terça-feira, 8 de abril de 2025

As chances de Lula jogar parado no Master - Maria Cristina Fernandes

Valor Econômico

Presidente só ganha em se manter afastado do tema. A dúvida é se ele consegue

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem sido aconselhado a se manter a léguas de distância do banco Master. E não apenas porque fala o que lhe dá na telha. O caso tem potencial para ser, na definição de quem acompanha os balanços do banco há anos, o maior enrosco do mercado bancário brasileiro da história.

Os problemas do banco se encorparam ao longo da gestão Roberto Campos Neto, escolhido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro para presidir o Banco Central. Como, ao deixar o cargo, Campos Neto foi projetado como ministro da Fazenda de um eventual governo Tarcísio de Freitas, o potencial de desgaste está precificado. Restaria a Lula jogar parado. A ver se consegue.

O risco maior é sistêmico, dado o volume de recursos alocados em CDBs (R$ 46 bilhões) lastreados em ativos de retorno incerto, com garantia do Fundo Garantidor de Créditos, cujo patrimônio é de R$ 107 bilhões. Mas há também um risco político evidente. O volume de recursos alocado no balanço do Master para “serviços especializados” (R$ 580 milhões) é considerado alto demais para a finalidade de assessoria jurídica oficialmente informada e dá uma boa medida da contratação de consultores a peso de ouro para articular os interesses do banco.

São interesses com inegável poder de pressão sobre um Executivo minoritário no Congresso e em simbiose existencial com o Supremo Tribunal Federal. Daí porque a ideia de que Lula deva jogar parado mais parece refletir uma postura idealizada. É notória sua proximidade com aqueles que já atuaram a soldo de Daniel Vorcaro, como o ex-ministro Guido Mantega.

Na agenda oficial do presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, deste sábado, só constou a reunião com o diretor-presidente do Fundo Garantidor de Créditos, Daniel Lima, e quatro banqueiros (BTG, Itaú, Bradesco e Santander) interessados no encaminhamento de um desfecho. Apesar de operar com recursos dos bancos, o FGC tem conselho independente e seu estatuto só admite interferência do BC sobre empréstimos. A operação caminha para uma solução que conjugue FGC, erário e consórcio de bancos.

Se o FCG entrar na solução, os bancos terão que recapitalizá-lo e a conta voltará em “spread” e tarifas. Já os investimentos de fundos de previdência públicos, como o Rioprevidência e de servidores da Cedae, dificilmente escaparão do colo da viúva. A reunião, inconclusiva, terminou antes das 16h. Naquela mesma tarde, o tema também sacudiu os 70 anos de Mantega, de quem Galípolo é próximo.

Foi assunto também dos 50 anos do empresário Ricardo Faria, que comprou a empresa americana Hillandale Farms e tornou-se o segundo maior produtor de ovos do mundo. A festa reuniu togados do STF, ministros deste e do governo passado, governadores que, no dia seguinte, pontificaram no palanque bolsonarista da avenida Paulista, banqueiros, parlamentares e Roberto Campos Neto.

Interlocutores de Campos Neto reportam incômodo com a versão de que sua gestão não deu o freio de arrumação necessário. Reportam igual desconforto com a pressão que teria sido feita por grandes bancos para que a autoridade monetária não fosse mais restritiva no caso.

Os alertas, de fato, foram abundantes. Não apenas pelos balancetes mensais que os bancos são obrigados a enviar à autoridade monetária. O FGC também compartilha trimestralmente com o BC, pelo acordo vigente, análises de bancos e financeiras que pontuam no índice de preocupações da instituição. Sempre se soube que a equação do Master para remunerar seus CDBs a 140% dos Certificados de Depósito Interbancário (CDI) não parava em pé. Como havia uma indústria de escritórios de investimento que lucraram muito com as transações, a coisa foi sendo protelada.

A operação ainda não foi desenhada, mas o Banco Central não poderá levar os 365 dias que lhe são facultados para agir sob pena de gerar uma crise de desconfiança. A solução seria mais fácil se o país dispusesse de uma legislação que regulamentasse o tema. Como a Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, proibiu socorros como aquele do Proer (1995), o tema ganhou urgência.

Desde 2006, o BC e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) começaram a discutir uma minuta. Com a crise financeira de 2008, o tema ganhou tração mas só virou um projeto de lei no início do governo Bolsonaro com a assinatura do ex-ministro da Economia Paulo Guedes.

Este PL (281/2019) facilitaria o acesso ao patrimônio dos acionistas da instituição com problemas e daria proteção jurídica ao Banco Central e a seus funcionários nas operações de resgate. Esta insegurança foi sócia da inação. O PL está entre os “top 25” da Fazenda, mas não saiu do lugar.

Tem como relator o deputado Marcelo Queiroz (PP-RJ). Seu partido tem sido avesso a uma maior responsabilização de acionistas temerários. Esta crise escancara uma oportunidade para dotar o país de uma lei sobre o tema.

O tamanho do problema tanto dá a medida da urgência quanto da dificuldade. É este o momento em que se provará se o termo “independência” é aplicável a uma autoridade monetária.

 

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