendedorismo requer determinado
nível de conhecimento que às vezes é limitado pela baixa escolaridade.
Pequenas histórias de brasileiros vão
formando um novo mosaico na sociedade brasileira nessa travessia de caminho
pandêmico, esperançosa por tempo melhor.
Brasileiros, no entanto, têm dado lições de
solidariedade ampliando a ajuda durante a pandemia. Pequenos relatos de Ongs,
igrejas e outras instituições têm indicado o crescimento da solidariedade aos
mais pobres.
Até o momento a imprensa registra a
situação de apenas um brasileiro que relatou ter sido hospitalizado por ter se
alimentado demais, com muito camarão – um alimento que está entre os mais caros
– comendo a ponto de entupir o intestino e ser conduzido para a emergência
hospitalar.
Pois é, o Brasil é formado por estas
pequenas histórias.
*Mirtes Cordeiro é pedagoga.
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